A saudade é um bom negócio

Bacalhau e azeite, sim, mas também pastéis de nata, caracóis e torresmos. A expor­tação de produtos alimentares portugueses está a renovar-se. Sobretudo para França, onde há uma nova clientela. Numa altura em que as vendas batem máximos históricos, metemo-nos num camião e fizemo-nos à estrada para perceber o que está a mudar no mercado da saudade.

Moelas, check. Rissóis de leitão, check. Bola de carne, check. Alheiras de caça, check. Pastéis de nata, check. Nestum Mel, check. Pastéis de bacalhau, check. Queijo da ilha, check. Cara­cóis como em Lisboa, check. Marisco congela­do, check. Chouriço, check. Torresmos, check. Sardinha, check. Queijadas e bolos de coco, check. Bacalhau, azeite e vinho, check, check e check. Mário Ferreira, 53 anos, vai riscando a lista de produtos à me­dida que as paletes vão entrando no camião frigorífico, na Póvoa de Santa Iria, arredores de Lisboa. O motorista da STEF, uma multina­cional de transporte de mercadorias, tem os rituais estudados. To­dos os sábados, entre as onze e a uma, faz o carregamento dos pro­dutos, toneladas de alimentos que cumprem o caminho até Paris. Depois junta-se com alguns condutores, os que cumprem as rotas in­ternacionais, e despacham uma cabidela de coelho numa tasca das redondezas. A partir daí, é estrada e mais estrada.

Sai-se ao sábado e chega-se a Paris na segunda de manhã. «Não podia ser de outra maneira», diz Bartolomeu Sousa, que dirige as operações internacionais da STEF a partir de Portugal. «De ter­ça a sexta vão caindo as encomendas dos importadores. Às vezes estamos a fechar o camião, sábado de manhã, e ainda nos pedem coisas.» Há sete anos, quando a empresa começou a apostar nas ro­tas europeias, não saía mais do que um camião de Lisboa para Pa­ris. Agora, todas as semanas, seguem sete carros. Nas semanas do Natal e da Páscoa até mais do que isso. «É um mercado em grande crescimento, disso não há dúvidas», haveria de dizer-nos mais tar­de Sérgio Soares, diretor da transportadora em Portugal.

Os números dão-lhe razão. Segundo o Gabinete de Estudos e Es­tratégia do Ministério da Economia, as exportações para França não pararam de aumentar nos últimos cinco anos. Em 2009, Por­tugal faturou 3,9 mil milhões de euros em vendas para aquele país mas, em 2013 (os últimos dados disponíveis), o valor era já de 5,49 mil milhões. O país representa quase 12 por cento de todas as exporta­ções portuguesas e é o terceiro mercado de destino dos produtos na­cionais – apenas atrás de Espanha e Alemanha. Do total de vendas, 500 milhões são em produtos agroalimentares – vinhos e comida. Bacalhau, vinho e azeite não são propriamente uma novidade nas exportações. Quase um milhão de portugueses vivem afinal em França, segundo a Secretaria de Estado das Comunidades, que no grosso emigraram nos anos sessenta – e sempre importaram os gé­neros mais tradicionais da gastronomia das suas terras. «Mas, nos útimos anos, começou a haver uma demanda por novos produtos», diz Bartolomeu Sousa. A mesma ideia seria reforçada mais tarde pe­las empresas de importação em França e pelos donos dos restauran­tes e supermercados portugueses. O que se nota é isto: há um gran­de aumento de vendas em refeições e petiscos tradicionais, pré-cozi­nhados e fáceis de fazer. E também seguem cada vez mais alimentos com marcas nacionais específicas: leite com chocolate da UCAL, re­frigerantes Sumol ou Nestum Mel que, apesar de vir de uma marca suíça, é feito apenas para os consumidores portugueses.

