O meu herói é mais forte que o teu

Não são fãs obcecados, mas defendem com galhardia o respetivo herói. Paulo Pires escolheu Corto Maltese, o protagonista da banda desenhada homónima de Hugo Pratt, herói da adolescência. Pedro Fernandes preferiu Super-Homem, o personagem extraordinário dos comics da DC, inclinação que vem desde a infância. Combate desigual? Nem tanto: cada um tem os seus argumentos e trunfos.

Pedro Fernandes provoca, «creio que não há dúvidas, o Super-Homem supera o Corto Maltese. Aliás, talvez eu devesse ter escolhido o Indiana Jones para estar mais ao nível do Corto. Mas devo dizer que mesmo que o Paulo tivesse escolhido o Batman, o meu herói ganharia na mesma».

Na verdade, Batman vs. Super-Homem, de Zack Snyder, é o título do filme mais esperado de 2016, uma história que imagina um confronto entre os dois super-heróis mais afamados do planeta. «A minha relação com o Corto Maltese começou na adolescência. Lia também o Michel Vaillant, mas o Corto Maltese foi-me ficando, apesar de não ser literatura para crianças», diz Paulo Pires que, em seguida, pergunta com escárnio ao seu oponente: «Mas continuas a ler o Super-Homem?» A resposta não se faz esperar: «Claro que o Super-Homem é o melhor herói, mas com esta idade já não leio livros aos quadradinhos. A única banda desenhada que leio é a dos Simpsons, que é ótima. A verdade é que gosto da personagem, continua no meu imaginário. Quando era muito miúdo sonhava que estava a voar no meu quarto. Sonhava que conseguia mesmo levitar! Vamos lá ser sérios! O Super-Homem tem todos os poderes. Nenhum outro super-herói se lhe compara. Este meu ídolo não precisa de picadas de aranhas, nem de construir gerigonças. Não sei, mas tudo o que veio a seguir parece treta.»

Pires volta a responder com um olhar de desdém: «Pois, mas o Corto Maltese é um hino à liberdade. Trata-se de um tipo um bocado errante, com um modo de vida evasivo. Pode não ser propriamente um herói mas atrai-me todo aquele imaginário da viagem e o facto de estar sempre metido em aventuras, muitas delas relacionadas com eventos reais e acontecimentos mundiais da altura.» O entusiasmo das palavras do ator é grande e prossegue: «A figura do Corto Maltese é de charme! É um tipo que também é capaz de convocar referências culturais – às tantas até menciona Baudelaire e Rimbaud! Claro que tudo isso é usado para o engate e obviamente ele engata sempre a rapariga… Porém, mesmo quando sentimos que há uma paixão por uma mulher, ele depois parte. É incrível esse seu lado misterioso.» Pedro Fernandes deixa no ar uma questão: «Identificas-te com ele?» «No fundo, o Corto é aquele homem que todos nós gostávamos um bocado de ser, mas eu não posso dizer isso – sou casado. Curiosamente, penso que o Super-Homem é um bocadinho o marido ideal, enquanto o Corto é o amante ideal. Vamos lá ser claros, numa coisa o Corto Maltese ganha neste duelo: atrai muito mais as mulheres», remata Paulo Pires. Nesse aspeto, até o fã do herói de Kripton concede: «Pois, aquela licra do fato do meu herói é capaz de não atrair muitas miúdas.»

Como é que alguém depois dos 30 continua a ser do clube do Super-Homem? Pedro brinca, dizendo que é um puto. A empatia aconteceu com os filmes dos anos 1980: «Foram sobretudo os dois primeiros filmes com o Christopher Reeve. Estive quase a atirar-me de uma janela com o desejo de voar. E mascarei-me de Super-Homem com um fato feito pela minha mãe.» Nesse aspeto, a vantagem foi para Paulo Pires, que, em 1993, fez de Corto Maltese no cinema, em Zéfiro, média-metragem do malogrado José Álvaro Morais. «Tinha umas grandes suíças e um chapéu que mal me servia! Foi a minha estreia em cinema. Creio que foi a Isabel Branco quem disse ao Zé Álvaro que eu tinha algo do Corto Maltese…», recorda o ator.

Procuramos achas para a fogueira e o defensor de Corto Maltese atira-as: «Penso que não são dois tipos que se misturem facilmente. Não os estou a ver a ir para os copos juntos… A única coisa que estou a ver é o Corto Maltese ser um conselheiro de moda para o Super-Homem. É óbvio que o Corto Maltese tem um certo estilo, sobretudo com aquele sobretudo. Agora a sério, é uma personagem solitária e, apesar de ter amigos, eles são bas-fond – não têm nada que ver com o Super-Homem.» «Bom, começo a ficar com curiosidade! Se calhar, vou ter de ler qualquer coisa do Corto Maltese», dá o braço a torcer o discípulo de Super-Homem…

PEDRO FERNANDES
Antes de se estrear na televisão, na RTP 2, com a Revolta dos Pastéis de Nata, era um designer gráfico de sucesso. Para além da apresentação televisiva no 5 Para a Meia-Noite, experimentou ser ator de cinema com Eclipse em Portugal, comédia negra estreada em 2014. É o apresentador do 5 Para a Meia-Noite, às quintas-feiras, e o novo apresentador do concurso The Big Picture, na RTP 1. Para o ano, será o protagonista de um solo teatral com textos de Edson Athayde.

PAULO PIRES
É um dos rostos mais conhecidos da televisão nacional em inúmeras telenovelas, mas o seu trabalho mais elogiado tem sido no cinema, em filmes como Cinco Dias, Cinco Noites, de José Fonseca e Costa ou A Uma Hora Incerta, de Carlos Saboga. Começou a carreira como modelo. Participa na telenovela da TVI, A Única Mulher e esta semana estará no palco do Teatro do Bolhão, no Porto, na peça Silvia, de A.R. Gurney.