14 apostas para 2014

O ano de 2014 vai ser em grande. Pedimos a 14 personalidades para apostarem em jovens promissores nas suas áreas. Na literatura e na ciência, na música e no cinema, na gastronomia e na tecnologia, na arquitetura e no design, esta é a nossa seleção nacional de esperanças.

 

01 LITERATURA

SUSANA MOREIRA MARQUES

O TEMPO DA NÃO-FICÇÃO

A escolha de Carlos Vaz Marques, jornalista, diretor da revista literária Granta e editor da Tinta-da-China

Susana Moreira Marques es­treou-se na literatura em 2012, e pôs-se logo a escrever sobre morte. «Era um tema que me fascinava, mas eu sabia que era fácil cair na lamechice. Ou então o contrário, uma escrita tão científica e técnica que se tor­naria grotesca, quando o assunto tinha uma tão grande dimensão espiritual.» Nas palavras de Carlos Vaz Marques, que a elegeu como o nome a ter em conta na área da literatura em 2014, Susana conse­guiu uma escrita «contida, sem uma úni­ca palavra a mais». O que é que torna tudo diferente? Agora e Na Hora da Nossa Morte não era um livro de ficção.

A aposta literária para o próximo ano não diz que não venha um dia a escre­ver romances, mas não já. «A realida­de tem uma força que a ficção não tem. Quando vemos um filme e no fim per­cebemos que a história que nos conta­ram é verídica, há um impacto comple­tamente diferente.» Susana, que é jor­nalista free-lancer, tem um novo projeto literário em mãos. Uma memória oral do país, através das histórias de figuras co­mo um resistente antifascista, um pes­cador da Nazaré, um agricultor ou um contrabandista. «No verão fiz uma série de artigos para o Público que contava a história do país através de histórias de vida. É incrível o material que recolhi, são incríveis as histórias que estão por contar neste país.»

Susana Moreira Marques tem 37 anos, passou cinco em Inglaterra como cor­respondente do jornal Público e no ser­viço em português para África da BBC. «O mundo anglo-saxónico cuida melhor da sua história, referencia constante­mente o passado e atualiza-o para o pre­sente. Em Portugal não tratamos nada bem a nossa memória.» No quotidiano português, quantas vezes nos lembra­mos de que ainda há quarenta anos vi­vía­mos em ditadura, estávamos em guerra ou que recebemos de um dia pa­ra o outro centenas de milhares de refu­giados de África?

Um livro de não-ficção não precisa de ser escrito como um artigo jornalístico. Nem como um ensaio. Pode ser escrito como um romance e foi isso que Susana fez com a sua obra de estreia – e isso nem sequer impediu que no livro também fos­sem publicadas fotografias de André Ce­peda. E a autora usa a primeira pessoa, coisa rara em trabalhos de não-ficção. «Expomos tanto a vida dos outros que é quase uma falta de respeito não nos ex­pormos também. No jornalismo apren­demos a retirar-nos da cena, porque isso é o mais honesto. Mas às vezes o mais ho­nesto é assumirmos que estivemos lá.» RICARDO J. RODRIGUES

02 MODA

JOÃO MELO COSTA

UMA VOZ EM ESTILO GRÁFICO

A escolha do designer de moda Luís Buchinho

Há 24 anos a ditar as tendências de moda cá e lá fora, o veterano Luís Buchinho não precisou de pensar muito para eleger um ex–estagiário que, acredita, não passará des­percebido em 2014. «Acho que o João Me­lo Costa vai sobressair, porque tem uma vi­são particular sobre o seu próprio conceito e identidade. Imprime às suas peças um esti­lo gráfico muito contemporâneo, numa on­da descontraída. E tem uma mais-valia, fun­damental num designer de moda nos dias que correm, que é aliar bem o conceptual e o co­mercial.» De facto, se há preocupação que acompanha João Melo Costa durante o pro­cesso de criação é essa: fazer roupas que as pessoas usem no dia a dia, sem sacrificar a li­berdade de criar. E os resultados não se têm feito esperar. Com 23 anos e apenas dois de experiência, obra feita não falta a este miú­do de Valongo. Já pôs cá fora cinco coleções de roupa para mulher, das quais destaca as «três mais importantes»: Stress Look, Mo(u)rning e Welcome Back.

Porque para este estilista a moda não de­ve ser passiva, todas as suas coleções têm uma mensagem subliminar. Com a primei­ra recriou o stress que toma conta do criador quando está a criar: «Era importante trans­mitir logo no primeiro conjunto o momento em que a ideia surge e explode. Por isso uti­lizei vivos estampados para materializar es­ses momentos luminosos na vida de um ar­tista.» Na segunda coleção retratou o luto com alusões ao mar, aos pescadores, à perda de alguém no mar: «Tinha que ver com a re­lação de quem espera, de quem fica em ter­ra e de quem parte para a faina e não volta. Usei cores escuras.» Na terceira, apresenta­da em Londres há três meses, voltou às cores alegres para «celebrar a vida e o regresso de alguém que partiu.» Em nenhuma destas co­leções há uma peça parecida com a primeira que desenhou aos 15 anos: «É natural. O meu estilo evoluiu. Era um vestido azul às bolinhas para a minha irmã levar a uma festa. Não sei onde pus o desenho, era mesmo giro.» A irmã acabou por recorrer ao pronto-a-vestir, mas o vestido que João desenhou para ela foi o iní­cio de uma paixão que culminou no momen­to de escolher uma profissão: «Depois do ensi­no secundário, decidi tirar o curso de moda no CITEX. Ainda andei três meses em Belas-Ar­tes, mas a moda fazia mais sentido para mim.»

