Decisões de ano novo, quem as não faz? Mesmo que seja no mais íntimo lugar da consciência, enquanto brinda com o espumante ou engole as 12 passas? Ora decisões de ano novo não são desejos de ano novo, e pode ser pouco saudável confundir umas com os outros. Ora aí está uma boa decisão de ano novo: fazer que os desejos de ano novo sejam as decisões de ano novo. Isto é, fazer que os nossos desejos sejam algo que esteja ao nosso alcance, trazê-los à medida da nossa vontade. Só isso já diminuirá imediatamente a probabilidade de frustração. E começar um novo ano frustrado pode ser, como todos sabemos por experiência própria, meio caminho andado para arrasar com todas as decisões de ano novo, levando consigo, por sua vez, todos os desejos.
Andei pela internet nestes últimos dias de 2014 e primeiros dias de 2015 à procura das melhores resoluções. Oh, admirável mundo novo das listas! Encontrei de tudo para me guiar nesta época – e em muito digeríveis pontos de leitura separados. Antes de mais nada, percebi, é preciso saber o que é uma boa decisão. Ou uma decisão exequível. A diferença está entre as condições necessárias e as suficientes – pensar se temos as primeiras é meio caminho andado para tomar decisões exequíveis. A maior parte das fórmulas para uma boa decisão envolve uma grande quantidade de lógica, o B-A-Ba do pensamento adulto tantas vezes relegado para segundo plano. Segundo o site IttyBiz, uma espécie de autoajuda para a área da gestão, as nossas decisões ajudam-nos a andar pelo mundo. Algumas, intrínsecas, permitem-nos pôr as decisões quotidianas em piloto automático. Um exemplo: se decidimos que queremos perder vinte quilos até ao nosso aniversário, o nosso cérebro vai encontrar maneiras de maximizar o sucesso e minimizar a falha. Se não tomarmos a decisão específica, o cérebro continua a atuar de forma igual, e há muita probabilidade de falhar.
Encontrei também na minha busca o 2.0 dos conselhos sobre decisões – como fazer que as decisões deste ano sejam mesmo para cumprir. Exemplo: se querem perder peso, peçam a um colega de trabalho ou amigo que vos tire dinheiro da conta de cada vez que vos vir a comer porcarias. Outro: se querem mesmo poupar, planeiem uma transferência automática da vossa conta todos os meses para uma conta da qual não têm cartão multibanco.
Aprendi também que para cada uma das decisões que tomar, sejam elas o tão falado regime de emagrecimento ou simplesmente encontrar mais os amigos, ou mesmo – pasme-se – passar menos tempo inútil online, há uma aplicação para o meu telemóvel que pode ajudar-me. Há guias para uma vida mais verde, mas também um calendário automático que me obrigará, em teoria, a, naquele dia, àquela hora, encontrar-me com aquele amigo que não vejo há tanto tempo.
E encontrei a metafísica das dicas sobre decisões: como analisar por que as nossas decisões de ano novo não foram cumpridas ou, melhor ainda, como saber largar rapidamente uma decisão se a nossa avaliação sobre ela for negativa, logo nos primeiros dias de janeiro. Pensamento prospetivo, dizem os sites de autoajuda. E leveza de espírito.
Na minha busca internética descobri até que as más decisões são normalmente tomadas nos nossos anos de transição – quando temos 29, 39, 49 anos. Porque é disso que se trata: o tempo, o último reduto do inatingível para nós, humanos modernos. As listas da internet permitem-nos a falsa ilusão de que o conseguimos controlar. Assim como as mudanças de ano nos dão a sensação de que, pelo menos naquela mudança marcante do calendário, o dominamos.
[Publicado na edição de 4 de janeiro de 2015]