O surto de microcefalia em bebés nascidos no Brasil abriu espaço aos habituais teóricos da conspiração, ansiosos por arranjar um culpado que sirva as suas crenças. Os militantes antivacinas concluíram, sem surpresa, que o problema é uma vacina. Ainda os ouvirei dizer que os acidentes da Operação Páscoa da GNR são causados pelas picas nos braços dos automobilistas. A acusação desta vez recai sobre a vacina contra tétano, difteria e tosse convulsa. Hoje em dia quando morre um bebé em sofrimento extremo com tosse convulsa a causa está bem identificada e normalmente é o movimento antivacinas. Os opositores aos transgénicos concluíram, também sem surpresa, que o problema são mosquitos geneticamente modificados, produzidos por uma empresa inglesa chamada Oxitec. Neste caso há uma clara questão de género: os mosquitos OGM são todos machos e a sua descendência não é viável. Já os mosquitos que picam e transmitem doenças são todos fêmeas. Os opositores a coisas acabadas em «ida» apontam o dedo ao larvicida piriproxifeno, que interfere com uma hormona de crescimento dos insetos e das aranhas, impedindo as larvas de chegarem ao estado adulto. Está bem estudado, é usado em vários países desde 1996 e nenhuma relação tem com qualquer hormona de crescimento humana. Pela minha parte, acho que a microcefalia é causada pelo som demasiado alto da televisão do meu vizinho do lado.
O que sabemos? Temos a certeza de que o vírus zika, transmitido pelos mosquitos Aedes aegypti, causa microcefalia? Num estudo de casos com 35 bebés nascidos no Brasil com microcefalia, chegou-se à conclusão de que todas as mães tinham estado em áreas afetadas pelo zika durante a gravidez. O vírus foi encontrado em dois recém-nascidos que morreram com microcefalia e também em dois fetos. As quatro mães tiverem sintomas da infeção. São casos semelhante aos de uma eslovena que passou parte da gravidez no Brasil. Isto chega para concluir que o zika causa microcefalia? Não. São necessários estudos epidemiológicos bem mais robustos. Mas de momento é razoável assumir que é bastante provável, a menos que surjam provas convincentes do contrário. E claro que as dúvidas que persistem não apoiam outras hipóteses mirabolantes. A resposta não estará no apelo à irracionalidade, mas na ciência. Não são as vacinas que causam microcefalia, é necessária uma vacina para o zika. E os meios de controlo de mosquitos podem fazer parte da solução. Isso e mangas compridas.
Periscópio
ESPINAFRES & DESPORTO
É o nome da exposição interativa recentemente inaugurada no Pavilhão do Conhecimento (www.pavconhecimento.pt), em Lisboa, sobre estilo de vida saudável. Centrada na alimentação e na atividade física, nela podemos fazer a travessia cronometrada de uma parede de escalada e outros testes de aptidão física, medir a tensão arterial, o perímetro abdominal e aprender a calcular o índice de massa corporal. Ficamos também a saber mais acerca dos alimentos e da energia que eles contêm. E sobre nós. Temos uma alimentação adequada à nossa atividade física? Estamos em forma? Através de um razoável conjunto de testes descobrimos muito sobre essas questões. Ou seja, sobre nós.
[Publicado originalmente na edição de 28 de fevereiro de 2016]
