As nossas apostas para 2017

COMEÇAMOS SEMPRE O ANO A OLHAR PARA O FUTURO. VOLTÁMOS A CONVIDAR 12 ESPECIALISTAS PARA ELEGEREM OS NOMES EM QUE APOSTAM PARA 2017 NAS SUAS ÁREAS. CATARINA FURTADO, NUNO GAROUPA, MIGUEL GUEDES, JOÃO GOBERN, MIGUEL PIRES, BÁRBARA BULHOSA, MANUEL SERRÃO, MARIA DO CARMO FONSECA, ANDRÉ CEPEDA, JOSÉ MANUEL RIBEIRO, LUÍS ARAÚJO E TIAGO RODRIGUES AJUDARAM-NOS A CONSTRUIR ESTA SELEÇÃO DE ESPERANÇAS.

 

Moda

FRANCISCA PÉREZ

Entre os 14 e os 18 anos, quando acabou o 12º ano, conciliou os estudos com os desfiles e as produções. Francisca – herdou o Von Hafe da bisavó alemã e o Pérez do avô espanhol que emigrou para o Porto – queria continuar a fazer isso na faculdade, mas as solicitações eram cada vez mais e o trabalho não parava. «Eram boas oportunidades e um grande desperdício para o currículo perdê-las.» Resolveu então adiar a candidatura ao ensino superior. «Queria fazer Marketing ou Publicidade, mas não era certo. Por causa da moda, já conhecia mais coisas do que as minhas amigas, tinha horizontes mais alargados.» O booker convenceu-a então a parar durante um ano e ir para a capital francesa. «Em Paris passa-se tudo. E trabalhar mais lá fora significa ter mais clientes cá dentro.» Durante três meses e meio, foi apenas ela, uma mala de viagem, um book de fotografias e um mapa da cidade. Regressou a Portugal para receber o prémio de Modelo Revelação 2012 da Fashion TV 2012. E aí, sim, tudo disparou. E veio a conclusão: é possível viver só da moda, com base no Porto, onde está a família, e trabalhar cá dentro e lá fora.
Fez passerelle, comerciais, editoriais, produções. A ocupação passou a profissão. E a profissão passou a carreira. Sim, carreira. Apesar de ter apenas 22 anos, os oito que leva a ser fotografada para marcas como Bershka, Mango ou Intimissimi (foi embaixadora da marca de lingerie em Portugal), a desfilar no Portugal Fashion, na ModaLisboa, nas semanas da moda de Milão ou Paris ou a fazer campanhas para estilistas internacionais já lhe garantem um portfolio invejável. E abrem-lhe portas. Cada vez mais portas, para sonhos cada vez mais altos.
70-63-89. Com estas medidas e uma vontade férrea, talvez 2017 seja finalmente o ano em que vai desfilar para Dolce & Gabanna, sonho antigo. Ou talvez Valentino, Dior ou Chanel. Ou ser um dos anjos da Victoria’s Secret. «Importa é continuar a trabalhar.» Há semanas em que não tem um único dia livre, mas ela não se importa. Focada mas não deslumbrada, sabe que depende só dela. E do trabalho dela. PF

 

 

Música

DÉBORA UMBELINO

Os pais de Débora Umbelino não são nenhuns nativos da Islândia, com muita pena da filha de 21 anos. Não que quisesse ter uns Sigur Rós em casa em vez deles, longe disso! Adora-os e adora Leiria, onde vive, além de que para cantar e tocar instrumentos – teclas, guitarra, baixo, bateria, caixinhas de ritmos – basta ela própria. Mas se assim fosse teria, pelo menos, como justificar aquele amor pela cultura musical da ilha a norte, tão misterioso e absoluto. Tão transformador. «O bichinho da Islândia veio quando fiz 14/15 anos e transitei de ouvir música normal para música mais estranha: Múm, Amiina, Björk, GusGus, Vök, Kiasmos e outros», diz a jovem artista experimental, que responde como Surma desde 2014. «Saí de uma banda de que fazia parte na altura – os Backwater and the Screaming Fantasy – e decidi fazer uma coisa a solo, com mais liberdade de criação.»
Miguel Guedes aguarda com expetativa que ela acabe de gravar o seu primeiro álbum com a Omnichord Records. «Não é apenas pelo facto de o fazer sozinha em modo self-made woman. É sobretudo pela forma singular como enquadra diferentes estilos e paisagens, como combina linguagens diversas e cria a proximidade», diz o músico, falando em «talento, criatividade, pujança, rasgo». O nome Surma ficou quando Débora viu um documentário sobre tribos indígenas e se falou nesse grupo do Sudoeste da Etiópia. «Risquei logo outras ideias que tinha num caderno. Os Surma fazem tudo no momento, não pensam em passado ou futuro. Tal como a Surma», que está profundamente agradecida aos pais (os tais que não são islandeses) por sempre lhe terem dado a ouvir vários géneros de música em menina. «O que tiver de vir, agora virá.» AP

