A surpreendente história da família Ruah

Família Ruah
Família Ruah

São uma das famílias mais influentes da comunidade judaica nacional. O médico Samuel Ruah costumava ser chamado à residência de Salazar e o seu primo Joshua foi o clínico de Álvaro Cunhal. O clã conta ainda com a atriz Daniela e com uma ex-grã-mestra da maçonaria feminina. Mas há muitas outras personagens fascinantes: um grande fotógrafo e um vendedor de pedras preciosas.

QUANDO, COM 17 ANOS, a sua família se instalou em Faro, no Algarve, deixando para trás a vida que tinham em Marrocos, não perdeu tempo. Começou logo a negociar em cortiça, que ia comprar ao Alentejo. Movimentava-se numa mula, na qual levava sempre alguns tachos pendurados. Era um religioso conservador e cumpria à risca as regras da comunidade judaica a que pertencia: as panelas serviam para cozinhar a sua comida segundo o ritual judaico (kosher), que só permite ingerir carne de animais ruminantes e abatidos de certa forma e obriga a eliminar o máximo de sangue colocando-a em água durante algumas horas. O jeito para o negócio levou-o depois a viajar para os EUA, para vender azeite e cortiça. Aos 20 anos, em dezembro de 1859, ele, Moysés Bento Ruah, apaixonou-se e casou com Ester Abitbol.

Anos depois foram para Lisboa, acabando por residir no 4º andar direito do nº 6 da Rua Ivens, no Chiado, onde morava a filha. Um apartamento de 14 divisões que se tornou o ponto de encontro de uma das mais importantes famílias judaicas do país e com grande destaque na sociedade portuguesa.

Foi nesta espaçosa casa que viveu o prestigiado fotógrafo da família real, Joshua Benoliel, casado com Simi Ruah, filha de Moysés e Ester, e onde residiu também Joshua Ruah, o conhecido urologista que veio a ser o médico de Álvaro Cunhal e que liderou durante 18 anos a comunidade israelita em Portugal. Além disso, aquele 4º andar era o local onde, em festas ou outros eventos, se cruzavam vários membros desta família judia, como o otorrino Samuel Ruah, avô da atriz Daniela Ruah, que durante o Estado Novo privou com António de Oliveira Salazar.

A história dos Ruah está cheia de surpresas e de personagens fascinantes, resultado do casamento de Moysés e Ester e dos seus sete filhos. Abraão, Hassan, José, Isaac, Simi, Jacob e Samuel. Só estes dois últimos não tiveram descendentes, segundo o livro Genealogia Hebraica, de José Maria Abecassis.

A vida dos irmãos foi dividida entre Faro e Lisboa, pois uns permaneceram no Algarve e outros optaram por se estabelecer na capital. O mais velho, Abraão, casou com uma senhora da alta sociedade de Faro, Francisca Maria Assis, e ficaram com os três filhos pelo Sul. Foi o último judeu a ser enterrado, em 1932, no cemitério daquela cidade algarvia, que foi usado pela primeira vez pelos judeus em 1838, época em que a comunidade hebraica se instalou em força no país. (Em 2011, abriu-se uma exceção para enterrar neste cemitério Ralf Pinto, que promoveu o restauro do local.)

Depois de terem sido expulsos da Península Ibérica no século XV, e de terem emigrado para o Norte de África, muitos judeus regressaram a Portugal no século XIX. Entre eles estavam os Ruah, que foram dos primeiros a fixarem-se em Faro, após a abolição da Inquisição em 1821.

Nessa altura, integravam a comunidade judaica local, composta por 60 famílias que se dedicavam em grande parte ao comércio, tendo de dia para dia cada vez mais poder, fruto da capacidade financeira e do jeito para o negócio, o que era facilitado por muitos falarem cinco línguas.

 

Raquel Delmar e Isaac Bentes Ruah, bisavós de Daniela Ruah, com Joshua Beloniel, encostado à parede, Simi, em frente a Joshua, e a filha destes, Ester, mãe de Joshua Ruah.
Raquel Delmar e Isaac Bentes Ruah, bisavós de Daniela Ruah, com Joshua Beloniel, encostado à parede, Simi, em frente a Joshua, e a filha destes, Ester, mãe de Joshua Ruah.

Com os anos, os Ruah foram mudando para Lisboa. E quando, em 1932, Abraão Ruah morreu, restavam poucos judeus no Algarve: só o seu filho, José Ruah, permaneceu pelo Sul. Montou uma loja de velharias e, excêntrico, vivia de noite. Muitas vezes só abria o seu negócio à meia-noite. Será em honra dele, acreditam os seus descendentes, o nome dado a um café que ainda hoje existe em Faro – O Cantinho do Ruah, na Rua do Alportel. José acabou por vir para a capital quando já tinha mais de 80 anos, ficando próximo da família.

