Um festival que foi o sonho de Francisco Varatojo

Texto Sara Dias Oliveira | Fotografia de Jorge Amaral e arquivo do ZIMP

O luto é recente, ainda dói e remói. Francisco Varatojo mergulhou no mar a 6 de julho e foi encontrado sem vida no dia seguinte, a 18 metros de profundidade. O fundador do Instituto Macrobiótico de Portugal, um dos consultores internacionais mais qualificados desta área, requisitado frequentemente para seminários e conferências na Europa e EEUA, com vários livros e artigos publicados, morreu aos 56 anos. O seu desaparecimento foi trágico, mas o legado continua a respirar e um dos seus sonhos não será esquecido: o ZIMP – Festival de Saúde Natural, organizado pelo instituto que criou, começa amanhã com um sabor diferente, de memórias e de saudade.

«O festival tinha de acontecer, não podia ser de outra forma», dizia Sofia Varatojo, uma das filhas, na semana seguinte ao trágico mergulho. «Agarrámos o ZIMP e, em grande parte, é uma homenagem ao meu pai. Era o sonho dele.»

Apesar das circunstâncias, não houve um momento de hesitação. Voltar ao sítio em que o pai estava todos os dias, o Instituto Macrobiótico de Portugal (IMP), custa. Mas Sofia regressou e começou logo a tratar do festival. «Queremos que o ZIMP seja feito, que seja uma semana de experiências. O que aconteceu não pode ser uma desculpa para que as coisas falhem.» Por isso, mãos ao trabalho e pés ao caminho. Começa amanhã na Quinta do Crestelo, em Seia, em plena serra da Estrela, e termina no domingo.

Salvador Sobral, que atuou no ZIMP em 2014, amigo de Varatojo, volta ao festival para cantar e prestar uma homenagem. A 2 de agosto, pelas seis e meia da tarde.

A família Varatojo – mãe, três filhas e um filho – está unida nesta missão. Hoje mais do que nunca. Sofia, formada em Marketing e Animação Sociocultural, coordenadora dos cursos do IMP, fundado pelo pai e pela mãe, Geninha Horta Varatojo, em 1985 – numa vertente de formação relacionada com saúde, bem-estar, alimentação natural e estilos de vida mais saudáveis e ecológicos –, manteve a máquina a funcionar. E teve de encontrar substitutos para as três atividades que seriam coordenadas por Francisco (macrobiótica para todos, diagnóstico oriental e reflexões sobre saúde).

Sofia agarra-se às memórias do pai para manter a organização, a equipa motivada, para tratar do que tem de ser tratado. E a sugestão deste para haver um bar no festival para servir snacks saudáveis entre as refeições acabou por encaixar no programa.

O programa sofreu alguns ajustes. Salvador Sobral, que atuou no ZIMP em 2014, amigo de Varatojo, volta ao festival para cantar e prestar uma homenagem. A 2 de agosto, pelas seis e meia da tarde, todas as atividades são suspensas. No espaço chill out, junto a uma das piscinas, o vencedor do Festival do Eurovisão da Canção usará a sua voz num momento singular. «Era muito amigo do meu pai, depois do que aconteceu é bom tê-lo no festival a homenageá-lo. É pela ligação emocional e não pela parte mediática.»

«É um festival muito diferente que não se foca num único tipo de atividade. A ideia é criar uma semana em que se experimentam várias ferramentas e atividades que possam ser levadas para o dia-a-dia, para uma vida mais saudável e feliz.»

O ZIMP é um festival alternativo, com uma ligação forte à natureza. É uma semana de férias com várias atividades para aprender a cuidar do corpo, da mente e do espírito. E é livre. Cada um faz o que lhe apetecer, dentro, obviamente, do conceito de saúde natural. «É um festival muito diferente que não se foca num único tipo de atividade. A ideia é criar uma semana em que se experimentam várias ferramentas e atividades que possam ser levadas para o dia-a-dia, para uma vida mais saudável e feliz.»

Uma semana de tranquilidade. «É um festival que segue as leis da natureza, biológicas, ecológicas, sociais e espirituais, da forma como tratamos as pessoas. A mensagem é que somos responsáveis pela nossa vida. A nossa felicidade, a nossa saúde, dependem das nossas escolhas.» Macrobiótica significa, à letra, «grande vida». E é isso que pretendem fazer e celebrar naqueles dias. «Viver a nossa vida de forma grandiosa. Não é um regime alimentar, é um estilo de vida em que o objetivo é ajudar a desenvolver o potencial humano.»

