Uma errata, um número e um conselho para 2014

Notícias Magazine

Quero começar com uma errata que é também uma con­firmação. Há duas edições escrevi aqui neste espaço uma crónica em que falava das minhas recentes idas ao aeroporto de Lisboa, e como me impressionou a quantidade de emigrantes que vi a regressarem. Eram regressos emotivos, sérios, de gen­te que vinha sozinha e com as lágrimas no rosto, e tinha prati­camente a família toda à espera. Não eram regressos de quem foi pavonear-se para o estrangeiro por diversão, mas de quem anda lá fora a lutar pela vida – uma frase que se deixou apim­balhar pela publicidade, mas que resume, como nenhuma ou­tra, aquilo que fazem os emigrantes. Saem do seu país porque têm de sair, porque uma pessoa tem de fazer o que uma pessoa tem de fazer: tratar da família, cuidar dos filhos, dar-lhes uma vida digna.

Era óbvio que este havia de ser um assunto muito media­tizado nesta época natalícia, como acabou por acontecer, com reportagens sobre reportagens no aeroporto e noutras festas de regresso, com gente a falar para as câmaras de bochechas ver­melhas, congestionadas de emoção e do calor da chegada. Já não era tão natural que fossem divulgados dados oficiais desta nos­sa sina. E esses dados tornaram a minha crónica ainda mais atual – que mais pode um jornalista querer? –, mas, por outro la­do, mostraram que estava completamente desatualizada nos nú­meros. Afinal, não eram 50 mil os novos emigrantes, como eu ti­nha escrito, a partir de dados oficiais do INE, de 2012, mas 120 mil, veio dizer o governo, por aqueles dias. A notícia acabou por sair no próprio dia da crónica, o que fez que muitos leitores ti­vessem ficado baralhados – e com toda a razão.

Os números dos jornais diziam que a emigração era mais do dobro da que eu dizia na minha crónica. Assim se explicava a afluên­cia nas chegadas, que eu vira, e, também, se diagnosticava ain­da melhor a nossa desgraça, a acutilância da nossa crise. Para além do drama individual que eu bem vi naquela sala de chegadas, há, nestes números, o drama coletivo de estarmos a assistir, como país, como comunidade, ao desbaratar de uma geração. A maior parte dos emi­grantes são gente com formação e que não pode exercer o seu talen­to – reparem que não disse profissão – em Portugal. Uma coisa é sair porque se quer, porque se acha, e bem, que se deve ver outras latitu­des, confrontar-se com outras culturas, abrir os olhos e a cabeça. Ou­tra, bem diferente, é sair porque não se consegue fazer outra coisa. Portugal, ninguém duvida, é um país lindo para viver. Era o paraíso se fosse também excelente para trabalhar.

Mas não queremos começar o ano neste tom desespe­rado. E é por isso que hoje, primeira edição de 2014, abrimos com uma reportagem que explica como livrar-se de um hábito que nos é caro e que é uma das maiores razões dos nossos falhanços: pro­crastinar. Adiamos as coisas que temos de fazer e, depois, fazemo–las tarde e mal. Nós, aqui em Portugal, gostamos de dar a desculpa que conseguimos sempre fazer tudo depressa e bem. É o habitual desenrascar. Mas essa palavra, que mais não fosse porque é tão feia, devia ser erradicada do nosso dicionário – como bem sabem todos os que vão trabalhar no estrangeiro e são confrontados com outros e mais exigentes hábitos. Por isso começamos este ano a fazer-lhe uma proposta, caro leitor e cara leitora: não procrastine. Por um la­do, é um verbo que enrola a língua e se torna dificílimo de conjugar. Por outro, não lhe faz bem nenhum. E bom 2014.

[05-01-2014]