Eles gerem o Facebook da PSP – e são muito bons nisso

A Polícia de Segurança Pública tem uma página de Facebook bastante ativa – e pertinente. A equipa que a gere alerta para a ausência de casa durante as férias, avisa sobre os perigos dos carteiristas, lembra o uso do cinto de segurança. Mas é a rapidez com que falam de temas de atualidade e o humor na dose certa que conseguem usar que os distingue. Nem a febre do Pokémon Go escapou ao olho clínico dos agentes.

Na porta que dá acesso a uma das salas do Gabinete de Imprensa e Relações Públicas da Polícia de Segurança Pública (PSP) estão coladas seis impressões de criaturas Pokémon. «Estes fomos nós que caçámos», diz o intendente Hugo Jesus Palma, diretor daquele departamento. Também os polícias se renderam à febre do Pokémon Go. O jogo de realidade aumentada que tomou de assalto os smartphones de todo o mundo chegou a Portugal há uma semana e já lidera o ranking de aplicações gratuitas com maior número de downloads na loja online da Apple. Perante este fenómeno de sucesso global, a PSP decidiu agir e publicar na página de Facebook um alerta com alguns conselhos de segurança para uma boa caçada. O resultado? Mais de oitocentos comentários, 17 mil gostos, 25 mil partilhas. É o segundo post mais partilhado desde que lançaram a página, logo atrás daquele que refere o novo sistema da carta por pontos, publicado em maio , antes de as alterações entrarem em vigor.

Tanto uma publicação como outra foram pensadas ao pormenor. Todos os posts do Facebook da PSP são fruto de um trabalho de brainstorming e discussão de temas. «As ideias discutem-se num gabinete, discutem-se ao almoço, discutem-se em qualquer situação. Depois são trabalhadas e desenvolvidas», diz o oficial. Há um ano à frente da equipa de comunicação da instituição, deixou a área operacional para dar continuidade a um projeto que começou a ganhar forma em 2011. Foi nesse ano, ainda sob a alçada do subintendente Paulo Flor, de quem Hugo herdou a equipa com que trabalha atualmente, que a PSP transformou o então perfil no Facebook numa página de fãs. De dois mil seguidores em julho de 2010, chegaram aos atuais 489 mil fãs [atualizado a 22 de julho de 2016].

Paulo Flor, que, entre 2008 a 2016, foi o responsável pela equipa de comunicação e relações públicas, levou a questão à direção da PSP. «Sugeri que o objetivo da PSP no Facebook fosse informar, sem filtros, para todos, sempre, sabendo que deveríamos estar onde as pessoas estavam», diz o atual Segundo Comandante da Primeira Divisão do Comando Metropolitano de Lisboa.

Também com presença no Twitter, a força de segurança encontrou nas redes sociais uma nova forma de chegar à comunidade civil. «Tentamos afastar aquela imagem estática do polícia de farda, uma coisa monolítica, com o policiamento de proximidade», diz o intendente Hugo Palma. «O polícia deixa de ser aquela farda e passa a ser um rosto. É o João, a Maria, a Cristina. É esta a filosofia base da nossa comunicação. Fazemos um discurso mais próximo, de integração na comunidade. Temos de ser parte dela, não podemos ser um corpo estranho.»

Tudo começa com a primeira mensagem da manhã. A partir do edifício da Direção Nacional, no largo da Penha de França, em Lisboa, a PSP deseja um bom dia aos quase 500 mil fãs. A saudação acompanha uma imagem de um agente em serviço. Pode ser uma fotografia de grupo formal, um retrato captado por um civil, até uma selfie de um polícia. «Bom dia de Bragança, bom dia de Ponta Delgada, bom dia de Lisboa, o nosso “bom dia” no Facebook é nacional», diz o diretor do gabinete de comunicação. Depois desta, seguem-se outras publicações, ora mais formais, ora mais descontraídas.

Entre posts de denúncias e detenções, surgem montagens de imagens, textos e até gifs com uma pitada de humor. O conteúdo é diverso e depende daquilo que está a ser falado, de uma tendência, de uma moda, de um dia comemorativo.

Como aconteceu com o primeiro de abril. «Dissemos que iríamos encerrar oficialmente a página. Questionámo-nos: estaremos a pisar alguma linha vermelha? Mas arriscámos. Associámo-nos ao espírito do dia e no final esclarecemos a brincadeira. Foi uma pequenina transgressão que funcionou.»