Há atividades a partir das sete da manhã, outras estendem-se para depois do jantar. Haverá workshops de macrobiótica, receitas saudáveis, aulas de ioga, meditação, práticas taoistas, dança, tai chi kung, cinema ao ar livre, concertos, passeios ao Vale do Rossim, dieta espiritual, momentos de contemplação e convívio ao pôr do sol. Há também um programa para crianças dos 3 aos 11 anos, com música, dança, arte, um ateliê para fazer pão. Os mais pequenos podem ainda alimentar animais e plantar árvores. E não há limites de idades: o professor de ioga Vittorio tem 83 anos, por exemplo.

Os ensinamentos de Francisco Varatojo estão sempre presentes: a energia, o lado positivo dos dias e das coisas, a força das escolhas e como estas são capazes de determinar a vida.

Esta será a sexta edição do festival, que tem atraído cada vez mais participantes, de ano para ano. Em 2016 foram trezentas pessoas, neste ano esperam ainda mais. Nasceu em 2012 no Zmar, em Almograve, perto da Zambujeira do Mar, na Costa Vicentina, mas a ideia começou a germinar muito antes, ainda na década de 1980.

O IMP organizava um campo de férias durante duas semanas em vários locais do Algarve. Começou com um grupo pequeno de vinte pessoas, a procura foi aumentando, chegou às sessenta, e organizar um festival ao ar livre para mais gente e com mais atividades fazia todo o sentido.

Joana, irmã de Sofia, decidiu levar o projeto para a frente, sempre com o apoio do pai, e há cinco anos nascia o ZIMP, juntando o Z de Zmar ao IMP da sigla do instituto criado pelos pais em 1985. Do Alentejo rumou ao Parque Aventura Diverlanhoso, no Gerês, e agora decorre pela primeira vez na serra da Estrela.

O ZIMP pede espaços generosos, boas condições de alojamento, salas arejadas. Requer alguma logística e não basta montar uma tenda e já está. Na Quinta do Crestelo, em Seia, há 18 hectares de natureza, um pequeno lago, uma horta, cavalos e ovelhas, várias piscinas, muito verde, bosques de carvalhos e mata de pinheiros-bravos em redor.

Hoje deve estar quase tudo pronto para amanhã receber os participantes a partir das cinco da tarde. Às dez da noite há festa de boas-vindas com DJ. Sofia deve estar cansada, mas feliz. Toda a família. Os ensinamentos do pai já fazem parte deles há muito tempo: a energia, o lado positivo dos dias e das coisas, a força das escolhas e como elas são capazes de determinar a vida ficam-lhe para sempre.

O ZIMP também é isso e um sonho construído e gerado pelo pai. E ele, garante, nunca escondeu o orgulho de como a família levava o evento para a frente.

Festival ZIMP
Nuno Markl com Francisco Varatojo, na edição de 2013 do Festival ZIMP, da qual o humorista foi padrinho.

OS PADRINHOS DA FESTA

O comediante António Raminhos é o padrinho da edição deste ano do ZIMP e promete levar as suas Marias, a mulher e as três filhas. Patrícia Vasconcelos, diretora de castings, é a madrinha. No dia 3 de agosto, depois do jantar, pelas dez da noite, Raminhos usará da palavra para, ao seu estilo, tecer algumas «considerações idiotas sobre coisas da vida». Desde a primeira edição, várias figuras públicas apadrinham o ZIMP. Marco Horário foi padrinho no ano passado e partilhou o que sentiu. «Viver em consciência com o que nos rodeia, zelarmos pelo nosso corpo e pela nossa mente é o verdadeiro caminho para a felicidade. O ZIMP representa isso, de uma forma simples. Porque se a vida é complicada, nós não temos de o ser.» As atrizes Margarida Vila-Nova e Madalena Brandão foram as madrinhas em 2015, a jornalista Laurinda Alves no ano anterior e Nuno Markl e Ana Galvão em 2013. A primeira edição teve vários padrinhos e madrinhas: Rui Unas, Joana Seixas, Margarida Pinto Correia, Fernando Alvim e Carla Rocha.

Festival ZIMP
O festival ZIMP oferece uma semana de atividades que promovem um estilo de vida saudável e em harmonia com a natureza.

QUANTO CUSTA?

O ZIMP exige bastante logística para proporcionar boas condições e conforto durante uma semana. Os participantes têm várias ofertas à escolha: podem ficar num parque de campismo, em caravanas, em dormitórios separados por sexos, em apartamentos partilhados de várias tipologias. O bilhete mais caro custa 620 euros por pessoa e inclui programa, alojamento em apartamento e alimentação macrobiótica (pequeno-almoço, almoço e jantar) durante uma semana. O mais barato custa 230 euros para dois dias, em parque de campismo, e três refeições diárias. As crianças têm descontos de 30% e 40%, consoante as idades. Informações em www.zimp.pt.