Num supermercado dos arredores de Paris, a Casinha Portu­guesa, dá bem para perceber que também há novos consumidores. O espaço, que vende exclusivamente produtos made in Portugal, es­tá em franca expansão e isso não se deve apenas aos emigrantes. O novo mercado está nos luso-descendentes, que gostam da comi­da mas não sabem confecioná-la – por isso compram-na já prepa­rada. E depois há os franceses que vieram de férias e apaixonaram–se pela gastronomia. «Durante anos, a cozinha portuguesa esteve reduzida às tascas e às casas das famílias», diz em Paris Agostinho Gabriel, antigo dono do Saudade de Versalhes, um dos mais bada­lados restaurantes da capital francesa, «mas agora parece que está a sair do armário. Já era tempo.»

PELA ESTRADA FORA
O almoço já vai adiantado e às tantas Mário Ferreira bate com os nós dos dedos na mesa: «Bem, vamos fazer-nos à estrada.» O ca­mião foi selado, lá dentro vão várias paletes – umas com produ­tos congelados, conservados a 22 graus negativos, e outros fres­cos, que seguem a 2 graus. Durante todo o percurso o motorista de 53 anos há de fazer leituras de temperatura para controlar se há alguma avaria no sistema térmico. «É raro, mas pode acontecer.» E nesse caso o destino dos produtos só pode ser um, o lixo.

 

Mário Ferreira, à esquerda, 53 anos, é motorista da STF, multinacional de transporte de mercadorias.
Mário Ferreira, à esquerda, 53 anos, é motorista da STF, multinacional de transporte de mercadorias.

O homem tem 30 anos de alcatrão no lombo e por isso o camião não é um camião, é a sua «princesa». Tem uma cama com vista pa­ra uma televisão que ele próprio instalou – está ligada a um leitor de DVD, para ver filmes nas horas de descanso. Tem um frigorífico onde guarda bebidas frescas, pizas e algumas mercearias fáceis de cozinhar. Nas paragens, não é raro ver um grupo de camionistas a cozinhar junto aos veículos, com fogões de campismo. «Importan­te é nunca sairmos de perto da carga, para não a roubarem. Acon­tece muitas vezes.»

Se o mercado da saudade está a mudar, com novos produtos e clientes, o mesmo não se pode dizer dos homens que asseguram o transporte das mercadorias. Tudo parece obedecer a rituais progra­mados. Sempre os mesmos locais para comer e dormir, as distâncias calculadas ao milímetro, o máximo de portugalidade na rota que es­colhem. Janta-se em Vilar Formoso, para se fazerem os últimos te­lefonemas sem roaming e, se for caso disso, levantar dinheiro sem ta­xas adicionais de multibanco. Depois é estrada até Burgos. As regras para a condução de veículos pesados são apertadas e a legislação é europeia. A cada quatro horas e meia de estrada é obrigatória uma pausa de meia hora e, à noite, tem de se parar nove horas – nem mais, nem menos. E é por isso que em Burgos há uma estação de serviço que parece um enclave português em Espanha – fica a qua­tro horas e meia da fronteira de Vilar Formoso e a outras tan­tas da fronteira com França. Tem um hotel que quase ninguém usa, supermercado e restauran­te, mas a vida acontece realmente cá fora, que é onde grupos de homens se juntam perto dos ca­miões, normalmente por nacionalidade, para dis­cutir a espuma dos dias. Fala-se da estrada, dos aci­dentes, dos clubes de alterne que povoam as mar­gens do alcatrão. «Só há uma coisa de que ninguém fala», diz Mário, «que é sobre a carga que transpor­tamos. Há muitos assaltos e, se alguém te pergun­tar o que leva o camião, tu dizes que carregas bata­tas. Se disseres que levas marisco, é meio caminho andado para teres problemas.»

O parque de estacionamento está organizado com todos os cui­dados. Há uma zona para carros ligeiros, mais perto do café, outra para camiões de lona e só a seguir estão os veículos de frio, que fa­zem mais barulho por causa dos motores de refrigeração. Os veí­culos de transporte de materiais perigosos estão ain­da mais afastados, não vá dar-se algum acidente. De manhã, a cidade motorizada desmonta-se e segue caminho em todas as direções. Toda a saudade que Mário transporta avança para o País Basco, e depois para em Navarra, já pertíssimo de Hendaia.