E as mulheres parecem estar a acolher bem o estilo arrojado de João. «Não tenho a veleidade de querer competir com a Za­ra [ri-se]. Sempre tive consciência de que as primeiras coleções eram para me posi­cionar. Queria perceber primeiro quem é o meu público-alvo.» E percebeu: «A mulher moderna que não tem medo de arriscar e que está atenta ao que se passa na moda.» CARLA AMARO

03 TECNOLOGIA

HUGO SILVA

MULTIFUNÇÕES PARA A SAÚDE

A escolha de António Câmara, fundador da Ydreams

Distinguido com vários prémios académicos e técnicos, Hugo Silva é a escolha de António Câ­mara na área das Tecnologias, «pelas suas capacidades de invenção e sentido comercial, expressas no bem su­cedido BITalino», explica o fundador da

Ydreams, empresa portuguesa que de­senvolve espaços e experiências interati­vas através da combinação de tecnologia, arte e design.

Aos 34 anos, Hugo Silva tem um currículo notável. Bacharel em Engenharia Informá­tica, mestre em Engenharia Eletrotécnica e estudante de doutoramento de Engenharia Eletrotécnica e Computadores, o investiga­dor do Instituto de Telecomunicações não passa despercebido no mundo das invenções tecnológicas – ganhou o Prémio Maior Ino­vação 2103 e o Prémio Ciências da Vida em 2010. Mas de todos os projetos que desen­volveu, o que mais sucesso tem é o BITalino, com o qual ficou entre os dez semifinalistas em todo o mundo na competição internacio­nal Insert Coin.

O BITalino, explica o investigador, é uma espécie de kit faça você mesmo, que dispo­nibiliza sensores fisiológicos com aplicação em áreas tão diversificadas como a eletro­cardiografia, a eletromiografia, a ativida­de eletrodermal, o desporto e outras. «Per­mite medir não só os nossos sinais muscu­lares e cardíacos em várias partes do corpo como a nossa reação emocional a certos es­tímulos. Quando nós reagimos a algo, o sis­tema nervoso provoca uma alteração na pe­le e isso também se consegue medir com o BITalino.» Como mais-valia, é incompara­velmente mais barato do que os aparelhos com a mesma função. «Custa apenas 149 eu­ros. Os outros rondam os dez mil euros. E es­tá disponível para toda a gente.»

Ao contrário de outras ferramentas do gé­nero, o BITalino não é útil só nos hospitais. Pode ser usado no ginásio, numa caminhada, numa corrida de bicicleta, num brinquedo, nas universidades, noscentros de investiga­ção. Tão versátil e funcional que o seu inven­tor compara-o às velhas peças Lego: «As pes­soas podem pegar numa peça, depois noutra, e depois noutra e fazer construções tão dife­rentes e inimagináveis a partir da mesma ba­se. Com o BITalino é a mesma coisa. Existe uma base igual, o que varia são os sensores fi­siológicos, que podem ser aplicados confor­me o objetivo.» Nalguns casos, esses peque­nos sensores fazem mesmo a diferença na vi­da das pessoas que o utilizam: «Por exemplo, um tetraplégico pode piscar um olho ou usar um músculo para abrir uma porta. E uma pessoa que se esquece com frequência de re­gar as plantas, pode ser lembrada com uma mensagem no Twitter, porque o BITalino es­tá apto a usar sensores que medem a humida­de da terra, a temperatura e a luz ambiente.» CARLA AMARO

04 VINHO

MATEUS NICOLAU DE ALMEIDA

O ARTESÃO DOS VINHOS

A escolha de Isabel Marrana, presidente da Associação de Empresas de Vinho do Porto

Mateus Nicolau de Almeida, 35 anos, nasceu no seio de uma prestigiada família de produtores de vinho do Porto e do Douro. Mas foi durante uma vindima que fez em França, no final do 12.º ano, que decidiu estudar Enologia em Bordéus. A seguir viajou bastante, andou a cumprir as rotas vinícolas dos principais países produtores. Esteve em França, Espanha, Estados Unidos (Califórnia), Chile e Argentina – e aca­bou por trabalhar na vinha e no vinho em todos os lugares por onde passou. Depois foi o que se sabe: regressou a Portugal, instalou-se em Vila Nova de Foz Côa, em pleno Alto Douro Vinha­teiro – paisagem que a UNESCO clas­sifica como Património da Humanida­de –, em 2003 pôs cá fora as primeiras 1500 garrafas de Muxagat tinto. Dez anos depois, os vinhos saídos da Ade­ga Muxagat (tinto, branco e rosé) con­quistaram apreciadores em Portugal e em vários países do mundo. Nas críti­cas e nas vendas além de que já rece­beram diversas distinções. Isabel Mar­rana, presidente da Associação de Em­presas de Vinho do Porto, diz que são a expressão da modernidade do Dou­ro «a única região que é capaz de pro­duzir grandes enólogos, geração após geração».

