Ricardo, o ativista

Denunciar os abusos de que é vítima a população prisional portuguesa. Ricardo Loureiro, 29 anos, cumpre este trabalho há dez anos. «Em Portugal há violência de estado», acusa. Os relatórios da Amnistia Internacional dão-lhe razão.

Tem 29 anos, é sociólogo, investigador no Observatório Europeu de Prisões e na Associação contra a Exclusão pelo Desenvolvimento, que trabalha na luta «contra os crimes perpetrados a coberto do estado contra os cidadãos que estão detidos». Quando alguém marca o número da linha SOS Prisões (925 818 236) é muito provável que seja Ricardo Loureiro a atender. Só em 2014 tiveram 196 ofícios, que podem ir de casos como o impedimento ilegítimo de uma visita até à tortura. «Há em Portugal uma política de estado que é violenta e tolera o abuso dos direitos daqueles cidadãos. É uma visão de castigo, não é uma visão de reinserção.»

O relatório de Direitos Humanos que a Amnistia Internacional organiza todos os anos coloca constantemente o abuso prisional como uma das principais chagas do país no que toca à proteção dos cidadãos. Na edição de 2014 constavam relatos de tortura na prisão de Paços de Ferreira e de uso excessivo de força em Lisboa e Santa Cruz do Bispo. Acrescente-se a sobrelotação, que cria problemas graves de saúde e habitabilidade na população prisional. Ricardo encaminha os processos para a Provedoria de Justiça, Inspeção-Geral dos Serviços de Justiça, Serviço de Auditoria e Justiça da Direção-Geral dos Serviços Prisionais. Alguns casos nunca avançam, «o preso desiste da queixa por não se sentir protegido». Outros ficam resolvidos.

Ricardo nasceu em Alfama, Lisboa, cresceu no Seixal, habituou-se cedo a conviver com o crime. «Quase todos os meus amigos tinham familiares presos. Fui percebendo que há uma criminalização da pobreza, porque é aos grupos mais desfavorecidos que é retirado primeiro a educação e o emprego, criando um ciclo em que muito dificilmente se escapa.» Quando entrou na faculdade, conheceu um dos fundadores do SOS Prisões e resolveu oferecer-se como voluntário. Foi-se empenhando, porque sentia que o Estado permitia a uns cidadãos e vedava a outros o acesso à democracia. «É contra esta falta de humanidade que temos de lutar.»