De todos os filhos de Moysés Ruah, o negociador de cortiça que andava de mula, Isaac Bentes Ruah foi o que mais herdou o talento para o negócio. Quando tinha pouco mais de 20 anos, foi para o Brasil trabalhar na recolha de borracha feita pelos índios que habitavam perto do rio Amazonas. Depois mudou-se para Manaus, onde se tornou dono de uma ourivesaria, passando a negociar com pedras preciosas, como rubis, diamantes, esmeraldas e safiras. Voltou para Faro, continuou no negócio e pouco depois foi a Tânger casar-se com Raquel Delmar, 17 anos mais nova. Foram os dois viver para Lisboa, sem sonhar que iriam começar uma família da qual faria parte um dos médicos mais prestigiados do país e próximo de António de Oliveira Salazar e uma atriz reconhecida internacionalmente.

Daniela Ruah é uma das bisnetas do vendedor de pedras preciosas. E o otorrino Samuel Ruah um dos três filhos de Isaac e Raquel. Nenhum quis seguir o negócio familiar e ele, Samuel, preferiu ser médico, em parte pelo facto de o seu irmão mais velho, Moisés, ter morrido de febre tifóide aos 17 anos, pouco antes de entrar em Medicina.

 

O médico Samuel Ruah, ao centro, com o filho Carlos Ruah, à esquerda, e o primo Joshua Ruah, à direita.
O médico Samuel Ruah, ao centro, com o filho Carlos Ruah, à esquerda, e o primo Joshua Ruah, à direita.

Samuel formou-se em 1944, quando tinha 24 anos, mas pouco depois ficou doente com tuberculose e teve de ser internado no sanatório da serra da Estrela, onde estava também internada, com a mesma doença, uma judia que conhecia do centro israelita, Ester Buzaglo. Apaixonaram-se e quando tiveram alta saíram e casaram-se em 1949. Durante anos, Samuel dedicou-se à profissão, sendo especialista ainda não tinha 27 anos. Foi médico do irmão do então cardeal-patriarca António Cerejeira e os dois passaram várias horas juntos no quarto do Hospital Dona Estefânia onde D. Manuel Cerejeira esteve internado vários meses. O cardeal sabia que Samuel era judeu, daí nunca lhe ter beijado a mão e o anel, como era costume.

Através de uma doente, que lhe pediu um favor, acabou por se aproximar também de António Oliveira Salazar. Maria Livia Nosolini, mulher do embaixador no Vaticano, amigo próximo do ditador, veio à consulta acompanhada de uma senhora mais velha e de uma criança, que suspeitavam ter problemas nos adenoides e queriam saber a opinião do médico. Mas o otorrino percebeu que a criança tinha problemas motores e outros e sugeriu que fosse vista por pedopsiquiatras. Descobriu pouco depois que a senhora mais velha era afinal Dona Maria, a governanta de Salazar, e a pedido deste último passou a coordenar tudo o que dizia respeito aos assuntos clínicos da criança. Foi por isso várias vezes à residência oficial do presidente do Conselho e foram muitas as conversas que mantiveram ao longo dos anos, tendo até trocado ideias sobre a Guerra do Sinai em 1967. A sua proximidade a Salazar terá sido um dos motivos que o levaram a ser alvo de processos no pós-25 de Abril. «Durante anos fui perseguido. Os radicais da altura atacaram-me por ter sido médico de doentes “fascistas”», contou Samuel Ruah num depoimento que fez a José Freire Antunes para o livro Os Judeus em Portugal. «Mas no fundo sentia que havia um certo antissemitismo contra um judeu que chegara a diretor dos hospitais, abrira um clínica e adquirira prestígio», dizia. Samuel Ruah, que morreu em janeiro passado, foi diretor de serviço de otorrinolaringologia do Hospital Dona Estefânia entre 1965 e 1990, data em que saiu por limite de idade.

Conseguiu modernizar o serviço e, para isso, segundo contou aos mais próximos, ficou horas a fio durante vários dias sentado na antecâmara do gabinete do então ministro da Saúde, para este o receber e o ajudar a lançar um novo edifício para o serviço. Dos seus cinco filhos, só Carlos sentiu a mesma vocação e optou pela carreira de otorrino. Mas, desiludido com Portugal, foi viver para os EUA, onde ficou nove anos e onde nasceu a sua filha mais velha, Daniela Ruah.

