– Vá, diz lá!
– Não há nada para dizer. Não sei do que é que estás a falar nem sei onde é que foste buscar essa história.
– Agora, ao fim de 15 anos de casamento, tu queres ver se me consegues esconder alguma coisa? Mas tu estás a protegê-lo porquê? Ele nem é teu amigo.
– Não estou a proteger ninguém nem a tentar esconder-te nada.
– Mas concordas que ele não é teu amigo.
– Concordo que tenho amigos mais próximos que o Pedro, sim. Não é que não seja meu amigo.
– Nem está entre os melhores amigos. Assim aqueles mais chegados.
– Não, não está.
– Não é um assim um amigalhaaaaço.
– Não, não é. E não sei bem onde é que estás a tentar chegar, mas estou à espera.
– Eu é que estou à espera. À espera que me digas com quem é que ele anda enrolado.
– Já te disse que não sei se ele anda enrolado com alguém. Não faço ideia.
– Alto! Disseste que ele não anda com ninguém.
– Eu disse isso porque perguntei-lhe e ele disse-me que não havia ninguém. Por isso deve ser verdade. Deve. Mas na eventualidade de não ser, é preferível dizer que não sei. Assim já paras de me chatear?
– Estou a incomodar-te? Peço desculpa. Desculpa lá se estou a causar transtorno em pensar na minha amiga. É que ele pode não ser o um amigalhaaaaço teu, mas a Ana é muito minha amiga.
– Eu sei, eu percebo, mas não é por me perguntares vinte vezes se o Pedro tem alguém que eu te vou dar uma resposta diferente.
– Coisinha parva, essa da solidariedade entre homens, não é? Ainda por cima de um tipo de quem tu nem gostas muito. Claro que ele tem alguém. Não me faças de parva. Vocês têm sempre alguém, quando acabam um namoro ou um casamento. E ele não é exceção.
– Mas só porque ele se separou não quer dizer que tenha outra. Separou- se porque estava farto da Ana. Aquilo já andava mal há uma data de tempo. E já a tinha avisado que qualquer dia saía de casa.
– Pois já. Pois já. E sabes por que é que não saiu antes? Sabes? Por
que não tinha para onde ir.
– Isso parece-me uma boa razão para não sair de casa. Qual é o problema? Preparou as coisas para não ter de ir para um hotel.
– Não tinha para onde ir e agora já tem? Não achas estranho? Estava mas é à espera de ter uma gaja qualquer para ir abancar em casa dela.
– Tu achas que ele não saiu de casa antes porque não tinha uma namorada para onde pudesse ir. É isso?
– Claro que é isso. É sempre isso. Ele é homem. Não ia sair de casa assim, sem mais nem menos, com uma mão à frente, outra atrás. Homem que é homem, só sai de uma relação para se enfiar noutra.
– E vai daí, procura uma namorada. Arranjar uma casa para ele, como já arranjou, ou ficar uns dias em casa de um amigo, como ficou, não são hipóteses.
– Isso é mentira. Não acredites nisso. Os homens só saem de uma relação para se enfiarem noutra. Não conseguem estar sozinhos. Se forem as mulheres a acabar e a sair de casa, sim, eles podem ficar sozinhos. Mas só se forem elas a dar o primeiro passo. Se a iniciativa partir deles, é sempre, sempre para a cama de outra.
– Sabes que estás a ser preconceituosa, não sabes?
– Não estou nada. Vocês não vêm com esse chip. Não têm essa capacidade de se aguentarem sozinhos, sem colo.
– Eu acho que vou acabar esta conversa aqui.
– Anda cá. Volta aqui. Confessa. Diz-me tudo. Com quem é que ele está? Como é que ela se chama? Quem é? É colega de trabalho? É uma cliente. Volta aqui. Fala comigo. Não fujas de mim.
[Publicado originalmente na edição de 4 de setembro de 2016]