Visivelmente satisfeito, mas igual­mente sereno, Mateus Nicolau de Al­meida afirma que os seus vinhos «são o resultado de uma cultura de grande proximidade e respeito pela terra e pe­lo meio envolvente. Na vinha não são usados fertilizantes nem pesticidas e na adega não entram produtos quími­cos». O próximo lançamento da Ade­ga Muxagat ocorrerá em Janeiro pró­ximo, com O Cisne, um tinto que o seu criador define como «um vinho espiri­tual, que privilegia a boca, elegante e com estrutura para envelhecimento».

Outros vinhos e outros projetos se seguirão no portfólio da Adega Muxa­gat pois o que não falta a Mateus Nico­lau de Almeida são ideias. O produtor, que não gosta de ser chamado de enó­logo, dá apoio a outras adegas do Dou­ro e à Quinta do Monte Xisto, uma pro­priedade da família (do pai, da mãe e dos seus dois irmãos) que também dá nome a outro magnífico vinho da re­gião do Douro, e ainda tem tempo pa­ra mais projetos: «Estou a começar a fazer outras experiências. Com uns amigos, em Miranda do Douro, e com a família da minha mulher, que é espa­nhola, em La Rioja. Dali pode vir a re­sultar, no futuro, uma coisa séria.»

O que também é sério é o desafio que impôs a si próprio: «Quero fazer vinho do Porto. É um círculo muito fechado, com leis muito restritivas, que podiam fazer sentido no passado mas que ho­je são obsoletas. Vou avançar», anun­cia. Um Porto Muxagat? Fica feita a promessa. Isabel Marrana bem avisou que «o Mateus seguindo a tradição do pai [João Nicolau de Almeida] e do avô [Fernando Nicolau de Almeida] vai dar que falar nos próximos tempos.» CÉLIA ROSA

05 AGRICULTURA

TIAGO MENDES

DE REPÓRTER A PRODUTOR DE COGUMELOS

A escolha de Ricardo Brito Paes, presidente da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal.

Tiago Mendes é agricultor há pouco tempo, mas o seu «dinamismo fo­ra de série» e a «visão de negócio» levaram Ricardo Brito Paes, presi­dente da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal, a considerá-lo uma promessa. «Teve a coragem de mudar de vida, pegando num pedaço de terra sem uso para desenvol­ver um projeto de produção de cogumelos, que tem tudo para ter sucesso.»

Há cada vez mais pessoas a apostar na agricultura, umas para dar a volta ao de­semprego, outras para recuperar tradições. Mas no caso de Tiago, 32 anos, não foi por uma coisa nem por outra que se entregou à produção de cogumelos shitake em Mar­co de Canaveses, terra natal. Falta de traba­lho não tinha, apesar da retração no mer­cado do audiovisual, onde trabalhava co­mo repórter de imagem numa empresa de con­teú­dos. Mas, há dois anos, numa repor­tagem sobre cogumelos para o programa de televisão Biosfera, encantou-se com as «enormes potencialidades» destes fungos. A ideia germinou ali e foi concretizada meio ano mais tarde. «A produção de cogumelos seria a mais adequada às caraterísticas de um terreno abandonado numa quinta de fa­mília (num vale fundo com muita humida­de). Além disso, fiquei a saber que o shitake em tronco só se dá em Portugal e é o mais valorizado comercialmente. Achei que po­dia ser um bom negócio.» Não é só o mais valorizado, é também o segundo mais con­sumido nos países asiáticos e o mais procu­rado na Europa, onde o consumo médio por pessoa ronda os quatro quilos (em Portugal anda à volta de 400 gramas).

Depois de estudar o comportamento do mercado, mudou-se para a quinta, candida­tou-se aos apoios do PRODER e avançou com o projeto», até agora sem ponta de arrepen­dimento. Em abril instalou a produção em troncos de madeira, onde os cogumelos nas­cem por inoculação, e em setembro colheu os primeiros quilos. Deste então, obtém uma média de setenta quilos de cogumelos por se­mana: «Ainda é cedo para falar de resulta­dos comerciais, mas estou satisfeito com a produção. Só estou a quarenta por cento. Um produtor em velocidade de cruzeiro produz em média entre 160 e 180 quilos por semana. Portanto, acho que estou a conseguir resul­tados interessantes em pouco tempo.» Ape­nas dez por cento dos seus cogumelos ficam em Portugal, os restantes são exportados pa­ra Espanha, França, Holanda e Bélgica.