«O que é giro é que quando eu era mais novo o meu pai, Samuel, gostava imenso de ver comigo as séries policiais na televisão, como os Vingadores e depois, mais tarde, estávamos a ver uma série do mesmo género, mas com a Daniela a representar», conta Carlos Ruah à NOTÍCIAS MAGAZINE. «O meu pai era o fã número um da Daniela. Não perdia um episódio e guardava tudo o que saía escrito sobre ela.»

A filha, garante, sempre teve veia artística. Daniela vive nos EUA e é hoje a estrela da série televisiva Investigação Criminal – Los Angeles. Casou-se com um duplo norte-americano e tem um filho, River Isaac, a quem tenta passar algumas das tradições judaicas, especialmente a celebração «de algumas datas mais importantes», diz. É o caso da Páscoa, que se festeja durante oito dias, período em que não se pode comer nada fermentado, usando-se para isso o pão ázimo. Nessa altura, à mesa, o patriarca deve contar a história sobre o êxodo do Egito, lendo um livro chamado Hagadá.

Daniela sempre sonhou ser atriz. Na sua infância, recorda, em casa dos Ruah, fazia teatrinhos para a família ver: «Preparava um “espetáculo” na sala com os meus primos e obrigava os tios todos a ver.» Conviveu com primos e tios da família do avô paterno, Samuel Ruah, já a família do avô materno, Max Korn, morreu quase toda no Holocasto. Quando era mais nova frequentava o centro israelita e nunca escondeu que era judia. Nas gravações das novelas percebiam que era essa a sua religião quanto tirava o fiambre das sanduíches, por não poder comer porco. E, por coincidência, o primeiro papel que teve, aos 16 anos, na novela Jardins Proibidos, da TVI, era o de uma jovem judia. Foi depois estudar para Londres, regressou a Portugal, mas em 2007 foi de vez para os EUA . Ser atriz, acredita, até é capaz de estar no seu ADN: «Sempre ouvi histórias das peças de teatro em que os meus pais e avós participavam em novos. Uma avó fez de monstro em A Bela e o Monstro, cheguei a ver fotos. A outra avó foi chamada para ir para Hollywood por um produtor americano, quando tinha 14 anos. A minha bisavó não deixou!» E até o pai «cantou ópera com uma conhecida professora, até entrar para a faculdade».

Muitos dos Ruah casaram-se entre si, com primos. Hassan, outro dos sete filhos de Moysés, o comerciante que andava de mula pelo Alentejo, escolheu como noiva a sua prima Sol Benchayal, com quem teve uma rapariga e dois rapazes. Um deles, Judah Ruah, um engenheiro eletrotécnico, acabou por, sem querer, deixar a sua marca na história religiosa portuguesa. Foi ele quem acompanhou o então conceituado jornalista Avelino de Almeida, do jornal O Século, à Cova da Iria para fazer a reportagem sobre o milagre de Fátima, a 13 de outubro de 1917. Isto porque o seu tio Joshua Benoliel, fotógrafo daquele jornal, não pôde ir cobrir o evento e pediu-lhe que o substituísse. Por isso, foi Judah quem acabou por captar as imagens que no dia 15 de outubro saíram nas páginas do diário.

Judah Ruah, um engenheiro eletrotécnico, acabou por, sem querer, deixar a sua marca na história religiosa portuguesa. Foi ele quem acompanhou o então conceituado jornalista Avelino de Almeida, do jornal O Século, à Cova da Iria para fazer a reportagem sobre o milagre de Fátima, a 13 de outubro de 1917. Isto porque o seu tio Joshua Benoliel, fotógrafo daquele jornal, não pôde ir cobrir o evento e pediu-lhe que o substituísse. Por isso, foi Judah quem acabou por captar as imagens que no dia 15 de outubro saíram nas páginas do diário.

«Tem graça ter sido um judeu a fotografar o milagre de Fátima», diz Joshua Ruah, que foi líder da comunidade israelita e descende de um outro filho de Moysés, o vendedor de cortiça: José Bento Ruah. Este chegou a ter um café em Faro, mas em 1925, depois da morte acidental da filha aos 6 anos, mudou-se para São Tomé e Príncipe, onde comprou uma roça de café. «O meu avô foi viver para África, mas o meu pai, também chamado Moisés, ficou em Portugal e casou com uma prima direita, a Ester, filha da minha tia Simi. Ou seja, o meu avô paterno (José Bento Ruah) e a minha avó materna (Simi Ruah Benodiel) eram irmãos», explica Joshua, sem lhe fazer qualquer confusão: «É normal os judeus, e os Ruah, casarem-se uns com os outros.» Joshua Ruah nasceu em 1940 e cresceu na casa da Rua Ivens, em Lisboa, e, tal como o pai, seguiu a carreira de urologista.