O almoço cumpre-se num segredo bem guardado – uma tasca à beira da estrada onde 90 por cento da clientela é portuguesa. É o restaurante do Zé Drácu­la, na verdade José Pereira, um camionista de Avei­ro que decidiu mudar de vida. Na ementa há baca­lhau à lagareiro e mão de vaca com grão. «O maior problema que temos é conseguir arranjar os produ­tos portugueses», diz o dono do estabelecimento. «Passa tudo por aqui, mas nada para. Em Paris arranja-se o que se quiser, mas em Espanha é mais difícil.»

Só os camiões de frio podem passar a fronteira ao domingo, mas isso também significa que as estradas estão mais vazias. A velo­cidade máxima é de 90 quilómetros horários, seja em via rápida ou autoestrada, e há operações de polícia ao longo de todo o cami­nho. «Este tipo de mercadoria tem de ser entregue à hora certa, por questões de qualidade, e as autoridades toleram que a malta circu­le quando os outros não podem.» Estamos em França, ninguém travou a marcha da princesa de Mário Ferreira. Agora é seguir até Bordéus e parar para dormir em Poitiers. A música portuguesa en­che a cabina do camião, Mário já tem as rádios sintonizadas para cumprir o caminho.

Na manhã de segunda feira é preciso acordar às seis da manhã, e cumprir quatro horas de viagem até Semois, nos arredores de Orleans, a uma centena de quilómetros de Paris. Aqui será descar­regado o grosso das mercadorias, nos armazéns da ETS Mariano, uma das maiores empresas de importação de produtos alimenta­res portugueses para França. Agora, sim, é tempo de abandonar o alcatrão e começar a perceber como o mercado da saudade está a mudar. Até porque, depois de três dias a bordo de um camião, o cor­po está mais moído do que um hambúrguer.

NOVO MERCADO VELHO
Vítor Mariano tem 68 anos e construiu um império a vender produ­tos portugueses em França. «Comecei em 1980 e tudo o que vendia eram postas de bacalhau em saco, latas de azeitona de cinco quilos e garrafões de vinho de cinco litros.» Fazia o negócio com os cafés e restaurantes portugueses, e com as associações de emigrantes. «De­pois fui começando a importar mais produtos – sobretudo bebidas. Não imagina a revolução que foi trazer vinho em garrafas de 0,75 li­tros. E, de há cinco anos para cá, as coisas explodiram. Entrámos no mercado francês e os lusodescendentes começaram a valorizar o que é feito em Portugal. É uma grande mudança.»

Ao armazém da ETS Mariano chegam todos os anos mil milhões de toneladas de bacalhau seco e o mesmo peso em bacalhau demo­lhado. Em vinho vende três milhões de litros por ano e há corredo­res com embalagens de azeite que depois são distribuídas por to­do o país. Só aquele espaço tem 17 mil metros quadrados, mas o ho­mem tem outros três armazéns em França. «Agora começámos a abrir uma cadeia de supermercados Mariano, especializados em produtos portugueses.» Dois em Paris, um em Tours, outro em Orleans, um em Bordéus, três em Lyon e mais um em La Rochelle.

Vítor Mariano tem 1400 produtos diferentes no armazém e a sua faturação anual é de 17 milhões de euros. Há pastilhas Gorila e Pintarolas, o homem diz que o queijo da serra vende cada vez me­lhor, «e quem haveria de imaginar que íamos vender queijo aos fran­ceses, hem?». Em stock tem 200 garrafas de Barca Velha e agora estão na moda os congelados – refeições pré-cozinhadas, salgados e pas­telaria, sobretudo pastéis de nata. «Orgulho-me de dar emprego a 52 pessoas, todas portuguesas. Mas vou ter de contratar mais, e fran­ceses. É que mais de 20 por cento da minha clientela já é local.»

Bruno Gabriel,  de 32 anos (na foto de abertura com o pai Agostinho Gabriel, ao centro, João Alexandre Ferraria, à esquerda, e Luís Ferraria Rocha, atrás, ambos do Saudade de Versalhes), encarna na perfeição a mudança que o mercado dos produtos portugueses está a sofrer em França. Os pais são de Fátima, ele já nasceu em Paris. O pai, Agostinho Gabriel, tem 64 anos e cumpriu o fado da maioria dos emigrantes. Veio nos anos sessenta, esteve no biddonville de Champigny e acabou por fugir à miséria com um emprego na construção civil. Juntou trocos e abriu uma casa de fados em Versalhes – o Saudade. «Começou tudo por­que eu queria servir caldo verde e em França não havia, então man­dava vir de Famalicão e outras casas pediam-me encomendas.» Nos anos 1990, tornou-se um pequeno importador que servia os restau­rantes portugueses da região. E o Saudade de Versalhes foi ficando relegado para segundo plano.

