Poderá a pilinha de Trump provocar uma guerra nuclear?

Notícias Magazine

Sentado, de braços cruzados, à mesa de um dos seus clubes de golfe, acompanhado do seu staff e da mulher, Melania, Donald J. Trump declara, sem nunca descruzar os braços: «É melhor a Coreia do Norte não fazer mais ameaças aos Estados Unidos ou terá uma resposta com fogo e com fúria, como o mundo nunca viu». Repete «com fogo e fúria, e, francamente, com poder, como o mundo nunca viu.» E faz aquela expressão triunfante, rufia. Como quem dá uma cabeçada no ar.

Do outro lado, Kim Jong-un manda dizer, inexpressivo, que as suas armas nucleares estão a postos. Guam está ali à mão, mas se for preciso também chegam para atingir o coração dos Estados Unidos. Qualquer tentativa de interferir com o regime de Pyongyang terá uma resposta implacável.

Oiço isto e lá se vai o meu sossego. Dois homens com cabelos esquisitos a medir pilinhas têm o poder de desencadear uma guerra nuclear. Abano a cabeça para afastar imagens apocalíticas, não das pilinhas, quero lá saber das pilinhas, mas de um mundo mergulhado num conflito desta natureza. Penso nos meus filhos. Penso nos filhos dos outros. E convenço-me de que não, não podem estar nas mãos destes dois homens as vidas de milhões de pessoas. Não tem lógica.

E, no entanto, a inquietação. Como terá sido em 1939, no dias que antecederam o estalar da Segunda Guerra Mundial? O que pensariam as pessoas? Andariam nas suas vidas, sem qualquer noção do que se passava? Dar-se-iam conta de que o seu mundo estava prestes a mudar?

Andava eu nisto, quando uma amiga partilhou um artigo do The Guardian, em que o autor, Harry Leslie Smith, 94 anos, veterano da Força Aérea britânica na Segunda Guerra Mundial, manifestava a sua preocupação perante os sinais de que um conflito global pode estar iminente. «O verão devia ser reconfortante, mas este ano não é», diz ele.

Parecia que o velho militar tinha ouvido os meus pensamentos e me respondia. «Em 1939, não ouvi a guerra chegar. Neste momento, a sua ruidosa aproximação não pode ser ignorada». E depois conta que, adolescente, ria-se das notícias sobre Hitler e outros fascistas. Agora espera que a geração dos netos não viva algo semelhante ao que aconteceu a seguir.

Também nós, e os não sei quantos late night shows que chegam do outro lado do Atlântico, nos rimos de Trump. É irresistível, com material como este:

  • «Digo-vos: é melhor que a Coreia do Norte se porte bem, porque se não vai meter-se em sarilhos, em sarilhos como poucas nações se meteram neste mundo»;
  • «A Coreia do Norte disse coisas horríveis sobre o nosso país, mas comigo não se safa. Já se safou antes, ele e a família dele, mas comigo não se safa, é outro campeonato.»;
  • «Somos de longe a nação mais poderosa em termos nucleares e a ordem que dei aos meus generais foi que tivéssemos o maior e melhor arsenal nuclear e vai melhorar e ficar mais forte e vamos ser mais fortes do que toda a gente. E ninguém, incluindo a Coreia do Norte, vai ameaçar-nos.»

Há quem ria, mas Harry Leslie Smith não. «Neste mês de agosto, as memórias trouxeram-me arrepios. Parece que a brisa do verão de 2017 está a ser invadida pelos ventos de guerra que sopram no mundo, tal como em 1939. Sinais arrepiantes estão por todo o lado e o maior de todos talvez seja que os Estados Unidos se deixem liderar por Donald Trump, um homem sem honra, sem sabedoria e sem empatia. É tão tonto que os americanos pensem que os seus generais os salvarão de Trump como foi os liberais alemães acreditarem que os militares protegeriam a nação dos excessos de Hitler.»