Como vencer a ansiedade

Há pessoas que vivem num constante entrelaçar de preocupações. Com ou sem fundamento, simplesmente porque não conseguem evitá-las. Acabam por viver esmagadas pela ansiedade e o corpo e a mente pagam a fatura. Mas não tem de ser assim.

Todos temos preocupações ou circunstâncias que nos deixam ansiosos no dia‑a‑dia. Com o trabalho, a saúde, a família. É perfeitamente natural. A ansiedade é uma emoção necessária para a nossa sobrevivência. Alerta‑nos para a presença de um potencial perigo ou ameaça e prepara‑nos para nos protegermos de situações danosas. Muitas pessoas sentem ansiedade quando enfrentam um problema no trabalho, momentos antes de fazer um exame ou de tomar uma decisão importante. Sob este ponto de vista, a ansiedade, em níveis aceitáveis, melhora o nosso desempenho aumentando as nossas capacidades para resolver os assuntos que nos deixam ansiosos.

O problema surge quando as preocupações e, consequentemente, a ansiedade se tornam excessivas e sistemáticas. Quando fogem ao controlo da pessoa e tomam conta dos seus dias. Nessa altura a ansiedade leva a melhor sobre nós e passa a ser uma doença. Há quem diga, com humor, que é um mau uso da imaginação. Os médicos chamam‑lhe perturbação de ansiedade generalizada (PAG). «Trata‑se de uma patologia em que o indivíduo apresenta ansiedade excessiva e persistente, desproporcional ou injustificável face aos fatores que a causam» ou em relação a algo que pode ou não vir a acontecer no futuro, explica o psiquiatra Cláudio Moraes Sarmento.

Inquietação, inquietação
Ao contrário de uma fobia, em que o receio está associado a uma coisa ou situação específica, a ansiedade generalizada é um sentimento global de inquietação perante as várias circunstâncias da vida: situações no emprego, dinheiro, saúde de familiares, tarefas domésticas ou chegar tarde a um encontro são alguns exemplos do dia-a-dia que podem motivar essa preocupação desmesurada. É certo que qualquer pessoa pode ter essas preocupações, mas quem sofre deste problema não tem controlo sobre elas.

Robert L. Leahy, autor do livro The Worry Cure – Seven Steps to Stop Worry from Stopping You, apelida a ansiedade generalizada de «a doença do E se…», pois este é o principal tipo de preocupação das pessoas ansiosas. E se eu não desliguei o gás? E se eu não levar chapéu‑de‑chuva, chover e ficar doente? E se eu não mudar de emprego? Preocupam‑se com um sem-número de diferentes situações e acabam por saltar de preocupação em preocupação, prevendo uma catástrofe atrás de outra. Mais: acabam por se preocupar com o facto de se preocuparem tanto.

O corpo é que paga
A maioria de nós quando tem algum problema consegue pensar nele mas, quando necessário, também consegue dar atenção a tarefas mais prementes. Já «uma pessoa que sofre de perturbação de ansiedade generalizada tem muito mais dificuldade em fazer esta mudança atencional e sente‑se “encravado” na preocupação», diz o psicólogo Nuno Mendes Duarte. Para ela tudo assume proporções catastróficas. A incerteza e dúvida em relação aos acontecimentos futuros deixa‑a em constante sobressalto e angústia. E o resultado final ou o desfecho das situações imaginados inclinam‑se sempre para o pior.

A questão é que quando os pensamentos negativos andam à solta não é apenas a psique que sofre. O corpo também paga um preço elevado pela ansiedade desmesurada. A fadiga é um dos primeiros sinais. Seguem‑se as dores musculares, dificuldades de concentração e memória, irritabilidade, palpitações, dores de estômago, alterações do sono e um mal‑estar indefinido para o qual não se encontra justificação aparente, entre muitos outros sintomas. É assim nas diferentes fases da vida em que a ansiedade se manifesta, embora com consequências algo diferenciadas. Porque na adolescência predominam as dificuldades escolares e de aprendizagem e na idade adulta o maior prejuízo reside nas dificuldades afetivas.