 

 

Gastronomia

PEDRO PENA BASTOS

A questão não é se Pedro Pena Bastos vai ganhar uma estrela Michelin, mas sim quando. E 2017 é bem capaz de revelar-se um ano animador para o cozinheiro à frente da Herdade do Esporão, no Alentejo. No fim do ano voltamos a falar. «Não conheço aquela experiência e visão num jovem daquela idade», diz Miguel Pires, o jurado que o referiu para revelação deste ano. «Tem um talento inato a pensar e executar pratos que nunca tinha visto em Portugal. Tem menus muito bem construídos, tem os conceitos internacionais todos e depois valoriza o que é local. Se é verdade que já ninguém inventa nada de novo na gastronomia mundial, também é verdade que há algo de muito promissor, até entusiasmante, no trabalho que este chef está a desenvolver.»
Tem 26 anos e lidera há dois uma cozinha que não é fácil de afirmar. «Estar fora dos grandes centros urbanos traz sempre problemas», diz o chef. «Mas há o lado bom de nos podermos associar as produtores locais – e muitas vezes é preciso trabalhar com eles, ensiná-los a fazer melhor.» A sua teoria não é só gastronómica, é também social. «O Alentejo tem algumas das melhores matérias-primas que existem, uma das melhores cozinhas do mundo, e se calhar um restaurante de alta-cozinha pode mobilizar os produtores a valorizarem o que oferecem.» Pedro Pena Bastos não quer só brilhar num restaurante, quer criar – pela qualidade da comida – uma alternativa económica numa região deprimida.
Chegou em setembro de 2014 e esta é a primeira experiência de liderança. Estudou na Escola de Hotelaria e Turismo do Estoril, depois de ensaiar uma incursão pela Biologia – e, afinal, suspirar pelos tachos. Fundou uma empresa que realizava refeições em privado, e foi precisamente por trabalhar fora da caixa que repararam nele. Estagiou em alguns dos melhores restaurantes do mundo, e continua a fazê-lo, para perceber que caminhos leva a gastronomia. Mas, mesmo portuense, tornou-se alentejano. É na carne de caça, nos lagostins do rio, nas ervas da planície que Pedro Pena Bastos descobre a modernidade. RJR

 

 

Literatura

ALEXANDRE ANDRADE

Não é propriamente um jovem talento (tem 45 anos), mas Bárbara Bulhosa aposta nele como a revelação literária de 2017. Porque acredita que Alexandre Andrade «é uma voz nova, muito culta e articulada, que escreve de forma original, procurando referências que são tudo menos óbvias. Vai ser um nome de que vamos ouvir falar de certeza. Mais do que isso, vai ser um nome que vai ficar na literatura portuguesa». A escolha da fundadora da Tinta da China é insuspeita, até porque Andrade nunca publicou naquela editora.
Escreveu três romances (na verdade considera-os dois romances e um pequeno texto de ficção) mais três livros de contos. Na calha tem um novo romance, «um diálogo em torno das lendas arturianas», e como projeto também assume um livro de contos relacionado com arte contemporânea. «A ideia é que cada texto seja apadrinhado por um quadro abstrato, em que o ambiente do que escrevo esteja próximo do ambiente que aquela pintura me transmite.» Gosta de compor séries, admite, de recolher histórias de sucesso e fracasso. O último livro de contos, Quartos Alugados (Ed. Exclamação, 2015), falava de espaços ocupados provisoriamente. Também assina dois blogues – Um Blog Sobre Kleist e Cinéfilo Preguiçoso.
Para Alexandre Andrade existem dois mundos, o da escrita e o outro. No outro é investigador na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, a sua área é a física aplicada à medicina. «São atividades diferentes, mundo distintos. Não me interesso por ficção ligada à ciência nem imprimo um toque criativo à minha atividade científica.» E, no entanto, são universos que habitam o mesmo corpo. Quando estava na faculdade, a adivinhar passadas de cientista, leu o livro que provavelmente mais o influenciou, Retrato do Artista enquanto Jovem, de James Joyce. «Tem um conteúdo humano muito profundo e a escrita é magistral. O mais fascinante de tudo é que o estilo de escrita muda à medida que a personagem cresce, sem que nos apercebamos. É um livro com um efeito profundo e duradouro.» Em 2017, pode muito bem ser que, pelo menos na duração literária, nasça em Lisboa um Joyce chamado Andrade. RJR

