Vacinar não é uma decisão sua

Notícias Magazine

Num artigo publicado em 1888 na revista Scientific American conta-se que em Zurique a vacina contra a varíola foi obrigatória por lei durante vários anos. Assim, em 1882, não houve um único caso na cidade. Mas este sucesso foi aproveitado pelos opositores às vacinas para dizerem que a vacina não fazia falta nenhuma e conseguiram revogar a sua obrigatoriedade logo em 1883. Nos anos seguintes, as mortes por varíola aumentaram de modo consistente. Os movimentos antivacinas não são uma coisa moderna «new-age-quantum-cool», são tão antigos quanto as vacinas e os seus trágicos resultados continuam os mesmos.

A varíola é uma doença muito grave, que foi considerada erradicada pela Organização Mundial de Saúde em 1979, graças a programas intensivos de vacinação. Claro que não há nenhum tratamento médico isento de riscos, mas os riscos das vacinas face à sua eficácia são bem avaliados. No entanto, hoje, alguns pais criados à sombra das vacinas estão mais preocupados com as vacinas do que com as doenças contagiosas. E essa preocupação assenta em duas ideias. A primeira é a de que as vacinas são desnecessárias, porque pode adquirir-se imunidade de forma natural, contraindo as doenças. Como é evidente, há doenças contagiosas que podem ter consequências graves e é absolutamente preferível adquirir imunidade sem nunca as ter tido. A segunda é a de que as vacinas causam doenças, nomeadamente autismo. Esta paranóia tem o seu expoente máximo numa fraude científica protagonizada pelo ex-médico e ex-investigador inglês Andrew Wakefield, que falsificou dados e registos médicos, a soldo de um escritório de advogados que estava a processar os fabricantes de vacinas. Em 2012, a revista Time incluiu Wakefield na lista das seis maiores fraudes científicas de sempre, o que não demoveu o exército antivacinas, antes reforçou a sua teoria da conspiração.

Vacinar não é uma mera escolha pessoal que os outros devem respeitar. Os recém-nascidos não podem ser vacinados contra a tosse convulsa e a sua segurança depende de as pessoas à sua volta estarem vacinadas. Nalguns casos, os doentes imunocomprometidos também não podem ser vacinados. Nenhuma vacina é cem por cento eficaz e, apesar de pouco provável, uma pessoa vacinada pode ser contagiada. A proteção depende de elevadas taxas de vacinação. Todos beneficiamos dessa imunidade de grupo e devemos contribuir para ela. Recusar as vacinas e ficar à mama das vacinas dos outros é uma atitude egoísta, antissocial e irresponsável.

Periscópio

É POR O CÉU SER AZUL QUE O MAR É AZUL?
«Não, não é por o céu ser azul. Se encheres um copo com água do mar, quer a tires do Pacífico sob um sol de chumbo, quer a tires da Mancha num dia de chuva, a água é tão transparente como o copo. Por mais que a exponhas (é em vão que a expões) a um céu azul, continuará incolor.» Assim contam o astrofísico Hubert Reeves e o oceanógrafo Yves Cientista Lancelot no livro O Mar Explicado aos Nossos Netos, editado este mês na coleção Gradiva Júnior. Uma história feita de perguntas e respostas em que ficamos a saber que a água do mar veio do espaço, possivelmente de um cometa, e que por isso andamos a mergulhar na água dos cometas. E porque podemos ter duas marés por dia, apesar de a Lua só passar uma vez.

[Publicado originalmente na edição de 27 de março de 2016]