Quer testar os limites do seu casamento? Faça um filho. Melhor, faça dois.

Notícias Magazine

TAMPA DA SANITA PARA CIMA? Pratos sujos durante horas na bancada da cozinha? Gavetas desarrumadas? Roupa e sapatos espalhados pela casa? O comando da te­levisão que nunca aparece? Caixas com restos de comi­da no frigorífico até ganhar bolor? Ou então o contrário de tudo isto: os tupperwares organizados por tamanho e cor; os cabides todos iguais no roupeiro, virados para o mesmo lado; os iogurtes separados por sabor e prazo de validade; o stock de champô armazenado para um even­tual ataque nuclear; os papéis enfiados no lixo se forem esquecidos durante um par de horas em cima da mesa da sala… Esqueçam tudo isto. Na vida a dois, na gestão do espaço comum, na habituação a novas realidades, no­vos hábitos e novas manias difíceis de perceber na outra pessoa, nada disto importa quando comparado com o derradeiro teste para a vida em casal: filhos!

SÃO O MELHOR DO MUNDO, e repensamos tudo, e mu­damos de hábitos e passamos a dar mais valor a outras coisas e entendemos finalmente o verdadeiro sentido da vida e dos genes e blá-blá-blá… mas, sejamos since­ros, os filhos dão cabo dos casamentos. Rai’s partam a canalhada, que tem o condão de encontrar os pontos mais frágeis da malha que tecemos a dois – e é precisa­mente aí que resolvem abancar com as fraldas cheias e os babetes sujos, a fazer peso onde dói mais, para nos obrigar a reforçar a fibra da relação ou a romper o que tem de ser rompido. A culpa não é delas, coitadinhas das criancinhas fofinhas e lindinhas, benza–as Deus. A responsabilidade é nos­sa, que até suspeitávamos, mas não tínhamos a certeza, de que a vida ia mesmo levar uma revira­volta. E de que maneira!

VOCÊS ATÉ PODEM TER UMA REDE DE APOIO de avós, tias, vizinhos, padrinhos e baby-sitters. Mas eles não vos substituem sempre na mudanças de fraldas, na limpeza de ranhos, na preparação do leite ou das refeições, nos banhos, nas brincadeiras e nas massagens às vossas cos­tas doridas de tanto colo que têm de dar. E quando pen­sam que já estão a conseguir dominar a nova realidade, quando o sexo regressa (pelo menos a vontade, porque o cansaço é outra conversa), quando se habituam à ideia de deixar de ter vida própria durante uns tempos, quan­do param de adormecer assim que se sentam no sofá, quando se mentalizam (e relaxam) de que, um dia, a ca­sa deixará de estar de pantanas… quando pensam que as coisas começam a entrar nos eixos, chegam os novos níveis de dificuldade: as viroses, porque as crianças vão para a creche (verdadeiros infetários!), e os irmãos, por­que achamos que o pior já passou. Erro!

AS CÓLICAS ATÉ AOS 3 MESES são chatas, mas pas­sam. A desorganização nos meses de licença parental acaba, quando regressamos à vida profissional e conse­guimos finalmente ter tempo para tomar banho. A fase dos dentes a nascer, com dores e diarreias, também pas­sa. Mas as viroses… as putas das viroses aparecem quan­do menos se espera e espetam-vos com uma chapada de febre nas crianças, naqueles dias em que vocês têm o trabalho todo engatilhado. E lá têm vocês de se coor­denar um com o outro para ver quem fica em casa com a criança. Com 37 graus fica fofinha e pede colo e dese­nhos animados. Com 38 graus fica combalida. Com 39 fica prostrada e irritada. Com 40 já não sabemos o que fazer à vida. E ainda vamos só no segundo dia da viro­se. E o cansaço regressa. E, com ele, a falta de paciência, a cabeça quente, a resposta pronta quando devíamos fi­car calados. Já os irmãos… os irmãos são outra conver­sa. Os segundos filhos dão-nos mais experiência. E resi­liência. E novos desafios… Ficamos mais práticos, já não fervemos as chupetas todas, já somos mais desenrasca­dos nos banhos, Mas ficamos mais cansados. Estafados. Irritados. E lá vamos nós outra vez…

[Publicado originalmente na edição de 11 de janeiro de 2015]