 

 

Ciência

CLÁUDIO FRANCO

Em 2013, quando muitos jovens decidiram deixar o país por falta de trabalho e de condições de vida, Cláudio Franco escolheu regressar a Portugal para constituir família. O cientista de 35 anos, licenciado em Bioquímica pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, estagiou e fez o doutoramento na Universidade Pierre e Marie Curie em Paris e continuou a estudar e a investigar em Londres, no London Research Institute, onde concluiu o pós-doutoramento na área dos vasos sanguíneos. A decisão de regressar em Portugal não significou «abdicar de querer fazer boa ciência». «Mantive sempre o contacto com a ciência que se faz em Portugal e sabia que existia excelência.» Maria do Carmo Fonseca começa por apontar precisamente essa opção de Cláudio, incluindo-o no leque de «jovens corajosos que decidiram vir instalar-se em Portugal, assumindo o risco».
Após o regresso, Cláudio Franco radicou-se no Instituto de Medicina Molecular (IMM) e ganhou um financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia, o que lhe permitiu constituir um grupo independente dentro do IMM. Em 2015 venceu uma bolsa de 1,5 milhões de euros, atribuída pelo Conselho Europeu de Investigação, para continuar a investigação na área que o apaixona, a Biologia Molecular. Cláudio está interessado em perceber a forma como os vasos sanguíneos se organizam de forma hierárquica, o que poderá ter um grande impacto nas várias áreas da medicina, nomeadamente no estudo do cancro. «O cancro tem mecanismos próprios para ativar e atrair vasos para que estes lhe forneçam a energia necessária ao crescimento», explica. O ano de 2017 pode ser aquele em que Cláudio Franco vai ver o impacto direto do seu trabalho na medicina. As investigações conduzidas pelo cientista serão publicadas em conceituadas revistas da especialidade, o que se pode traduzir em aplicações terapêuticas. CFM

 

 

Artes Performativas

JOÃO PEDRO MAMEDE

Quis ser arquiteto, mas é nos palcos que utiliza a inteligência espacial, sempre entre a profunda consciência do seu corpo no espaço e a fluidez do movimento. Aos 24 anos, João Pedro Mamede é o ator revelação de quem todos falam. O ano de 2017 vai começar em grande para o jovem, que logo no dia 11 de janeiro se estreia como encenador da peça A Estupidez, de Rafael Spregelburd, em cena no Teatro da Politécnica. O teatro surgiu aos 14 anos como «uma coisa que fazia aos sábados à tarde» na Cena Múltipla em Almada, sob orientação de Francis Seleck. Quando lhe passou pela cabeça que a representação podia ser «aquilo que fazia todos os dias», Seleck passou-lhe livros clássicos para as mãos e disse-lhe: «Se continuares a querer ser ator depois disto…» João Pedro Mamede deixou-se fascinar por alguns capítulos e rejeitou o «misticismo em torno do ator» de outros. Foi então que percebeu que «tinha distanciamento crítico» suficiente para seguir essa vida.
Estudou teatro no Conservatório de Lisboa e juntou-se aos Artistas Unidos. Foi o Tom Wingfield de Jardim Zoológico de Vidro, de Tennessee Williams, com encenação de Jorge Silva Melo, participou no filme Cartas da Guerra, de Ivo M. Ferreira, e criou uma companhia, Os Possessos, onde é um dos três diretores artísticos. Tiago Rodrigues sublinha precisamente o trabalho de João Pedro Mamede ao impulsionar a companhia, combinando esse papel com a carreira de ator e de encenador. «Essa coisa de eu ser uma promessa começou quando eu tinha 21 aninhos. É difícil gerir essa expetativa. Tens de te construir e de descobrir quem és independentemente disso.» E aquilo que João Pedro Mamede busca pode não estar em Portugal. «A profissão de ator aqui não existe. Às vezes não tenho um cêntimo na conta. Quando ganhei o prémio de jovem talento em Almada deu-me jeito porque consegui pagar a renda nesse mês.» CFM

