Querido Júlio,
Antes de começar quero prestar uma homenagem a um grande Homem. Portugal ficou mais pobre ao perder o Paulo Cunha e Silva, vereador da Câmara do Porto, um Homem com uma paixão e uma visão da cultura invulgares, que fazia a cultura acontecer, num país a contravapor nesta área!
E é de Homens com H que escrevo. Acompanho regularmente as inquietações masculinas e vejo homens a sofrer em demasia porque o pénis não se ergue, impedindo-os de cumprir o seu desígnio sexual.
Aos mais ansiosos vou-lhes fazendo ver que o mais importante numa relação íntima é o homem por detrás do pénis. Sabemos que muitas situações são episódicas e que depois de enganarmos a ansiedade a situação altera-se. É preciso dizer que o que uma mulher deseja é sentir que tem um homem com H, e que para ter esse entendimento é preciso ser-se uma Mulher com M, para evitar um discurso corrente sobre sexualidade, que só reforça as disfuncionalidades. Será o mesmo para os parceiros Homens. Se assim não fosse, não precisaríamos de ninguém, bastaria «iniciar uma relação» com um dildo ou um vibrador, sem termos o «inconveniente» de ter o homem agarrado a eles.
Júlio, conto-lhe uma história para aliviar os mais inquietos e porque ajuda a desmistificar esta visão falo-centrada da sexualidade. Antes do mais quero dizer-lhe que não tenho nada contra o falo, já que é um órgão bonito e muito interessante, apenas penso que «Deus» o colocou na posição errada, porque obrigou os homens a fazerem-lhe reverência todos os dias, criando uma espécie de narcisismo peniano irremediável. Se o pénis tivesse «surgido» numa nádega ou num ombro, talvez pudéssemos ser mais felizes e veríamos com mais clarividência o Homem e não o seu atributo. Uma amiga, que me autorizou a contar a sua história, conheceu recentemente um homem. Ela já tinha tido outros parceiros, mas pela primeira vez na sua vida algo de diferente aconteceu. Ela contou-me que desconfiava de que o homem com quem teria jantado num congresso devia ter algum problema do foro sexual, mas ela não aprofundou essa questão. Nessa altura perguntei-lhe: «Se for verdade, e se ele não tiver ereção, isso é um problema para ti?» A expressão dela dizia tudo. O certo é que voltaram a encontrar-se e, então, ficou claro para ela que ele já não teria ereção há mais de dois anos em consequência de uma cirurgia radical a que teria sido sujeito. Nessa altura, ele, confrontado com a sua nova existência, teria decidido não voltar a ter uma parceira, porque achava que tinha deixado de ter competência para satisfazer uma mulher. A minha amiga, que sabe que o prazer sexual feminino não se reduz à penetração, avançou. Posso dizer que talvez tenha encontrado a satisfação sexual que nunca teve com outros parceiros apressados em avançar para a penetração e sem atenção às suas necessidades. Vejo-os felizes e vejo que o seu Homem também o é porque conseguiu compreender que a grandeza da sexualidade não se reduz à competência do falo.
O segredo está em saber olhar cada situação numa nova perspectiva . O número seis, por exemplo, dependendo da posição em que cada um se encontra, pode ser visto como 6 ou 9. E com criatividade talvez sejamos capazes de ver um 7, concorda?
[Publicado originalmente na edição de 22 de novembro de 2015]