Tiago não quer ficar-se por estes núme­ros. Quando tiver cem por cento da capaci­dade de produção instalada, que acontece­rá no final de 2014, os 600 metros de estufa atuais aumentarão para o dobro. CARLA AMARO

06 EMPREENDEDORISMO

RITA NABEIRO

A ESTRATEGA QUE VEIO DA PLANÍCIE

A escolha de Sandra Correia, fundadora e CEO da Pelcor

Aos 33 anos, Rita Nabeiro sa­be que transporta no nome a responsabilidade de ser ne­ta de um grande empreende­dor – o comendador Rui Nabeiro, fun­dador dos cafés Delta – e é a essa heran­ça que a jovem diretora-geral da Adega Mayor vai buscar inspiração. Seja para criar um novo vinho (acabou de lançar o tinto Vitorino Salomé 2011), para lide­rar uma equipa de 42 pessoas ou para desenvolver uma nova ideia. «Ir traba­lhar com a família foi natural. Em 2005 começava a desenvolver-se o projeto da Adega Mayor e eu, que já tinha termina­do a formação em Design de Comunica­ção e estava a trabalhar numa agência de publicidade, fui desenhar a marca. Na verdade, aconteceu tudo muito na­turalmente.»

Nesse primeiro trabalho, Rita pro­curou distanciar-se da envolvente fa­miliar e tentou agir como se estivesse a prestar um serviço a um cliente. Ti­nha a vantagem de conhecer bem o gru­po empresarial mas, reconhece, sentiu um certo conflito de interesses. Basta dizer que fez a apresentação do proje­to em Campo Maior, diante dos olhares atentos do avô, do pai e do diretor de marketing da Delta. O certo é que, após alguns ajustamentos, o plano foi apro­vado e a Adega Mayor estava lançada (foi em 2006, mas o edifício desenha­do por Siza Vieira só foi inaugurado no ano seguinte).

Entretanto, o trabalho de Rita Nabei­ro prosseguiu no marketing e no depar­tamento de comunicação da Delta mas, a cada dia que passava, crescia o envol­vimento no projeto da Adega Mayor e nos vinhos. «A dada altura foi inevitá­vel escolher. O vinho 7 (Sete) foi a pri­meira edição especial da Adega Mayor e marca o ponto da transição. Foi nesse momento que deixei de ser a designer e de fazer tudo um pouco para me focar na estratégia.»

Rita acredita que fez a escolha certa. A empresa e o negócio cresceram (três milhões de euros de faturação e uma produção de 650 mil garrafas), as uvas de Campo Maior andam na boca do mundo (o vinho é exportado para EUA, Cana­dá, Luxemburgo, França, Suíça, Reino Unido, Alemanha, Angola, Cabo Verde e China e recebeu dezenas de prémios na­cionais e internacionais) e cada colhei­ta reserva uma surpresa. A próxima se­rá mais uma edição especial, para o ano. E outras se sucederão, confia Sandra Correia, a mentora da Pelcor. «Ser em­preendedor é isto. É sonhar e concreti­zar. É de pessoas como a Rita que Portu­gal e o mundo precisam.» CÉLIA ROSA

07 SOLIDARIEDADE

LOURENÇO ALMEIDA E BRITO

TROCOS QUE PODEM FAZER A DIFERENÇA

A escolha de Conceição Zagalo, presidente da Assembleia Geral do Grupo de Reflexão e Apoio à Cidadania Empresarial

Just a Change. Apenas uns tro­cos. Apenas uma mudança. Uma mudança que pode significar muito, para todos os envolvidos. O projeto nasceu no início de 2010, de uma brincadeira que imediatamente se tornou coisa séria.

Um dia, Lourenço Almeida e Brito, hoje com 22 anos, estudante de Enge­nharia e Gestão Industrial do Institu­to Superior Técnico, decidiu ir para a Baixa de Lisboa tocar guitarra com um amigo. A ideia era divertirem-se e ga­nharem uns trocos. E ganharam, mais do que uns trocos. A facilidade da proe­za fê-los pensar. Não, não fazia sentido usar o dinheiro para fins pessoais. Na­quela noite, pagaram o jantar a alguns sem-abrigo.

A experiência repetiu-se e a necessi­dade de fazer dela um projeto que mar­casse a diferença foi tomando forma. Da troca de ideias surgiu o Just a Chan­ge, que nesse mesmo ano ganhou esta­tuto de associação sem fins lucrativos. Um grupo de jovens estudantes univer­sitários reunido em torno da missão de, através da música de rua, angariar fun­dos para remodelar casas de famílias e instituições carenciadas da capital.

Para Lourenço, católico e habituado desde miúdo a ajudar quem mais preci­sa, nomeadamente nas campanhas de recolha do Banco Alimentar contra a Fome, nada mais natural. «Em tempos de crise como os que vivemos, a luta pas­sa pela solidariedade. Trata-se de assu­mir um compromisso com a sociedade e usar o tempo livre para trabalhar pelo bem comum. A evolução da Just a Chan­ge tem sido precisamente no sentido de aprofundar esse compromisso da parte de quem se torna voluntário, o que tam­bém facilita o funcionamento.»

Em três anos, a organização que fundou já envolveu o trabalho voluntário de sete­centos jovens e a remodelação de 15 casas particulares e sete instituições, estiman­do-se em quatrocentas pessoas as que be­neficiaram diretamente da ação da Just a Change, tendo para isso sido realizados 14 espetáculos de rua, com uma recolha de uma média de duzentos euros por atuação.

