São precisas cidades menos egoístas para combater o terrorismo

Notícias Magazine

É sempre um exercício complexo ouvir Nuno Rogeiro. Ele sabe muito e tem amigos em todo o lado – o que é bom. Mas mostra certezas a mais num mundo complexo. Gosto de o ouvir também porque ele escapa a tanta banalidade que passa pelos nossos ecrãs. Nesta semana, depois dos atentados na Ponte de Londres, ouvi-o dizer o que já tinha dito depois de Manchester: que as pessoas têm de estar atentas e denunciar movimentos suspeitos quando os detetarem.

Isto tem especial importância nas comunidades muçulmanas, moderadas ou não, nas quais costumam germinar estes fenómenos. Porque no Reino Unido, em França, na Bélgica, nos EUA ou noutros locais uma das chaves do problema dos jovens terroristas residirá na censura social. Na diferença entre um intransigente «não» e um complacente silêncio para com atitudes que, por esta altura, já toda a gente sabe onde vão dar.

Em todos estes atentados, as histórias pessoais dos autores mostram pormenores inacreditáveis, sinais que deviam ter sido seguidos, factos que deveriam ter chamado a atenção de gente à volta. O que os media transmitem, pelo contrário, são reportagens em que vizinhos, família e amigos dizem como estão surpreendidos, nunca esperavam que aquele rapaz fizesse uma coisa daquelas. Exemplos de mau jornalismo certamente, pela rama e sem conhecimento. Estes vizinhos não são fonte: ou eram distraídos, ou são mal-intencionados, ou estavam demasiado distantes e não servem para nada.

As nossas cidades modernas, cosmopolitas mas distantes e egoístas, são o palco ideal para estes jovens que, sem nada a perder, se sentem à vontade e sem controlo social. Se não olhamos para o lado quando saímos de um estacionamento, se passamos à frente na fila, se não temos um olhar ou um sorriso no elevador, porque havemos de reparar que há qualquer coisa de perigoso? O marroquino-italiano Youssef Zahgba, 22 anos, um dos atacantes da Ponte de Londres, que nem sequer estava nos radares da polícia britânica, foi impedido de embarcar em Bolonha a caminho da Síria por ter respondido ao polícia das fronteiras «vou ser terrorista». Alguém que tem tal abertura nos seus propósitos há de ter dado algum sinal a quem com ele convivia, amigos, família e vizinhos, não?

Para reforçar a componente da responsabilidade social, 130 imãs de mesquitas britânicas anunciaram que não iam fazer cerimónias fúnebres aos atacantes da Ponte de Londres. E as suas mesquitas aceitaram partilhar informação com a polícia. Há sinais que indicam que a comunidade islâmica começa a mudar e está disposta a confrontar o terrorismo, em vez de se proteger nas questões religiosas sobre, por exemplo, o que é ou não o islão.

Haverá, claro, um equilíbrio difícil entre as liberdades que elevam a nossa democracia e o controlo que a sua segurança implica. Mas o que se está a viver no Reino Unido, entre o turbilhão do brexit e a ameaça constante, é um começo. Porque se, como dizem os africanos, «é preciso uma vila» para educar uma criança, também são precisas cidades mais solidárias, vizinhos mais atentos, pessoas menos egoístas para travar esta batalha que já é praticamente uma guerra.