O seu filho vai mudar de escola? Prepare-o. E prepare-se.

Texto de Sofia Teixeira | Ilustração de Sérgio Condeço//WHO

Há um ano, quando chegou à porta da nova escola da filha, Madalena Soares não era a mãe tranquila e despreocupada do costume. Levava por uma mão a filha Alice, com 5 anos, para começar o primeiro ciclo, vinda de um pré-escolar privado.

Na outra ia Laura, um ano e meio mais nova, que estava a mudar do jardim-de-infância, também privado, para aquela pré-escola. Muitas mudanças ao mesmo tempo para o coração da mãe: às dúvidas normais da adaptação de mudança de escola e de nível de ensino somavam-se os receios relacionados com a passagem do ensino privado para o público.

A adaptação a uma nova escola é um processo com uma grande carga emocional para a criança, mas também para os pais. E é na gestão da ansiedade por parte dos mais velhos que pode estar a solução para gerir a ansiedade dos mais novos.

E as filhas não lhe estavam a facilitar a vida. «A Laura, sendo extrovertida e tendo facilidade de adaptação, não andava encantada com a escola nos últimos tempos e ficava muitas vezes a chorar quando a deixava. A Alice, tímida e com muitas dificuldades de adaptação, até nas festas de aniversário dos amigos ficava agarrada às minhas pernas.»

Diz o ditado que a mudança é a única constante na vida, mas isso não quer dizer que seja fácil. A adaptação a uma nova escola é um processo com uma grande carga emocional para a criança, mas também para os pais. E é na gestão da ansiedade por parte dos mais velhos que pode estar a solução para gerir a ansiedade dos mais novos.

«É importante que os pais lidem com tranquilidade com os momentos de transição que vão surgindo. Quando isso não acontece, devem fazer primeiro este trabalho de desenvolvimento pessoal para poderem contagiar de forma positiva os filhos», diz a psicóloga clínica Filipa Jardim da Silva.

Isto implica uma postura calma, que transmita segurança, mas dando espaço à criança para expor as suas dúvidas e questões. Significado: mesmo que se esteja uma pilha de nervos e a contar pelos dedos tudo o que pode correr mal, é de guardar esse nervoso para si e aprender a controlá-lo.

«Para não terem reações alarmistas, os pais devem ter presente que é normal surgirem sinais de stress», diz Nuno C. Sousa.

Pais nervosos não conseguem tranquilizar as crianças. Talvez por isso, Madalena admite, um ano depois, que está agora a dissecar verdadeiramente a coleção de medos que tinha na véspera do início de aulas na Escola Básica Engenheiro Ressano Garcia, em Lisboa: medo de que as filhas não se adaptassem, medo de que não gostassem das professoras, medo de que fossem mal aceites pelos colegas, medo de que a mudança radical pudesse dificultar a aprendizagem da mais velha. «Na altura tentei não pensar demasiado nisso, para não ficar bloqueada. Mentalizei-me de que a mudança e o convívio com pessoas diferentes seriam benéficos para as duas.»

E foram. Laura entrou na sala, no primeiro dia, e começou a brincar com os meninos, sem olhar para trás e enquanto a mãe se afastava a fungar e a limpara as lágrimas o mais
discretamente possível. Fez uma adaptação faseada, ficando cada dia um pouco até mais tarde. «Nunca chorou, nunca se queixou, relacionou-se bem com todos os meninos e adorou a educadora.» Com Alice, previsivelmente, houve sinais de resistência, embora discretos. «Teve dificuldades no início.

Chorou de manhã durante vários dias, quando a deixávamos na escola. Mas estava sorridente quando a íamos buscar ao final do dia.» Os choros foram passando e dando lugar a alguma alegria matinal. Passou a gostar da escola, dos amigos, da professora. «Hoje é uma criança mais segura e confiante, e já há poucos sinais da menina que se agarrava às minhas saias nas festas.»

Por outro lado, há sinais de alerta que passam despercebidos no radar parental e devem ser investigados através de uma conversa com a criança.

Estes sinais, como o choro matinal ou não querer ficar na escola, preocupam os pais mas não costumam ser alarmantes. São sintomas adaptativos normais que podem ocorrer durante o primeiro mês. «Para não terem reações alarmistas, os pais devem ter presente que é normal surgirem sinais de stress», diz Nuno C. Sousa. O psicanalista refere que podem surgir outras alterações fisiológicas como descontrolo nos esfíncteres, alterações no apetite e uma postura tensa, mas só devem ser motivo de preocupação caso persistam por vários dias.

Por outro lado, há sinais de alerta que passam despercebidos no radar parental e devem ser investigados através de uma conversa com a criança. «É caso de crianças que apresentam um discurso em que corre sempre “tudo normal”, mas depois evitam explicações. Poderá ser indício de que há algum problema do qual a criança está a tentar fugir.»