Além daqueles que veem as suas con­dições de vida melhoradas, Lourenço Almeida e Brito considera que também os voluntários são beneficiários, «por­que têm oportunidade de conhecer ou­tras pessoas e realidades e de contribuir com a sua ação para mudar vidas, o que é enriquecedor».

Para 2014, entre os vários objetivos, que passam pela consolidação e o apro­fundamento da ação, está a expansão do projeto para a cidade do Porto. CATARINA PIRES

08 DESIGN

ANDRÉ SANTOS

COMUNICAR COM DESIGN

A escolha de Katja Tschimmel, investigadora em design thinking

Se tivesse de nomear a coisa que mais o inspira, André Santos diria as pessoas. Há os locais por onde passa, as experiên­cias acumuladas em 23 anos de vida, o próprio trabalho em si, frenético de ideias que alimentam outras ideias. Mas não há como as pessoas para lhe enche­rem a bagagem de referências e da cria­tividade que fazem dele uma aposta se­gura como designer gráfico. «A Esco­la Artística e Profissional Árvore [no centro histórico do Porto] abriu-me em 2005 o caminho a amizades de uma vi­da e ao mundo do Design de Comunica­ção», conta. Depois, foi a vez de a Esco­la Superior de Artes e Design (ESAD) de Matosinhos lhe trazer a oportunidade de aprender com «pessoas incríveis» co­mo João Faria, José Bártolo ou Andrew Howard, Helena Silva, Israel Pimenta e David Santos, George Hardey, Andrew Haslam, Ian Noble e alguns dos seus grandes amigos de hoje. «Conversar, privar com esta ou aquela pessoa, é isso que vai influenciando o meu caminho.»

André recorda-se bem de, ainda pe­queno, receber da mãe livros ilustrados para colorir e livros com pontos para li­gar formando imagens. «Lembro-me de ajudar a minha irmã a fazer surpresas para os meus pais, sempre na área dos trabalhos manuais. Acho que já aí se adi­vinhava um futuro numa área criativa.» Na ESAD concebeu a sua primeira publi­cação, Cá Se Fazem…, que serviu de ram­pa para a criação de Nem Tudo o Que Re­luz É Ouro, simultaneamente o projeto mais doloroso e que mais prazer lhe deu, com 54 ilustradores coordenados por si a darem livre curso à expressão. Tam­bém na ESAD está a dois meses de con­cluir o mestrado em Design de Comuni­cação, ao mesmo tempo que é designer residente da companhia de teatro Cabe­ças no Ar e Pés na Terra (desde 2011), que se responsabiliza pela imagem grá­fica da empresa Kiko & Thomas e que espera fundar uma editora de publica­ção independente. «Somos um país pe­queno geograficamente, isso é inegável. Mas somos tão grandes culturalmente, e no amor que as pessoas depositam no seu trabalho, que eu diria que o design que se faz lá fora está cada vez mais ao nível daquele que se faz em Portugal e não o contrário», sublinha André. Natu­ralmente, quer que a sua arte seja vista e percebida no estrangeiro, mas não faz disso a sua bandeira. «Quero ficar aqui, crescer e trabalhar aqui, deixar a minha marca aqui.» O facto de o país começar a (re)conhecê-lo enche-o de orgulho. ANA PAGO

09 ARTES PLÁSTICAS

PAULO LISBOA

A LUZ E A SOMBRA

A escolha de Joana Vasconcelos, artista plástica

De uma cave de um prédio de Lisboa que outrora albergou um atelier de artes gráficas do qual ainda restam vestígios, Paulo, 36 anos, que tem no nome a ci­dade onde nasceu e cresceu, fez a sua, só sua, residência artística. Na caverna, como lhe chamam os amigos, encontra o isolamento e o silêncio e a luz e a es­curidão de que precisa para criar. É um outsider. Por opção.

Pinta e desenha desde que se lembra. Nunca quis ser mais nada. Nem tirar um curso queria. Sempre preferiu uma pro­cura solitária do conhecimento. O espí­rito autodidata atrai-o. Mas apesar dis­so acabou por reconhecer a necessidade de uma aprendizagem mais formal e fez pintura do Instituto Politécnico de To­mar, frequentando agora o mestrado de desenho na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa.

Discreto e ensimesmado, tem resis­tido em seguir o circuito comum do meio. Nunca fez residências artísticas e perturba-o a ideia de «treinar os artis­tas plásticos, de lhes dar temas, de fa­zer currículo». No entanto, embora crie por absoluta necessidade interior de o fazer, o público já teve oportunidade de conhecer a sua obra através de exposi­ções como Fronteira Aberta (com Renato Ferrão e Vasco Barata), em Tomar; Pla­teau ou Dromopólis (com Catarina Pa­trício), em Lisboa; e, neste ano, Rainha Vermelha (com André Catalão, curado­ria de Marko Stamenkovic), em Ghent, na Bélgica.

