Os filmes de Leitão de Barros, o cineasta do regime

Texto Pedro Olavo Simões | Fotografia Arquivo DN

Julho de 1934: uma cena de filmagens, algures em Portugal. «Portuguesíssimas» era como um articulista do Diário de Notícias, quase um ano depois, caracterizava As Pupilas do Senhor Reitor, por ocasião da estreia do filme de Leitão de Barros, construído, lia-se no genérico, «sobre motivos do célebre romance de Júlio Diniz».

As Pupilas do Senhor Reitor, originalmente publicado em folhetim no Jornal do Porto, em 1866, não é uma obra-prima do romance português, mas foi um caso sério de popularidade.

Situemo-nos: a Constituição de 1933 formalizara o Estado Novo, a também portuguesíssima ditadura que perdurou até 1974. Tal regime, o salazarismo, tinha nessa portugalidade uma das suas munições e no Secretariado da Propaganda Nacional (SPN), liderado por António Ferro, a arma que metralhava o país com a idealização de uma identidade nacional adoçada.

Por aí deve ler-se o filme de Leitão de Barros, nome central da época de ouro do cinema português. As Pupilas do Senhor Reitor, originalmente publicado em folhetim no Jornal do Porto, em 1866, não é uma obra-prima do romance português, mas foi um caso sério de popularidade, vindo a adequar-se ao Portugal idealizado que o SPN queria inculcar no imaginário coletivo da nação: uma ruralidade idílica, felicidade na resignação, paz social numa terra abençoada por Deus.

Ler assim o filme, de cujo notável elenco sobressaiu a grande Maria Matos (Joana, a criada do médico de aldeia, o bom João Semana que se tornou sinónimo de todos como ele) não significa menorizar os pioneiros que vemos na fotografia (onde está também Jorge Brum do Canto e Heinrich Gartner, a manobrar a câmara). Trata-se apenas de situá-los e compreendê-los, gente feliz, a fazer cinema, mas enquadrada por uma realidade maior nada alegre.

Propaganda
O cinema, feito por empenhados pioneiros, foi das principais ferramentas do Secretariado da Propaganda Nacional.