Aliás, os dois chegaram a ter um consultório juntos. Licenciou-se em Medicina em 1967, na Faculdade da Universidade Clássica de Lisboa, e rapidamente tornou-se um dos médicos mais conceituados do país. Foi ele quem seguiu Álvaro Cunhal nos últimos 14 anos e meio de vida do ex-líder comunista. Estava no Hospital do Barreiro quando um dia lhe ligou um dos seus doentes, Octávio Pato, também do PCP, a perguntar se podia ir ver o seu camarada. «A partir daí, passei a tratar o Dr. Cunhal», conta Joshua Ruah, recordando: «Era uma pessoa espantosa. Além de uma enorme capacidade intelectual, era humilde e tinha um humor fora de série. Em privado, não tinha nada que ver com aquela imagem dura da política.» Conversavam sobre tudo e ficaram amigos «Um dia estava no cinema com os meus netos e ele ligou-me. Estava aflito e sozinho em casa e pediu que lá fosse. Peguei nos miúdos e fomos todos ter com o Dr. Cunhal. Os meus netos ficaram fascinados.»

Joshua chegou a ser convidado para aderir ao PCP, em 1974, mas recusou e optou por ser antes militante do PS, em 1975. Foi candidato pelo partido em autárquicas, legislativas e ao Parlamento Europeu, mas sempre em lugares não elegíveis. E mais recentemente foi um dos promotores da candidatura de Maria de Belém para a Presidência da República. Pelo meio, em 1986, entrou na maçonaria pela mão do amigo José Vacondeus. Primeiro esteve na Grande Loja Legal de Portugal e depois no Grande Oriente Lusitano, onde foi um dos fundadores de uma das mais poderosas lojas maçónicas do país, a Universallis. Também a sua mulher, Mery Ruah, com quem se casou em 1963, entrou na maçonaria feminina e, entre Setembro de 2012 e setembro de 2015, foi a líder da Grande Loja Feminina de Portugal, obediência exclusiva para mulheres.

Quanto se tornou maçon, Joshua Ruah liderava a comunidade israelita de Lisboa. Integrou a direção como vogal em 1963, mas em dezembro de 1978 tornou-se presidente num primeiro período até 1992. Depois, em 1995, voltou a comandar os judeus portugueses até 2001. Durante os seus mandatos teve de enfrentar a polémica nacional em torno da primeira visita de Yasser Arafat a Portugal, o receio causado com o atentado contra o embaixador israelita em Lisboa, reivindicado por extremistas palestinianos, e a questão do ouro nazi, tendo feito parte de uma comissão de inquérito nomeada por António Guterres.

Hoje continua ligado à Comunidade Israelita, sendo presidente da assembleia geral, e frequenta a sinagoga, fundada em 1904, onde há cerimónias à sexta à noite ou ao sábado de manhã. E na sua residência mantém alguns hábitos judaicos, como o de receber sempre os filhos à sexta-feira à noite. A refeição começa com uma «bênção ao vinho e ao pão».

Estas tradições foram-lhe transmitidas pelos pais e avós, que naquele apartamento da Rua Ivens se juntavam todos ao jantar. A casa era do seu avô Joshua Benoliel, o famoso fotógrafo português, e da sua avó Simi, a única filha mulher de Moysés, o negociador de cortiça. Joshua e Simi casaram-se em 1899. Ele tinha 26 anos e ela 21. Joshua era despachante de Alfândega, mas um ano antes do seu casamento conseguiu publicar as suas primeiras fotografias na revista Tiro Civil – retratavam as «Regatas do Centenário», que comemoravam os 400 anos da viagem de Vasco da Gama à Índia. Mas o talento fez que poucos anos depois deixasse a sua anterior profissão para se dedicar em exclusivo à fotografia.

 

Quando morreu em 1932, com 59 anos, na casa da Rua Ivens ficaram empilhados mais de 50 mil negativos das suas fotos. Deixou-os aos seus filhos, Judah, também fotógrafo e fundador do jornal Diário Popular; David, um dos quatro primeiros anestesistas portugueses; e Ester, que gostava de conviver, resultado dos anos em que o pai tornou a casa no Chiado num centro de encontro familiar e intelectual.