A julgar pelo feed da página, todas as publicações que fogem ao registo de comunicação mais formal têm resultado bem. No caso do post sobre o Pokémon Go, o feedback foi tão positivo que choveram comentários a congratular a «excelente comunicação» da PSP. Uma comunicação que tem vindo a ser aperfeiçoada, aos poucos, e que, no fundo, é uma estratégia. O objetivo primordial continua a ser o de informar com rigor e alertar para as questões relacionadas com a segurança pública. Mas se, ao trabalho puro do polícia se puder juntar um toque humorístico? A ideia foi bem recebida. Em cinco anos, o Facebook da Polícia de Segurança Pública cresceu. E muito. Hoje, segundo o site de estatística aplicada às redes sociais Socialbakers, é a página que ocupa o primeiro lugar do ranking das instituições governamentais portuguesas com mais seguidores (489 mil), à frente do INEM (312 mil) e da Guarda Nacional Republicana (283 mil). A nível europeu, o Facebook da PSP está à frente de outras páginas de entidades de segurança, como a Polícia Nacional Espanhola (444 mil seguidores), a Polizia di Stato, em Itália (275 mil), a Metropolitan Police Service, no Reino Unido (109 mil), a Polska Policja, na Polónia (165 mil) e o Serviço europeu de Polícia Europol (19 mil). A Policie Nationale, em França, é das poucas instituições a ultrapassar o número de seguidores do Facebook da PSP – tem 610 mil.

São estes números um espelho da estratégia de comunicação? Podem ser. Das entidades acima referidas, só a PSP segue uma linha de abordagem mais informal e descontraída. «Foi um risco assumido, o de avançar com uma comunicação menos cinzenta que nos tentasse aproximar mais da nossa comunidade e seguidores. Porque é mesmo um risco. Lá está: o humor é uma arma e uma excelente forma de nos aproximar. Mas temos a instituição policial por trás. A forma como abordamos a comunidade não pode pôr em causa o profissionalismo da instituição nem aquilo que é o trabalho de polícia», diz Hugo Palma.

Quando o oficial assumiu a direção do gabinete de comunicação, há um ano, já a página contava com 400 mil seguidores. «Eu vim de fora, e surpreendeu-me perceber que algumas das nossas mensagens chegam a tanta gente. Temos grandes responsabilidades. A de pertencermos a esta instituição, a de trabalharmos com este meio milhão de pessoas que nos segue. Acabámos por aligeirar algumas mensagens.» Aligeirar é mesmo a palavra mais indicada. Até nos posts mais formais – os que apelam ao uso de cinto de segurança, à concentração ao volante e à denúncia de maus tratos animais – há uma certa informalidade (ver galeria de imagens em cima). «Outra coisa que fazemos nesta vertente de comunicação mais descontraída é prestar homenagem sempre que uma grande figura morre. Estamos na comunidade e se as outras pessoas sentem, nós também sentimos. Fizemos isso com Nicolau Breyner. Curiosamente quando estávamos a pensar na melhor forma de o homenagear descobrimos uma fotografia dele vestido de polícia, e foi essa a imagem que utilizámos na publicação.»

Esta abordagem levou a PSP a chegar a mais pessoas. Mais seguidores, mais visibilidade. E mais trabalho. Ainda que a página de Facebook seja a face mais visível da comunicação desta entidade, ela não é única. Existe também a comunicação interna, com a newsletter e a revista da PSP, e a área das relações públicas, que trata os eventos. Ao todo, o Gabinete de Imprensa e Relações Públicas da PSP conta com uma dezena de polícias, entre agentes e oficias, dos 20 aos 50 anos. Três estão diretamente ligados à comunicação no Facebook. São «os criativos». Rui Abrantes e Filipe Costa têm licenciaturas em Marketing e Comunicação. José Meira é o único verdadeiro autodidata. Abandonou a área de investigação criminal para abraçar o novo mundo das redes sociais. Trabalha a imagem institucional da PSP e dá uma mãozinha no CorelDRAW e Adobe Photoshop, os programas que utilizam para fazer as montagens. O trabalho faz-se sem recuso a equipamentos sofisticados, mas com a participação de todos. «As ideias não saem só do Abrantes, do Meira e do Costa. Se alguém de outro gabinete tem uma ideia, vê algo que acha interessante ou que pode ser explorado, desenvolvemos» De João Moura, responsável pelo contato com a comunicação social, saiu a ideia para um post a propósito da sexta temporada do Game of Thrones. Também sugeriu fazer-se alguma coisa sobre o episódio de Cristiano Ronaldo e o microfone da CMTV. «Não há aqui nenhuma regra rígida relativa ao processo criativo. É um trabalho muito flexível e dinâmico. E isso é bom», diz o intendente, que tem a palavra final antes de qualquer post ser colocado online.

Com humor e rigor se chega à comunidade e se rejuvenesce uma instituição. «Espero que esta abordagem sirva para se desconstruir a imagem cinzenta que se tem da polícia. Quando despimos a farda brincamos, choramos, festejamos, sentimos como todos os outros. É essa a imagem que gostaríamos de passar, mais humana.»