Eu(ro)foria dos campeões – quanto tempo vai durar?

Euroforia

«Não somos 11, somos 11 milhões». A frase esteve em todo o lado, a fomentar o espírito de união entre os portugueses. Onze em campo, onze milhões em território nacional, muitos espalhados pelos quatro cantos do mundo – de que os emigrantes que apoiaram incansavelmente a seleção em França foram a face mais visível. Todos a celebrar a vitória portuguesa no Euro 2016. Ficámos eufóricos. Estamos mais felizes. Até quando vai durar esta sensação?

O que aconteceu com Tal Ben-Shahar aos 16 anos instiga a uma breve reflexão sobre o estado de felicidade que resulta de uma vitória desportiva. O jovem teve o dia mais feliz da sua vida quando se tornou campeão nacional de squash em Israel, em 1986. Mas, para sua surpresa, a felicidade durou apenas algumas horas. A euforia que sentira depois da partida final e da comemoração conjunta com a família e amigos foi diminuindo e dando lugar a uma sensação prolongada de vazio. Tentou convencer-se de que estava a passar pela tristeza temporária que se segue a uma euforia esmagadora, mas os dias e meses passaram e o jovem continuou a sentir-se infeliz. Até que percebeu: a felicidade não se resumia a um momento de glória.

No rescaldo de um jogo que ficará para sempre na história do futebol português, é de glória que se fala. Portugal derrotou França e conquistou, pela primeira vez, o título de campeão europeu. O som do apito final, a confirmar a vitória da seleção, desencadeou entre os portugueses uma onda de euforia sem limites. Por todo o país e em tantas cidades além-fronteiras deram-se abraços, trocaram-se beijos, ouviram-se gritos, esboçaram-se sorrisos, soltaram-se lágrimas. O futebol gera emoções. E as emoções que ontem nos inundaram não foram muito diferentes daquelas que o jovem Ben-Shahar vivenciou: êxtase, contentamento, alegria, prazer. Emoções fugazes que «apesar de serem agradáveis e significativas, não são os pilares da felicidade [duradoura]», diz o agora escritor e professor na Universidade de Harvard, nos EUA, no livro Aprenda a Ser Feliz (ed. Lua de Papel).

Um estudo de Georgios Kavetsos e Stefan Szymanski, professores nas universidades de Queen Mary (Reino Unido) e Michigan (EUA), respetivamente, revelou que o impacto dos sucessos futebolísticos sobre a felicidade dos adeptos só tem uma expressão significativa a curto prazo. «Qualquer emoção é como um passageiro na nossa vida, vem e vai. Também a felicidade que advém de uma vitória é passageira. Boa, mas passageira», diz Inês Custódio, psicóloga na Oficina da Psicologia, quando questionada sobre a duração desta vaga de euforia – ou será “euroforia”?

Foram os primeiros empates e as vitórias à justa que conseguiram levar o país à final do Euro 2016. Pouco a pouco, os portugueses foram alimentando a esperança de verem a sua seleção sagrar-se campeã da Europa e agarraram-se ao desejo de vencer a taça que, doze anos antes, na final do Euro 2004, fora parar às mãos da Grécia. Apesar das críticas às opções do selecionador Fernando Santos e das dúvidas perante a qualidade deste conjunto de jogadores, quando comparado com outros eleitos em anteriores provas internacionais, jogo após jogo, as expetativas foram crescendo, a par com a ansiedade.

E ontem, quando a bola entrou na baliza de Hugo Lloris, aos 109 minutos, naquele golo apontado pelo «patinho feio que agora é bonito» Éder, o povo português festejou, eufórico. «A euforia em torno do futebol e da nossa seleção está muito relacionada com a própria identidade nacional que construímos ao longo dos anos e que, para muitos, é uma expressão cultural, uma forma de nos sentirmos (mais) portugueses», diz a psicóloga. «Mesmo que pouco envolvidos no futebol, temos o desejo comum de vencer.»

Infelizmente, a felicidade que advém de uma vitória não dura para sempre. «Existem vários momentos para estarmos felizes na vida e este pode ser um deles para muitas pessoas. Mas somos humanos, e em pouco tempo a nossa atenção será desviada para o próximo desafio, o próximo campeonato» diz a psicóloga. «Já estaremos focados na próxima disputa e na próxima possibilidade de ganhar pela equipa nacional ou pelo nosso clube. Afinal é isso que nos motiva tanto no futebol.»

E com tudo isto, quanto tempo, afinal, será expectável que dure este estado que nos faz esquecer a crise e as sanções económicas e os apertos financeiros? Dependerá de pessoa para pessoa. Hoje, segunda-feira, gostaríamos que o dia fosse feriado, para justificar a falta de atenção que teremos no trabalho. Ou que houvesse tolerância de ponto, vá. Amanhã talvez assentemos os pés no chão. E no final da semana a sensação já se terá dissipado. Até lá, é aproveitar…