 

Comunicação
SEBASTIÃO BUGALHO

Mais um artigo escrito, menos umas coisas por dizer. Mais uma tacada certeira, menos um aperto na garganta. Aos 21 anos, Sebastião Bugalho quase podia jurar que a juventude possui recursos inesperados. É jornalista apenas desde o verão passado – tudo começou com uma coluna de opinião que mandou para o jornal i. Gostaram e convidaram-no a mantê-la. Também só está no terceiro ano do curso de Ciência Política na Universidade Católica de Lisboa – conta terminá-lo neste ano. Certo é que não lhe tremem as mãos quando dispara à esquerda e à direita. E fá-lo com tanta finura que João Gobern acredita que ele é já um homem feito da imprensa, entusiasta e honesto. O facto de nem sempre concordar com o jovem não vem ao caso. Irá longe. Àquela primeira coluna seguiu-se o convite para estagiar na secção de política do jornal, a que se seguiu uma proposta de emprego no grupo (também detentor do jornal SOL). Depois vieram as solicitações para comentar na TVI 24 quando se debate política nacional e internacional. Suspeita que o bichinho lhe mordeu por ser filho de jornalistas: João Bugalho e Patrícia Reis, escritora e editora da revista Egoísta (ainda assim, quando enviou o tal artigo, assinou com pseudónimo, para que o apelido não influenciasse a decisão do editor). «Os jornais são para mim um pilar da democracia. Como democrata, é um privilégio trabalhar neles», diz Sebastião. Adorou escrever o obituário de Cristóvão Norte, ex-deputado e presidente da concelhia do PSD-Faro: «Não dá gozo nenhum anunciar a morte de alguém ao mundo, mas é bom quando tens a oportunidade de contar como foi a sua vida.» Nos bastidores da Assembleia da República move-se bem, um sentimento libertador. «Se me perguntam sobre a morte do idealismo na profissão, acho que já nasci sem achar grande graça a idealistas», avisa. O que não quer dizer que não tenha convicções. AP

 

 

Artes Plásticas

JOÃO MARÇAL

Confrontado com o desafio, André Cepeda não hesitou. Em 2017 ouviremos seguramente falar de João Marçal, vencedor da segunda edição da Parceria Atelier-Museu Júlio Pomar/ EGEAC e Residency Unlimited, NY, que proporciona todos os anos uma residência artística de três meses naquela instituição nova-iorquina. «Experiência que será marcante, tanto pela experiência da cidade como pelo confronto com as obras que sempre o influenciaram e inspiraram e que se encontram nas principais coleções Museus de NY», diz o fotógrafo jurado. Mas o próximo ano trará mais: uma exposição individual na Galeria Graça Brandão e alguns projetos na Fundação EDP e na Feira Internacional de Arte Contemporânea ARCO em Madrid. João Marçal nasceu em Santarém em 1980, cresceu e viveu em Coruche. «No meu historial familiar não há nenhuma ligação às artes e Coruche também não tinha absolutamente nada para me motivar nesse sentido. Mas em miúdo passava muito tempo a desenhar, era o que gostava mais de fazer.» A família incentivava oferecendo material de desenho e livros de arte. Como não havia agrupamento de artes em Coruche, o décimo ano foi cumprido em Santarém, «ponto de viragem importante para conhecer
mais coisas, para começar a ver exposições». Durante três anos, fazia viagens diárias de autocarro e ainda hoje aquele grafismo, aquela cor dos assentos, estão presentes na pintura de Marçal.
Chegou às Belas-Artes do Porto «sem background artístico mas determinado a aprender». Tinha a certeza de que aquele era o caminho. Ainda na faculdade percebeu que lhe seria impossível «separar o dia-a-dia da pintura», um cliché, reconhece, «mas verdadeiro». Os temas são, por isso, múltiplos: «Transportes públicos, morte, padrões, solidão, alpinismo, nostalgia, whisky, relacionando-os sempre com questões e conceitos ligadas à pintura». A tendência para um tema específico surge justamente pela naturalidade com que o relaciona com a pintura, «como se a pintura abraçasse todo o pensamento». ATT

