Fotografia analógica vs. fotografia digital

Diana Marques acredita que, sem rolos e revelações, a fotografia perde magia. João Viegas Guerreiro diz que, num mundo cheio de pressa, o digital assegura velocidade e fiabilidade. Ela tem uma loja online de câmaras analógicas, ele tem dez anos de trabalho em eventos, catálogos e produtos. Ambos concordam que importante é «o momento decisivo». Só divergem na forma de lá chegar.

No início da história é que se percebe o fim. Porque Diana Marques, 37 anos, recorda uma infância em que a família gravava em filme as férias. Fotografia em movimento, que depois era projetada na parede da sala com som de fundo de uma cassete ou um disco. «Aquele ambiente que se criava, o ruído da película a rodar, o próprio cheiro das cenas cortadas e unidas com cola, continua a ser muito inspirador.» João Viegas Guerreiro, 46, por outro lado, começou a fotografar com uma máquina pequena, que fazia imagens de três megapixels que o levaram a abandonar uma profissão de que não gostava para se dedicar a uma vida de cliques e enquadramentos. Então, se ela hoje é uma rapariga analógica, ele é todo digital.

Que diria Cartier-Bresson, o francês que definiu a fotografia como «o momento decisivo», sobre a nova era digital? «O analógico obriga a pensar no que se vai fotografar, envolve uma tranquilidade que te faz viver os momentos para compreendê-los. Não se pode fazer 14 fotografias por segundo e depois escolher, como agora. É mais lento e mais puro», defende Diana, que há três anos abriu no Facebook uma loja de venda de máquinas antigas – a Vintage Dream Cameras. João, que é profissional e capta imagens de eventos, organiza produções de moda e retrata produtos para catálogos, discorda: «Há uma fiabilidade no digital que não pode existir nos modelos antigos. Ao fotografar uma série de vezes eu garanto a qualidade de luz, garanto que não vou ter de repetir a sessão.»

Numa coisa em ambos concordam. Que é do fotógrafo, do seu talento e da sua inspiração, que depende o momento em que a técnica se faz arte. Mas, se o digital veio democratizar a fotografia, tornando-a acessível a toda a gente, Diana acredita que há um caminho diferenciador que os rolos ainda conseguem fazer. «O que está a acontecer hoje é o paralelo de alguém ir escrever para o computador sem primeiro ter aprendido caligrafia. É preciso ter noção de luz e velocidade.» João, que sempre fotografou em digital, não é que discorde, mas também diz que «não é preciso voltar aos modelos do passado para perceber os conceitos basilares».

Há uns tempos, durante uma viagem a Angola, o fotógrafo cimentou a sua posição. Num dia de folga quis fotografar crianças em Luanda. «Foi difícil, as mães começaram a protestar.» Então ele tirou selfies a si mesmo e mostrou-as. «Fiz umas caretas, toda a gente se riu e percebeu que não havia mal nenhum naquilo. Se não fosse o facto de ter uma câmara digital, nunca teria conseguido fazer aqueles retratos.» Diana concorda que ali o digital foi uma vantagem, sim. Apesar das selfies serem algo que a irrita profundamente. «Obedecem à lógica que vivemos atualmente, em que temos ferramentas para comunicar que nunca tivemos antes mas usamo-las para nos centrarmos em nós próprios. Por isso encaro o analógico como um ato de resistência ao imediatismo e ao autocentrismo.»

Para a dona da Vintage Dream Cameras, o analógico é um movimento de lentidão que contraria estes tempos apressados. «E que nos obriga a pensar no que está à nossa frente e no que queremos dizer ao mundo.» Para João é precisamente porque os tempos são apressados que o digital faz sentido. «Nos jogos olímpicos, a Getty Images estava a demorar 120 segundos a colocar em linha as fotos, desde o momento em que elas eram tiradas. Isso é extraordinário.» São argumentos diferentes, mas o que importa é capturar o «momento decisivo».


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DIANA MARQUES

É difícil encontrar fotografias de família em que Diana apareça na adolescência, porque era sempre ela a tirar os retratos. A apetência e o gosto pelo enquadramento vêm da infância, mas a vida levou-a a tirar um curso de Design Industrial e encontrar trabalho na TAP. Um dia, viu as fotos do amigo de um amigo e quis conhecê-lo. Apaixonou-se primeiro pelas imagens, depois pelo rapaz, e hoje é casada com Nuno Domingues. Uma parte do jogo de sedução foi feita a oferecerem câmaras analógicas um ao outro. Tiraram vários cursos de fotografia e um dia decidiram abrir a sua própria loja online de máquinas que ainda precisam de rolos e impressões. A Vintage Dream Cameras está no Facebook e na Feira das Almas.

JOÃO VIEGAS GUERREIRO

Começou nas lides fotográficas por causa de uma pequeníssima Pentax de três megapixels. Depois comprou uma Sony, começou a fotografar casamentos e eventos, cada vez mais amigos lhe pediam trabalhos. Inscreveu-se em 1992 num curso do Instituto Português de Fotografia e, há uma década, deixou para trás um passado em que tinha estudado contabilidade e trabalhava em projetos arquitetónicos para se dedicar inteiramente à sua paixão maior. Continua a fotografar eventos, mas também faz publicidade, catálogos, moda e viagens. O seu trabalho pode ser visto em joaoviegasguerreiro.wordpress.com.