Se há coisa que gostaria de saber fazer é desenhar. Os meus rabiscos são, no mínimo, um esforço inglório, no máximo, um insulto à nobre arte do desenho e ilustração. Não há volta a dar e muito tenho tentado passar do rabisco para algo minimamente representativo do que quereria ilustrar. No entanto, nunca fui bem-sucedida.
Para mim, que lido com palavras de forma profissional, o facto de nos podermos exprimir com alguns, poucos, traços de lápis, sem recurso a adjectivos, ou figuras de estilo, ou, mais ainda, sem recurso a qualquer palavra, é algo que me deixa curiosa e, ao mesmo tempo, fascinada. Imagino um outro mundo, novo para mim, onde não lutaria com as palavras ou com a missão de as entregar a outros, mas onde poderia comunicar o que quisesse.
As horas que passo juntando palavras, procurando-as por todo o lado, mesmo quando se tentam esconder de mim e as tenho de ir descobrir nos recantos da minha memória, ou, por outro, cantando-as, dando-lhes a vida que elas me pedem e merecem, lutando com o meu instrumento, com a minha habilidade musical e expressiva, para as transmitir da melhor forma possível, poderia passá-las a tentar encontrar o traço certo para transmitir algo que poderia ser traduzido em muitas palavras.
A capacidade de com alguns traços se dizer parágrafos e parágrafos de coisas, de nos fazer sentir algo concreto, real, é quase mágica para quem não saberia por onde começar. É certo que usa signos e que as palavras são, em última instância, também elas signos, traços desenhados que representam algo de real. Servirá decerto de consolo pensar assim. E, para os que, como eu, não integram o grupo dos que falam por imagens, servirá ainda mais de (triste) consolo o maravilhoso mundo dos emojis.
Os emojisão grafismos que representam emoções várias através de caras amarelas e redondas e de outros pictogramas. Começaram por existir no Japão, na internet,e rapidamente ganharam popularidade pelo mundo fora. Com as plataformas sociais, que estimulam a troca de informação de forma preferencialmente sucinta, a utilização destas figuras passou a ser comum.
Misturar a arte da ilustração com as figuras que habitam nos teclados de telemóveis é heresia, com certeza. E nunca se confundirá, deste lado, uma com outra. Seria o mesmo que considerar de igual forma alhos e bugalhos.
Reduzida a emojis, a comunicação torna-se pouco artística e mais possidónia, é certo. As «carinhas sorridentes» são odiadas por muitos precisamente por serem atalhos padronizados de comunicação que se torna, assim, corriqueira. Mas dá um enorme jeito quando não podemos ou queremos pôr em palavras aquilo que queremos dizer a alguém e não temos capacidade de o fazer de outra forma.
O seu entendimento depende geralmente do contexto em que está inserido e vem no seguimento de uma outra forma de comunicação, ou seja, não é autónomo. Surge depois de uma frase, de uma foto, como comentário ao comentário.
Trocam-se diálogos com eles, que podem vir sob a forma de desenho ou utilizando os sinais de pontuação dos teclados. Eles sorriem, choram, emocionam-se, encolerizam-se, transformam–se em corações. Tudo o que quisermos, ao alcance de dois pontos, parêntesis, sinal de maior ou menor que, vírgulas.
Não deixa de ser uma mistura entre o mundo da escrita e o mundo dos desenhos. O que é utilizado na escrita para a expressão servirá para ilustrar, substituindo a palavra. Quase que apetece continuar a aprofundar a ligação que o emoji estabelece entre a escrita e a ilustração. Mas, a emojização da comunicação ilustrada permite-mo fazê-lo simplesmente assim – ;)
ANA BACALHAU ESCREVE DE ACORDO COM A ANTIGA ORTOGRAFIA
* Este é o título escolhido por Ana Bacalhau. Estes caracteres juntos – um “emoticom” – simbolizam um sorriso e um piscar de olho.
Publicado originalmente a 28 de setembro de 2014.