 

 

Política

MARIANA VIEIRA DA SILVA

Não se vê como política profissional, apesar de a política estar presente em tudo – nos livros que lê, nos filmes que vê, na forma como consome informação. Filha do ministro
Vieira da Silva, nunca quis inscrever-se na Juventude Socialista. Quando sugere o nome de Mariana Vieira da Silva, Nuno Garoupa fá-lo também por isso: «É a única pessoa mais jovem na política de que me consigo lembrar, todos os outros são jotas e não queria entrar por aí.» Mariana inscreveu-se no PS no dia seguinte à derrota de Ferro Rodrigues nas legislativas de 2002. «Quis estar presente na derrota.» Foi assessora da ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues entre 2005 e 2009. Agora, como secretária de Estado adjunta do primeiro-ministro, é a pessoa mais próxima de António Costa. Ainda assim, a escolha do seu nome como política a observar em 2017 surpreende-a. «Eu gero curiosidade porque ninguém sabe o que faz a secretária de Estado adjunta do primeiro-ministro.» E o que faz? «Ajudo o primeiro-ministro na coordenação política e na comunicação do governo.»
Com 38 anos, a socióloga não pode apontar o 25 de Abril como o momento que definiu a sua geração. Escolhe o 11 de Setembro. «Foi um momento do crescimento do sentimento que nunca trouxe nada de bom ao mundo: o medo.» Medo que, parece, vai continuar a dominar o discurso político em muitos países em 2017. O que fazer num ano que tem tudo para ser muito difícil? Aí, a secretária de Estado fala em nome do governo: «Temos de continuar a responder à expetativa de mudança que as pessoas têm e viver essa mudança com tranquilidade.» O que não será garantia de nada, acautela. «Isto não nos torna imunes, não nos torna uma espécie de aldeia gaulesa. Mas torna-nos mais capazes de lidar com as ameaças.» CFM

 

 

Desporto

RÚBEN GUERREIRO

«O Rúben é um segredo bem guardado do nosso ciclismo. Baixinho, os treinadores e diretores técnicos vão-lhe augurando grandes feitos, superiores até aos da nossa estrela atual, o Rui Costa. Tem apenas 22 anos, mas já emigrou e até já trocou de equipa.» O jornalista José Manuel Ribeiro acredita que é uma boa aposta. Em 2017, Rúben, menino precoce do ciclismo, vai correr pela Trek, uma das melhores equipas do mundo, «estreia ao nível mais alto, o que talvez lhe limite os horizontes no arranque, mas nunca se sabe, porque o talento está lá e o pulmão também.»
Rúben Guerreiro, 64 quilos para 1,78 metros, vai ser colega de equipa de Alberto Contador, referência de infância, e do português André Cardoso. Natural do Montijo, recebeu aos 5 anos a primeira bicicleta, uma Sirla. «A aprendizagem não foi fácil. A minha mãe conta que eu tinha muito medo e que demorei muito tempo a largar as rodinhas.» Filho de floristas, herdou do pai – praticante assíduo de BTT – o gosto pela modalidade. Mas foi na estrada que Ruben mostrou ao que ia. Pedala para ganhar desde os 16 anos, idade da estreia, numa prova regional em Azeitão. Aos 18 anos, como sub-23, já campeão nacional do escalão, foi quarto na difícil subida da Freita, deixando para trás muitos ciclistas profissionais. Um ano depois, foi segundo na mesma prova. Em 2014, venceu a Volta a Portugal do Futuro e ganhou lugar na Axeon, a equipa de Axel Merckx (filho de Eddy Merckx, lenda do ciclismo belga). A Volta à Califórnia e os «atrevidos ataques» frente aos melhores do mundo chamaram a atenção dos responsáveis da Trek. Não desiludiu. Numa prova em França mostrou talento em todos os terrenos, conquistando o segundo lugar tanto numa etapa de montanha como, 24 horas depois, em contrarrelógio. Cada treino, cada dia, concentra-se a fundo. A Volta à Austrália, primeira grande prova da temporada, é já em janeiro. Sabe que só daqui a quatro estará no auge da carreira, mas o objetivo está traçado. «Quero deixar uma marca o ciclismo mundial.» ATT

 