O trabalho de Paulo Lisboa mudou com a descoberta de uma mina de grafi­te numa aldeia perdida do distrito de Vi­seu e a adoção deste minério como ma­téria-prima de eleição.

Interessa-lhe a luz e a sua ausência. Interessa-lhe a desconstrução. O re­flexo. O olhar para dentro. A anatomia do medium. Isso é visível nos seus dese­nhos, como o é em Plateau, uma insta­lação de projeções que exibe o interior de máquinas de projetar, as

lâmpadas e os seus filamentos, quando a película é posta a rodar.

Joana Vasconcelos garante que o ar­tista plástico vai marcar o próximo ano. Uma aposta que Paulo agradece, sur­preendido. «Não fazia ideia de que a Joa­na conhecia sequer o meu trabalho. Te­mos linguagens absolutamente antagó­nicas. Mas fico contente.»

No ano que está prestes a começar, Paulo Lisboa espera poder continuar, entre a luz e a sombra do atelier, a desen­volver o seu trabalho, em sossego, o pos­sível na posição insegura em que vivem atualmente todos os artistas. CATARINA PIRES

10 CINEMA

JOÃO JESUS

DO SUBÚRBIO PARA O MUNDO

A escolha de António-Pedro Vasconcelos, cineasta

Tem 24 anos, mas parece mais novo. António-Pedro Vascon­celos diz que este jovem ator vai ser a revelação cinema­tográfica do próximo ano, até porque João Jesus é protagonista do seu pró­ximo filme, Os Gatos Não Têm Vertigens. Um rapaz do Alvito, no filme, um rapaz da Amadora, na vida. Também faz te­atro e dobragens, está em Os Filhos do Rock, «uma série que, apesar de passar na televisão, obedece a uma linguagem mais próxima do cinema». Novelas nun­ca fez, coisa rara nos atores da sua gera­ção. Nem quer fazer.

Cresceu na Quinta da Lage, um bair­ro complicado da Amadora, ali para os lados da Falagueira, e pouco conheci­do dos próprios habitantes da cidade. «A minha própria experiência de vida foi muito útil para compreender o Jó, a personagem que interpreto no filme.» Na tela, dá corpo a um ladrãozeco, miú­do de rua e do roubo de esticão. «As rus­gas, onde eu morava, eram o pão-nos­so de cada dia, e os dias eram todos pas­sados no exterior, toda a gente estava na rua. Por isso, os laços de vizinhan­ça eram mais fortes. Por um lado, to­da a gente sabia a vida de toda a gente. Mas também havia uma coisa boa: toda a gente cuidava de toda a gente.»

Começou a estudar representação aos 15 anos, numa escola profissional em Cas­cais. Para trás tinha deixado o futebol, foi guarda-redes nos iniciados do Es­trela da Amadora e extremo nos juve­nis do Benfica. «Mas o cinema e a bo­la têm coisas muito parecidas», diz ele, desmanchando-se a rir a meio da fra­se, «porque o realizador é como se fos­se o treinador, os atores jogam um jo­go de grupo mas alguns têm mais pro­tagonismo.» Também fez parte de um rancho folclórico da Brandoa, chamado Dançar é Viver. «Tocava castanholas.» E assegura que isso é uma experiência que o ajuda a ser melhor ator. A colocar–se melhor em cena.

Quando acabou o curso fez sobretudo teatro, ao abrigo do Projeto Novos Ato­res, que lhe permitiu participar em três peças no Teatro Experimental de Cas­cais. Na mesma altura começou a dobrar séries de desenhos animados.

Em televisão estreou-se na RTP, em Depois do Adeus. Fazia o papel de um mi­litante do MRPP durante o PREC. «Eu nada sabia daquele período da histó­ria de Portugal, apesar de ser relativa­mente recente. Tivemos aulas, apren­di imensas coisas em dois dias e perce­bi que havia uma parte da vida do meu país que eu tinha de me esforçar por perceber. Comecei a ter mais interesse político, a estar mais atento ao que me rodeia.» Crescer como ator, aprendendo para a vida. É uma bela lição, essa. RICARDO J. RODRIGUES

11 CIÊNCIA

RAQUEL LUCAS

OSSOS À PROVA DE IDADE

A escolha de Henrique Barros, presidente do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto

Já sabíamos que algumas doenças que se manifestam na idade adulta têm uma história que remonta à in­fância. O que Raquel Lucas, 33 anos, investigadora no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, acabou de desco­brir é que também há uma relação clara en­tre o capital de osso adquirido nas primeiras duas décadas de vida e as fraturas osteopo­róticas na mulher, após a menopausa. En­tão, para saber como é que se pode otimi­zar o crescimento e o fortalecimento do os­so nas crianças e jovens e, assim, minimizar o risco futuro de fraturas na idade adulta, a investigadora estudou um grupo de mil ra­parigas, que foram avaliadas aos 13 e aos 17 anos (peso, estatura, densiometria óssea, PCR e inquérito de saúde). A análise dos da­dos demonstrou que as jovens de 17 anos que «consomem álcool e tabaco com re­gularidade têm manifestamente pior osso do que as raparigas que não fazem consu­mos». O que o estudo também concluiu foi que ter uma estatura mais pesada beneficia a formação do osso: «Estimula o crescimen­to. Mais gordura significa mais peso, mais carga física, mais formação de osso», adianta a investigadora. Mas atenção, pois a gordu­ra em excesso, a obesidade, também não es­tá isenta de riscos, conduz a um estado de in­flamação crónica que é prejudicial. «Para aumentar o peso e ter melhor osso, o ideal é aumentar a massa muscular.» O trabalho desenvolvido por Raquel Lucas tornou-a a primeira portuguesa a publicar um artigo no American Journal of Epidemiology.