As crianças são resilientes e adaptam-se quase sempre, demore mais ou menos tempo. Mas também há casos em que as coisas não correm pelo melhor: o tempo passa e a criança diz persistentemente que não gosta da nova escola, que não tem amigos, que não gosta dos novos professores, que queria voltar para a escola antiga. E há que procurar um equilíbrio entre desdramatizar a mudança e valorizar os protestos.

«As queixas devem ser sempre investigadas para que se perceba qual o problema e a sua dimensão. As crianças, por vezes, expressam-se de uma forma que parece exacerbada, mas isto não implica que não tenham razão», defende Nuno C. Sousa. A origem do problema pode ser uma dificuldade de adaptação, mas também um conflito concreto na escola, que faz que a criança tome o todo pela parte. «É frequente os recém-chegados serem perseguidos pelos “da casa”.

A inocência das crianças é acompanhada de uma imaturidade crua e às vezes são cruéis. E têm uma tendência para generalizar: se não têm uma relação fácil com um colega, então a escola toda é má!» Neste sentido, os pais devem explorar junto do corpo educativo se há alguma situação hostil no ambiente escolar e perceber junto dos filhos o que tem sido difícil, de forma a compreenderem onde está o conflito e, a partir daí, darem sugestões à criança de como pode lidar com a situação.

Todas as transições oferecem dificuldades, mas algumas idades têm desafios específicos. Antes dos 6 anos, as crianças tendem a sofrer com a perda da educadora e da auxiliar, que são os adultos de referência na escola. Nos mais velhos, um dos desafios passa por mudar de colegas e ficar mais afastado dos amigos. É nesse processo que está Benedita, de 10 anos, prestes a iniciar o ano letivo num novo colégio, bem maior do que aquele onde fez o primeiro ciclo e para onde não vai nenhum dos amigos de turma.

A mãe, Filipa Cordeiro, acredita que o desafio para a filha será a mudança do ambiente pequeno, familiar e com muitos afetos que tinha no colégio anterior para um sítio com muitos alunos e professores e turmas maiores, o que acaba por tornar o ambiente mais impessoal. «Expliquei-lhe que na vida existirão muitas ruturas e que isso não será necessariamente mau. “Ver o copo meio cheio” é uma expressão aplicada cá em casa. O importante é sentir-se motivada para o estudo e confortável para fazer novos amigos.»

«Achas que nesta escola há bullying?» foi uma das primeiras perguntas que Benedita, pouco dada a lutas e violência, fez à mãe. A escolha do novo sítio – uma vez que a escola em que estava só tem primeiro ciclo, não foi fácil. Na bagagem, Benedita já leva uma experiência de não adaptação que determinou uma mudança de escola: quando passou da pré-escola para a primária não se adaptou.

Havia miúdos que gozavam com ela, outros que a ameaçavam e uma que lhe batia. «Só se sentia bem dentro da sala, com a educadora. Mas os intervalos eram um tormento. Não se adaptou e a escola passou a ser para ela um sofrimento. A educadora e a directora eram dedicadas, mas havia uma falta de controlo de certas situações.»

Filipa Cordeiro viu-se perante um dilema: ou tentava munir a filha de ferramentas para se defender ou a mudava de escola. «Acabei por não ter coragem para a deixar onde estava. Achei que a experiência estava a ser muito marcante para ela e gerava uma predisposição para a aprendizagem que estava longe da que ambicionava para ela.»

Com um imenso esforço financeiro, acabou por mudá-la para o colégio privado onde terminou o primeiro ciclo e de onde agora saiu. Em altura de mudanças, esta situação no passado faz que a mãe fique um pouco mais preocupada, pelo que acabou por decidir inscrevê-la num novo colégio privado, até ao 7º ano.

As passagens da escola privada para a pública podem ser um desafio porque à mudança de sítio e à separação dos amigos se pode somar, em alguns adolescentes, uma sensação de «despromoção» pelo facto de os pais deixarem de poder pagar um privado. Mas a psicóloga Filipa Jardim da Silva garante que a mudança será vivida dependendo da lente e da interpretação que os pais lhe deem e não tem de ter rótulos pejorativos.

«Ao longo do nosso crescimento é necessário reajustarmos coordenadas perante as circunstâncias: podemos lamentar-nos e sentirmos que estamos a fazer despromoções à nossa qualidade de vida ou podemos encarar essas mudanças como oportunidades e desafios para treinarmos as nossas competências de adaptação e resiliência.» E a ajuda dos pais neste sentido é essencial.

DIVÓRCIOS, MUDANÇA DE CASA E OUTRAS QUESTÕES

Quando a mudança de escola é ditada por outras circunstâncias, como o divórcio dos pais, com consequente mudança de residência da criança, esse apenas um dos desafios que a criança tem pela frente, mas não o maior. «Nos casos em que a mudança é motivada por outra razão, é possível que os sinais de mal-estar sejam demonstrados na escola – porque é lá que passam o dia –, mas a intervenção terá de incidir em ajudar os filhos a lidar com a causa da mudança», diz o psicoterapeuta Nuno C. Sousa. São situações em que faz sentido alertar o diretor de turma, para que todos os professores possam estar especialmente atentos ao comportamento da criança.