Para que a ansiedade seja considerada patológica, Cláudio Moraes Sarmento revela que o problema tem de persistir no tempo, pelo menos, seis meses, e interferir de forma significativa nas atividades e nas relações do dia‑a‑dia. «E, além da ansiedade e preocupação desmedidas, deve apresentar também pelo menos três dos seguintes sintomas: inquietação persistente, fadiga, irritabilidade, dificuldades de concentração, tensão muscular e/ou perturbações do sono.»

A causa das coisas
Nas estatísticas da ansiedade, a balança não pende a favor das mulheres, que são o alvo preferencial do problema. Embora não se conheça as razões, a prevalência nas mulheres é quase o dobro do que nos homens. Estima‑se que entre três e cinco por cento dos adultos irão sofrer de ansiedade generalizada, em algum momento da vida, durante um ano. Este é o tipo de transtorno da ansiedade mais comum e que afeta mais portugueses.

«Muitas das pessoas que sofrem de perturbação de ansiedade generalizada referem ter‑se sentido tensas ou nervosas durante grande parte da sua vida», afirma Nuno Mendes Duarte. De acordo com a American Psychiatric Academy, apesar de esta perturbação poder surgir depois dos 20 anos, mais de 50 por cento das pessoas sentem‑se ansiosas desde a infância ou adolescência. Na sua origem está um conjunto de fatores biológicos e ambientais, muitas vezes desconhecidos. Porém, como Robert L. Leahy refere no seu livro, existem estudos que comprovam haver uma predisposição genética para a ansiedade generalizada, assim como se sabe que pessoas inseguras em termos afetivos, que têm medo de lidar com novas situações ou que viveram traumas na infância, correm maior risco.

Luz ao fundo do túnel
Mas mais importante do que conhecer as potenciais causas da ansiedade generalizada é perceber que esta pode ser tratada e controlada. É verdade que a perturbação da ansiedade generalizada é progressiva: sem tratamento eficaz, vai piorando, especialmente em situações de stress acrescido. Em alguns casos, pode abrir portas para outras perturbações, como ataques de pânico, depressão e ao abuso de substâncias e de álcool. Mas não tem de ser um bicho-de-sete-cabeças. Para isso, é essencial que haja um diagnóstico e um tratamento precoces. Entre a medicação e a psicoterapia, o objetivo imediato é tentar aliviar o espírito e o corpo deste fardo tão pesado, avançando depois para uma abordagem mais profunda desta vulnerabilidade, de forma a aprender a identificar e a modificar ou a controlar esses pensamentos ansiosos. Não podemos esquecer, porém, que esta é uma doença crónica, pelo que, «mesmo que identificada a situação e a intervenção seja atempada, existe a probabilidade de alguns sintomas surgirem periodicamente ao longo da vida», lembra Nuno Mendes Duarte.

Paralelamente ao tratamento, devem ser implementadas algumas mudanças no estilo de vida, até porque, como Cláudio Moraes Sarmento sublinha, não se pode prevenir a ansiedade generalizada. Apesar disso, «existem comportamentos suscetíveis de agravar a ansiedade, nomeadamente estimulantes, como o café, o chá e o tabaco, que deverão ser evitados», adverte o psiquiatra. Aprender algumas técnicas de relaxamento, de gestão de tempo, praticar regularmente exercício físico e fazer uma alimentação saudável são outras das estratégias que podem ajudar os mais ansiosos a libertar‑se um pouco e a focar‑se no aqui e agora.

ANSIEDADE SOB CONTROLO

Para quebrar a espiral da ansiedade em que vive, o psicólogo Nuno Mendes Duarte deixa-lhe alguns conselhos:

Estruturar o dia-a-dia para privilegiar momentos de relaxamento e diminuição de tensão muscular.

Assegurar uma boa «higiene de sono» ou seja, conhecer as regras para garantir um sono reparador.

Gerir adequadamente o nosso tempo para que nos sintamos, o menos possível, assoberbados pelas tarefas do dia-a-dia.

Avaliar como está a nossa «balança de sacrifício», ou seja, que standards estamos a colocar perante nós próprios e quais os custos e benefícios de o fazermos de forma
persistente.

Aprender e praticar o mindfulness.