Bruno entrou no cenário há sete ou oito anos. Nessa altura, a casa de fados tinha fechado, mas o rapaz percebeu que havia um novo mercado a florescer. «Começámos a concentrar-nos em trazer poucos produtos, mas de grande quali­dade.» Mel e compotas, porco preto certifica­do, tortas de Azeitão e jaquinzinhos de Peniche. «A tendência dos franceses pelos produtos gourmet já é antiga e as segunda e terceira ge­rações de portugueses já cresceram com essa mentalidade.» A aposta revelar-se-ia acertada. Nos últimos cinco anos abriram nos arredores de Paris uma série de mercearias e restauran­tes especializados, que apostam na qualidade. Agora, a família Gabriel dedica-se exclusivamente à importação. E decidiu trespassar a casa de fados ao primo de Bruno, que tinha em mãos o projeto de abrir o pri­meiro restaurante de alta-gastronomia portuguesa em França.

À LA PORTUGAISE
As receitas tradicionais, mas com um twist gourmet. Era essa a ideia que João Alexandre Ferraria, 32 anos, tinha para o Saudade de Versa­lhes. «Sempre trabalhei em hotelaria, e estive vários anos a servir às mesas no La Ferme, que é um dos restaurantes mais luxuosos da cida­de.» Um dia bateu-lhe à porta o primo, Luís Ferraria Rocha, dois anos mais novo. Tinha feito o curso de cozinha da Escola Superior de Ho­telaria e Turismo de Lisboa mas não encontrava trabalho em Portu­gal. «Arranjei-lhe uma vaga no La Ferme e começámos os dois a cons­pirar esta ideia. Agora, é uma realidade.» Fala o chef: «Durante qua­tro anos, aproveitei para aprender muitas técnicas da gastronomia francesa e hoje tento aplicá-las à comida portuguesa.» Enquanto João fazia obras no espaço e tornava-o mais arejado, Luís veio para Lisboa passar algumas semanas nas cozinhas de restaurantes por­tugueses. Hoje, o menu tem pratos de grande sucesso – o hambúr­guer de leitão da Bairrada, o escabeche de sardinha com broa ou o tornedó de presunto com puré de tremoços. A clientela, que no início era constituída sobretudo por emigrantes, está cada vez mais fran­cesa. E as críticas ao restaurante na imprensa local dão-lhes ânimo. «É incrível como os portugueses, que têm uma gastronomia tão ri­ca, nunca tiveram a ousadia de internacionalizar a sua comida. Esta­mos no país da alta-cozinha por excelência, e somos o primeiro espa­ço deste género. Mas acredito que não sejamos o último.»

 

Fernando e Fátima de Moura, do Saudade.
Fernando e Fátima de Moura, do Saudade.

No centro de Paris, bem perto do Museu do Louvre, há outro res­taurante que se chama Saudade – e esse é uma instituição. Aqui ser­ve-se o mais tradicional que a comida portuguesa tem para oferecer, cozinhado segundo os métodos da mãe e avó de Fátima de Moura. O marido, Fernando de Moura, tem 50 anos e trabalha ali há 28, mas há nove decidiu comprar a casa e transformá-la. «O Saudade sempre foi muito reconhecido, mas vinham sobretudo os portugueses com mais dinheiro. Agora a maioria são franceses e também vêm muitos angolanos e brasileiros.»

A casa é recomendada pelo guia Michelin – e isso ajuda a que se­ja difícil jantar ali sem reserva. Nas paredes há fotografias das per­sonalidades que passaram pelo Saudade – de Amália a Cesária Évo­ra – e a ementa está cheia de vinhos nacionais de renome. Fernando tem uma teoria para o sucesso da casa: «Penso que a comida gourmet portuguesa tem espaço para crescer em França, há muito mercado entre os franceses e os filhos dos portugueses. Mas um restaurante tradicional de grande qualidade, com bom serviço e boa decoração, funciona sempre bem. Até há cinco anos, existíamos nós e as tascas. Agora, pronto, está tudo a mudar. E ainda bem.»

