O embaixador João Vale de Almeida conhece de perto os líderes mundiais. E dá-nos uma visão do que eles pensam, nestes dias difíceis.
Há cerca de um mês, em Coimbra, uma plateia interessada ouvia o embaixador João Vale de Almeida falar sobre os desafios da globalização e do desenvolvimento num debate, organizado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos. O português que é o embaixador da União Europeia junto da ONU, que foi braço direito de Durão Barroso, esteve no gabinete de Jacques Delors, não sendo diplomata de carreira ganhou o élan dos anglo-saxónicos e o charme dos francófonos. Talvez por isso não parecesse tão dantesco o cenário que traçou.
Na verdade, era assustador, o retrato do mundo feito por este homem que o conhece bem. Estamos a viver um fim de um ciclo, em que, como todos, saímos do conhecido e saltámos para o desconhecido. João Vale de Almeida falou da ameaça terrorista. Explicou-a como bastante incontrolável e crescente. E quem estivesse atento às suas palavras podia detetar nelas um prenúncio dos atentados de Paris. Estava lá tudo. Nós é que não sabíamos.
«O mundo é hoje mais difícil de gerir, mais imprevisível e mais volátil», disse o embaixador, nesse debate. E disse-o também na entrevista que publicamos hoje – que foi feita em dois tempos, antes e depois dos atentados. Ele, que está tão perto dos líderes mundiais, que os conhece mesmo – foi um dos dois únicos portugueses nas conferências do G8 – e não apenas na imagem bidimensional que deles temos nos meios de comunicação social, confidencia que até para eles ou, melhor, sobretudo para eles, as coisas estão difíceis de gerir.
«Não é possível encontrar respostas simples para problemas complexos», diz. Quando isso acontece temos ou guerras ou populismos perigosos que a elas conduzem, com o extremar de posições e os maniqueísmos que se autoalimentam.
É também por isso que é importante a entrevista que hoje publicamos com o embaixador João Vale de Almeida – ela ajuda-nos a espreitar para esse mundo onde tudo se decide. E a realidade está ali, a cinzento, entre as conversas de café e os «achismos» do Facebook, entre os juízes de sofá e as cátedras dos comentadores. Para lá das opiniões a preto e branco. É isso que João Vale de Almeida explica, numa entrevista em que tem mil cuidados, obviamente, dada a sua posição na diplomacia do mundo. Mas na qual abre um pouco o jogo. Nomeadamente sobre ele próprio, contando episódios da vida do adolescente que queria mudar o mundo e entrou nos jornais (mais especificamente no Diário de Notícias) para o fazer, e depois percebeu que a política, e sobretudo a política europeia, poderia ser melhor lugar para o conseguir.
E é este o desafio: estamos num ponto de evolução do desenvolvimento humano (que, aliás, era o tema do debate), de direitos humanos e respeito por eles, que não nos permite lutar de igual para igual nesta nova guerra. E, no entanto, somos impelidos a fazê-lo sob pena de nos destruirmos, e, pior do que isso, destruirmos o nosso paradigma.
Como fazê-lo? Como sair do nosso mundo confortável, das nossas lutas, simpáticas mas fúteis, do nosso patamar de desenvolvimento, para voltar a pegar em armas, ir para a lama do combate a sério, e não apenas ideológico? Esta entrevista aclara um pouco estas e outras questões, em que todos pensámos e pensamos muito por estes dias.
[Publicado originalmente na edição de 29 de novembro de 2015]