Solidariedade
ADRIANA COSTA SANTOS

«A Adriana venceu neste ano o Prémio Comunicação Corações Capazes de Construir da Associação, que eu presido, pelas crónicas que publicou na Visão online. Merece todo o destaque.» Catarina Furtado acompanha de perto o percurso de Adriana Costa Santos, a rapariga de 22 anos que depois de terminar a licenciatura em Relações Internacionais foi para Bruxelas como voluntária. Trabalha, desde 2015, na Plateforme Citoyenne de Soutien aux Réfugies e no centro de apoio aos refugiados de Hall Maximilien. Em setembro iniciou o mestrado em Antropologia na Universidade Livre de Bruxelas. A tese será sobre mobilidade social descendente. Para suportar os custos faz babysitting e trabalha num restaurante à noite, mas continua a fazer voluntariado. Deixou Lisboa a pensar ficar um mês. Ficou um ano e vai continuar.
Debates ignorantes nas redes sociais e na imprensa sobre a questão dos refugiados, o mundo árabe, o islão e o terrorismo, enquanto lia notícias e via fotografias da desgraça humana» tiravam-lhe o sono. Zangou-se e decidiu agir. «Soube por uma amiga que se estava a formar num jardim em Bruxelas um campo espontâneo de iraquianos e sírios que chegavam todos os dias à procura de asilo. A minha amiga ofereceu-se para me receber em casa dela e resolvi ir ajudar. Não tinha nada a perder.» Descobriu Bruxelas com os refugiados. «Partilhámos sítios bonitos, informações úteis sobre transportes, etc. Cozinharam-me pratos típicos do Iraque e da Síria, ensinaram-me a dançar à maneira do Afeganistão, traduziram-me letras de canções, mostraram-me fotografias da família e das suas cidades, do antes e do depois.» E de viagem em viagem por realidades novas, foi crescendo e agradecendo.
No campo, distribuiu comida e roupas. Trabalhou na secretaria, na cozinha, conheceu historias e emoções muito fortes. Físicas, também «Tive tantos bebés no meu colo.» Durante meses, na revista Visão, Adriana escreveu sobre «todas essas pessoas que ganharam o rótulo de refugiadas, mas que antes tinham uma vida, uma personalidade, uma história, um rosto, ideias próprias.» Aprendeu a relativizar, porque longe, mesmo muito longe, é caminhar da Grécia à Bélgica. «Aprendi a ser tolerante em relação à intolerância dos outros.» ATT

 

 

Turismo

HUGO OLIVEIRA
Naquela road trip que fez pela Austrália em 2012, só liberdade e cabelos ao vento numa autocaravana, Hugo Oliveira soube que o seu caminho estava a começar. Notou que andar com a casa às costas era um tipo de férias comum por lá, todas as famílias o fazem. Chegado a Portugal, quis recriar o conceito à sua maneira. «Fazia-me sentido usar veículos mais pequenos, fáceis de conduzir, que se adaptassem às pessoas e não o contrário», explica o empreendedor de 27 anos, mestre em Gestão pela Nova School of Business and Economics. Então arranjou seis campervans para começar, adaptou-lhes os interiores para campismo na serralharia do pai, com uns amigos, e criou a Indie Campers em 2013. Luís Araújo não lhe poupa elogios: «É uma das startups com maior crescimento no setor turístico português, inovando na oferta de aluguer online de autocaravanas modernas, com um design apelativo. Em 2015 faturou mais de 1,5 milhões de euros e está neste momento a desenvolver um plano de expansão.»
De 25 carrinhas em 2015 e cem em 2016, Hugo conta ter umas 400 neste ano. Também a equipa cresceu para cerca de trinta jovens formados em Turismo e Hotelaria, que asseguram a dinâmica da empresa – incluindo abrir pontos de aluguer/recolha noutros países, onde contratam depois a nível local. «Funcionamos exclusivamente online, a preços entre os 39 e 145 euros por dia, e temos internet gratuita nos veículos para melhorar a experiência do viajante», diz o responsável, preparado para abrir agora novos spots em França, Itália, Bélgica e Suíça, a somar aos da península Ibérica, ilhas Canárias, Sicília, Sardenha e Córsega. Nas suas campervans já houve de tudo um pouco, desde pedidos de casamento a gente a pedir-lhe para ficar a trabalhar com eles. E bebés a nascer? «Que eu saiba não, embora já lá devam ter sido feito muitos», ri-se. AP