Não é só na restauração que isto acontece. Em toda a região de Pa­ris estão a abrir novas mercearias e cafés que valorizam os produtos portugueses. O caso mais emblemático é bem capaz de ser o Com­me à Lisbonne, um café que serve diariamente mil pastéis de nata de fabrico próprio e que é um local de peregrinação no bairro do Ma­rais, um dos mais badalados da cidade. O dono é Vítor Silveira e abriu a casa há quatro anos. «O sucesso foi tal que havia filas à porta, a dar a volta ao quarteirão. Então eu decidi comprar o espaço ao lado e abrir uma tasca gourmet.» Ali vendem-se conservas e compotas portugue­sas e até alguma cerâmica nacional. Há tostas de sardinha e de quei­jo de cabra com mel transmontano. «Comecei com três empregados, agora tenho dez e são poucos para o trabalho que temos.»

 

Lurdes Gonçalves e Joel Melou, do Portagne
Lurdes Gonçalves e Joel Melou, do Portagne

Mais longe do centro, na Rua Fourneyron, fica o Mercado de Ba­tignolles e o Portagne, uma banca de mercado que só vende produtos e refeições portugueses, mas cujo dono é um bretão de 62 anos cha­mado Joel Melou. «A loja é portuguesa, eu sou da Bretanha, que em francês se diz Bretagne, por isso o nome é Portagne.» Aqui vende-se bacalhau e azeite, charcutaria e pastéis de nata, mas todos os dias co­zinha-se feijoada à transmontana e bacalhau à Brás, pelas mãos de Lurdes Gonçalves, uma transmontana de 46 anos.

A clientela está dividida em três, diz a mulher. «Um terço são os emigrantes mais antigos, esses levam o bacalhau e outros pro­dutos para cozinhar em casa. Outro terço são os filhos deles, que vêm comprar as refeições prontas e o resto são franceses que já estiveram em Portugal.» Joel anui e diz que, apesar da crise, o ne­gócio vai de vento em popa. «Já nos pedem serviço de catering pa­ra casamentos e batizados. Portugal está na moda. Bendita a hora em que me apaixonei por uma mulher portuguesa e decidi abrir esta banca.»

Mesmo entre os emigrantes, a demanda pelas marcas nacionais cresceu como nunca. Em Thiais, perto do aeroporto de Orly, Miguel Costa e Tony Gomes abriram A Casinha Portuguesa, um supermer­cado de 250 metros quadrados onde não se consegue encontrar ne­nhum produto de outra origem. Têm 37 e 32 anos, respetivamente, e já nasceram em Paris. «Nós sempre passámos férias no Minho e, quando voltávamos a França, tínhamos saudades do leite com cho­colate UCAL, do Sumol de laranja, dos chocolates Regina. Então criámos um espaço que não só tem produtos portugueses como tem essencialmente marcas portuguesas.»
Atum Tenório ou Bom Petisco, café Delta ou Nicola, fiambre No­bre ou Sicasal. Têm uma garrafeira e uma secção de queijos que fa­riam corar de inveja uma mercearia lisboeta e até o corredor dos detergentes e produtos de higiene é exclusivamente nacional. «Abri­mos há oito anos e no início noventa por cento eram portugueses. Agora são quase todos lusodescendentes e franceses», diz Tony. Em outubro estão a preparar a abertura de uma segunda Casinha Por­tuguesa, a trinta quilómetros dali. «O negócio português em Fran­ça não está só a crescer no centro das cidades, onde vivem as clas­ses com mais dinheiro. Também nos subúrbios Portugal está na mo­da, porque as pessoas com menos dinheiro conhecem melhor o país. E isto é bom, para a minha geração e para a geração dos meus pais. Foi preciso passarem cinquenta anos, mas parece que finalmente es­tamos a perder a vergonha de sermos quem somos.»