Um dos programas em que está envolvida decorre no âmbito do projeto Geração XXI e envolve o estudo dos padrões de crescimen­to ósseo de duas mil crianças (foram ava­liadas no nascimento, aos 2, 4 e 7 anos e vai prosseguir). O outro passa pelo estudo de um modelo de prevenção das fraturas da anca nos idosos, em várias unidades de saúde. Pe­lo meio, Raquel Lucas ainda tem tempo para dar aulas na Faculdade de Medicina da Uni­versidade do Porto, para colaborar com o Observatório Nacional de Doenças Reumá­ticas e para dar apoio ao Chek Point Lx (cen­tro comunitário para homens que têm sexo com homens, onde se fazem testes rápidos de VIH e aconselhamento). «Gosto imenso do que faço e tenho a convicção de que o co­nhecimento que produzimos será determi­nante para tomar boas decisões para a popu­lação e para o país.»

Henrique Barros também gosta desse en­tusiasmo e elogia a enorme capacidade de Raquel Lucas para «arrancar conhecimen­to, compreender a natureza das coisas, as pessoas e as comunidades e assim descobrir como se gere o risco ou se produz a doença». CÉLIA ROSA

12 ARQUITETURA

PAULO HENRIQUE DURÃO

ARQUITETO DO DESAFIO

A escolha de Bernardo Rodrigues, arquiteto da Casa do Voo dos Pássaros

A aposta não podia ser mais se­gura. Paulo Henrique Durão, 35 anos, foi neste ano conside­rado um dos vinte jovens ar­quitetos mais promissores do mundo pela britânica Wallpaper, uma das mais conceituadas revistas de arquitetura e design do mundo.

Nascido na Marinha Grande, mas criado em Porto de Mós, com a inóspi­ta paisagem das serras de Aire e Can­deeiros no horizonte, o que, reconhe­ce, marcou a sua forma de ver o mundo e nele intervir, Paulo sempre teve uma enorme apetência para construir coi­sas. Isso conjugado com um gosto ob­sessivo pelo desenho só podia dar no que deu: a arquitetura.

Formado na Universidade Lusíada, com 18 valores, foi convidado a lecio­nar assim que terminou o curso, ativi­dade que desenvolveu até há muito pou­co tempo e o levou a dividir-se entre Lis­boa e Madrid, onde também dava aulas, na Escola Técnica Superior de Arquite­tura Madrid. O trabalho no atelier que fundou em 2007 – PYHD Arquitectura – e o doutoramento na capital espanhola obrigaram-no a uma escolha: fazer um intervalo no ensino.

Paulo Henrique Durão, arquiteto do tempo que gosta de construir imaginá­rios, vai buscar as referências ao mundo e à sua observação exaustiva do mesmo, mais do que a outras arquiteturas. «É is­so que me dá a bagagem que abre a porta à liberdade de criar.»

Não relativiza, nem minoriza, nem tem a ingenuidade de negar que há uma crise, que se faz sentir na arquitetura como em tudo o resto, mas lembra que é tão difícil hoje como era há dez anos, quando começou. «Em Portugal, é difí­cil fazer acontecer coisas, mas isso dei­xa-nos com uma única resposta possí­vel: conseguir fazer muito a partir do pouco que temos.»

Paulo tem conseguido. E tem conse­guido aqui, neste país. A Casa da Morei­ra, na Maia, que chamou a atenção da Wallpaper, deu-lhe muito gozo, como todos os projetos que desenvolve, mas o preferido é sempre o último, aquele em que está a trabalhar, e esse é o sa­lão de exposições da Renova. «Resulta da transformação de um edifício indus­trial existente e fizemos ali uma espé­cie de máquina no tempo.» O tempo, os vários tempos, fazem parte do ADN das criações de Paulo Henrique Durão, as­sim como a vontade de subverter as con­dicionantes. «O enorme desafio da ar­quitetura está em ultrapassar os limites e resolver o que é pedido acrescentando qualquer coisa que o transcenda.» CATARINA PIRES

13 GASTRONOMIA

CARLOS AFONSO

UM COZINHEIRO DE FIBRA

A escolha de Fernando Melo, crítico de comida

Passou a infância entre panelas e boa comida, atento ao que fa­ziam as muitas cozinheiras de mão cheia da família: a mãe, as avós, as tias, todas nasceram com o dom de transformar ingredientes simples em autênticos festins que chegam a du­rar dias, como os casamentos ciganos. Do pai, igualmente hábil a comer e a co­zinhar, herdou o gosto pelas pescarias ao fim de semana, que terminavam em caldeiradas de peixe do rio. Carlos Afon­so foi apimentando o gosto pela culiná­ria, integrando as influências alente­janas (é de Beja), os sabores, as textu­ras, as técnicas culinárias e os produtos próprios dos locais que vai descobrin­do com o tempo. Ser cozinheiro tornou-se uma necessidade tão básica como um bom refogado, ainda que se tenha formado primeiro em marketing antes de abraçar a vocação.

