
A internet está cheia de citações sobre livros e o poder da literatura, e eu podia ter dado um salto ao www.citador.pt à procura de uma frase bonitinha, dessas que a malta coloca no perfil de Facebook, como se verdadeiramente conhecessem a obra daquele autor. Mas não seria a mesma coisa. O melhor é ir direto ao assunto. Daí o título.
Se tentasse ser pouco original, poderia escrever que há poucas coisas tão atraentes como ver uma mulher, sozinha, de volta dos livros. Mas, assim de repente, consigo lembrar-me de dezenas de coisas mais atraentes do que isso. E todas envolvem mulheres. E alguns cenários mais propícios a amassos do que os espaços entre as barracas das editoras. Ainda assim, o local exerce um estranho fascínio. Infelizmente, porém, pelo menos para mim, isso nunca se traduziu em conquistas. A Feira do Livro até pode ser um sítio de jeito para conhecer alguém, mas eu nunca me safei. E não passei a vida a tentar, mas foram muitas as vezes em que pensei nisso. Haverá, com certeza, engates épicos que começaram a desenhar-se numa Feira do Livro, mas eu não tenho nenhum para contar. Apenas para idealizar.
Em quarenta anos de vida, o cenário mais frequente em que tive vontade de ganhar coragem para entabular uma conversa com alguém envolveu sempre lombadas e capas de livros. Não foi em bares, não foi na praia, não foi no metro, não foi no trabalho. Foi em livrarias ou em feiras do livro. E isso não faz de mim um pseudointelectualoide armado em inteligente. A verdade é que gosto mesmo de ver uma mulher gira a andar, devagar, entre bancas de livros, a deslizar o olhar entre edições de autor e capas foleiras, entre «livros do dia» e pechinchas ao preço da uva mijona. E gosto, sobretudo, de imaginar. De a imaginar.
O mais certo é que ela não queira ser incomodada, admito. Era o que mais lhe faltava, ter um fulano a fazer-lhe olhinhos entre livros de capa dura. Mas isso não me impediu, tantas vezes de tentar perceber que raio de livro é que ela procurava. De imaginar onde é que ela iria ler aquele que tinha acabado de comprar. Na esplanada? No sofá? Na casa de banho? E que capa esquisita era aquela que ela tinha na mão? E, raios, era mesmo aquele livro que ela se preparava para comprar? Bolas, uma mulher tão gira a comprar aquele livro palermas. Que desperdício.
O que leva a outro ponto para divagar. Em que tantas vezes divaguei. O que é preferível? A miúda gira que compra um livro de um autor com o qual gozamos? Ou o estafermo, feia como os trovões, que acaba de pedir um livro que já lemos e de que gostamos muito? E que tem, debaixo do braço, outro livro que admiramos e um que gostaríamos de ler.
Nunca fui atrás de ninguém para falar sobre um livro que já li e para recomendar a leitura de outro, do mesmo autor. Nunca consegui ter lata, sequer, para perguntar à loura vaporosa ou à morena alta e magra se recomendavam esta ou aquela obra. Mas tive muitas vezes vontade de o fazer.
Estamos no segundo fim de semana da Feira do Livro de Lisboa. Hoje deverá estar cheia, apesar de o tempo não estar de feição, mas, durante a próxima semana, passem por lá. Pode ser que se safem. Não custa tentar. Na pior (!) das hipóteses, compram um livro. No Porto, infelizmente, este ano também não haverá feira. Terão de escolher outro sítio. Para livros e para o resto.
PS: E sim, é possível escrever uma crónica sobre livros sem citar um único autor.