 

Leah Ruah, Vasco Ruah, Carlos Ruah, Simi Ruah, Joshua Ruah e Luna Ruah Benoliel juntaram perto da mítica casa da Rua Ivens, no Chiado, para a Notícias Magazine. (Fotografia de Gerardo Santos/Global Imagens)
Leah Ruah, Vasco Ruah, Carlos Ruah, Simi Ruah, Joshua Ruah e Luna Ruah Benoliel juntaram perto da mítica casa da Rua Ivens, no Chiado, para a Notícias Magazine. (Fotografia de Gerardo Santos/Global Imagens)

E hoje, quando os Ruah mais velhos se juntam, muitas das recordações que partilham são precisamente daquele apartamento. «As festas eram todas nessa casa», lembra Luna Ruah Benoliel, filha de David e neta do fotógrafo. «Sim, sim, e muitos dos casamentos foram feitos lá», acrescenta Joshua Ruah, que, apontando para outra sua prima direita, Lea Ruah, filha de Salomão (irmão do seu pai), recorda: «Tu até nasceste lá em casa.» Estão todos juntos a almoçar numa quarta-feira do passado mês de março, e não conseguem parar de rir das brincadeiras que o clã Ruah fazia no Chiado, em especial Joshua e o seu primo direito, Vasco, que ficou a morar também na casa da Rua Ivens, quando o seu pai foi para África.

Já da geração mais nova, muitos dos Ruah estão agora a viver no estrangeiro, como Daniela, espalhando pelo mundo o nome de família, que em hebraico significa «vento». A atriz admite que fica contente por poder «propagar a imagem positiva» do apelido Ruah: «Tenho orgulho no meu nome.»

 

Joshua Beloniel é considerado o pai do fotojornalismo português. Casou com Simi Bento Ruah e é o avô do médico Joshua Ruah.
Joshua Beloniel é considerado o pai do fotojornalismo português. Casou com Simi Bento Ruah e é o avô do médico Joshua Ruah.

JOSHUA BENOLIEL
«É PARA O SÉCULO. É PARA O SÉCULO.»
Quando nas ruas de Lisboa se ouvia a frase «É para O Século. É para O Século», todos sabiam que andava por ali Joshua Benoliel, o fotógrafo do matutino, para o qual começou a trabalhar em 1903. Fez dezenas de reportagens fotográficas e é considerado o pai do fotojornalismo português. Com a sua máquina registou os principais acontecimentos da época: as viagens do rei D. Carlos e de D. Manuel ao estrangeiro, a revolução de 1910, as revoltas monárquicas, a partida, em 1917, do Corpo Expedicionário Português para a Flandres e a vida das tropas lusas na I Guerra Mundial. «Só falhou duas fotos: a do milagre de Fátima, pois pediu a um sobrinho para ir no seu lugar por estar doente, e a do assassínio do rei D. Carlos», diz o neto, Joshua Ruah, recordando o que se passou no dia em que o monarca foi morto. «O meu avô estava no Terreiro do Paço a fotografar o desembarque da família real, que regressava de Vila Viçosa. Sabendo que iam para as Necessidades, meteu-se na tipóia para lá estar antes e fotografá-los a chegar. Mas, na esquina, quase ao pé do destino, o rei e o príncipe herdeiro foram mortos com tiros.»

 

A atriz Daniela Ruah, fotografada por Gerardo Santos/Global Imagens
Atriz Daniela Ruah, fotografada por Gerardo Santos/Global Imagens

DANIELA RUAH
A AGENTE KENSI BLYE COMEÇOU NUMA NOVELA DA TVI
Quando Daniela Ruah tinha 2 anos, os pais perceberam que tinha jeito para ser artista. «Sempre que a mãe dela começava a bater ovos numa tigela ela, com o som que ouvia, começava logo a dançar. Nós achávamos imensa graça», conta o pai da atriz, Carlos Ruah. Daniela, que cresceu nos EUA, onde esteve até aos 6 anos, com os dois pais médicos, começou a aprender sapateado e depois em Portugal ainda teve aulas de ballet. «Mas sempre nos disse que o que queria era representar», conta Carlos Ruah. Em 2000 estreou-se como a jovem Sara, numa novela da TVI, mas nove anos depois já estava nos EUA, tornando-se a agente especial Kensi Blye na série policial Investigação Criminal Los Angeles, da CBS. Pelo meio fez alguns papéis em filmes, como Red Tails, de George Lucas. «Tenho sorte que o meu trabalho tenha tido visibilidade mundial», diz Daniela Ruah.