«Por tradição familiar, celebramos sempre juntos todas as datas importan­tes – Natal, passagem de ano, Páscoa, aniversários – e nessas alturas sempre se cozinhou muito. Os nossos natais são autênticos banquetes que duram dois e três dias, e eu cresci nesse ambiente de festa e bebida», justifica o cozinhei­ro de 27 anos, que em fevereiro termina os estudos em Cozinha/Gestão na Esco­la de Hotelaria e Turismo de Portalegre. «É um cozinheiro feito da fibra dos grandes, de quem vamos ouvir falar muito ao longo do próximo ano», apon­ta Fernando Melo, rendido à fome de co­nhecimento do jovem, a dar já cartas no restaurante Narcissus, no Alentejo Marmòris Hotel & Spa de Vila Viçosa, ao lado do chef Pedro Mendes.

É, de resto, no Marmòris que Carlos tem vivido a experiência mais intensa de sempre. O convite chegou-lhe pelo chef Alexandre Silva, seu formador, que em janeiro de 2012 o quis a estagiar com ele no restaurante do hotel que estava a abrir em Vila Viçosa. «Disse-me achar que eu tinha nascido para ser cozinhei­ro. Essas palavras mudaram a minha vi­da, fizeram-me dedicar a cem por cento», recorda. Para cozinhar, Carlos pre­fere o peixe, os vegetais (adorava ter uma horta e um jardim de flores comes­tíveis), a doçaria conventual portugue­sa. De comer, aprecia quase tudo: «Gos­to sobretudo de provocar o meu pala­to. Uso isso como elemento de pesquisa para o futuro.» E não esquece o dia em que Alexandre Silva deixou o hotel e lhe ofereceu uma faca de chef. «Foi no últi­mo dia. Veio ter comigo e disse-me para estimá-la bem.» Trá-la consigo desde então, um amuleto funcional para ajudá-lo a preparar o futuro. ANA PAGO

14 MÚSICA

CAPITÃOFAUSTO

O PESO DOS ASTROS

A escolha de Paulo Ventura, manager, gestor de carreiras artísticas e jurado do programa X-Factor, da SIC

Este álbum vai rebentar.» Pau­lo Ventura fala assim do segun­do trabalho dos Capitão Faus­to, Pesar o Sol, com lançamen­to previsto para janeiro de 2014. «Sou eu que agencio esta banda, e por isso sou suspeito, mas é neles que eu aposto mesmo para o próximo ano, porque têm um trabalho radicalmente novo na paisa­gem musical portuguesa.» Fica assumi­do o favoritismo.

Os rapazes – Domingos Coimbra, Francisco Ferreira, Manuel Palha, Sal­vador Seabra e Tomás Wallenstein – têm andado na estrada, a promover o novo trabalho. Receção positiva, garantem. «É um disco menos frenético e mais contemplativo, talvez mais disco do que o anterior», diz Tomás, o vocalista. Há por isso uma narrativa que é maior do que uma soma de canções, todas juntas contam a sua própria história, um todo. «O Pesar o Sol foi composto em duas se­manas e gravado um mês depois, e já tí­nhamos uma ideia mais clara daquilo que queríamos alcançar: um disco mais cheio e mais heterogéneo, mais viajan­te, mais psicadélico mas sem n unca per­der a essência de uma canção.»

São lisboetas, conheceram-se e for­maram a banda no liceu. Apostam num rock mais psicadélico, e dizem que fo­ram beber influências aos anos 1960. «A nossa primeira grande referência fo­ram obviamente os Beatles», atira To­más, o vocalista. «Daí derivámos para The Nazz, Pink Floyd, Zombies, Beach Boys, Crosby Stills Nash and Young, Gentle Giant e The Doors.» Mas isto é na composição, que na letra a música é outra: Bob Dylan, Syd Barret e Morri­sey deram muita inspiração aos textos.

O primeiro álbum chamava-se Ga­zela, saiu em 2011. Teve boa receção e o primeiro single, Teresa, fez horas nas rádios. Mas era um som mais melódi­co. «Não criámos uma rutura com es­se trabalho, mas neste segundo álbum há certamente uma evolução.» Cantam sempre em português, e gostam disso. «É natural que a música portuguesa ainda não tenha o mesmo impacte que a estrangeira mas sentimos que as pes­soas cada vez mais ouvem, e gostam, de música portuguesa. Há hoje muito mais por onde escolher.» Apontam no­mes: Pontos Negros, Linda Martini, Peixe Avião, Paus. É difícil crescer mu­sicalmente num país em crise? «Inde­pendentemente da situação delicada em que o país se encontra, talento não falta e aposta também não.» RICARDO J. RODRIGUES

 

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