As nossas apostas

Pedimos a uma dúzia de personalidades com créditos firmados nas suas áreas para fazerem as suas apostas para o próximo ano. Quem são os novos talentos que vão agora ocupar a cadeira de destaque?

Do cinema à música, da literatura ao design, do desporto à moda, da gastronomia à ciência, esta é a nossa seleção nacional de esperanças.

Cinema
VICTORIA GUERRA

A ESCOLHA DE TIAGO R. SANTOS
Guionista, assinou os argumentos de filmes como Call Girl, A Bela e o Paparazzo, Os Gatos Não Têm Vertigens, a renovada versão d’ O Leão da Estrela ou o recém-estreado Amor Impossível. Também escreveu para as séries Conta-me Como Foi e Liberdade 21. A Velocidade dos Objetos Metálicos foi o seu romance de estreia, publicado pelo Clube do Autor em 2013.

Há um eterno debate entre atores. Os que fazem cinema e teatro não gostam de fazer televisão, às vezes consideram o trabalho de caixa preta – novelas, séries – menor que o do palco ou de película. «Eu gosto é de representar», atira Victoria Guerra, 26 anos, «seja em que formato for». Podemos começar a conversa por aqui, pelo registo desempoeirado da atriz. Dela, o argumentista Tiago R. Santos diz que é «um prodígio da expressão», o que não é pouco. Mas a rapariga não deixa acumular peneiras. Começou nos Morangos com Açúcar, e tem orgulho nisso, «porque aprendi tanto». Fez novelas e este ano fez cinema que se fartou. «E em 2016 vou voltar a fazer uma novela para a SIC.»

Na véspera de natal Victoria encheu os cartazes dos cinemas como protagonista de Amor Impossível, de António-Pedro Vasconcelos. No início do mês apareceu ao lado de Sabine Azéma no filme Cosmos, do polaco Andrzej Zulawski, que venceu o prémio de melhor realizador em Locarno. Mas 2016 vai ser seguramente o ano de Victoria. Para já porque a atriz acabou de chegar de Nova Iorque, onde rodou Wilde Weddings ao lado de John Malkovich e Glenn Close. Depois porque também é para o ano que estreia The Body Artist, romance de Don DeLillo adaptado pelo francês Benoît Jacquot, onde a portuguesa ocupa outra vez lugar central na tela.

Algarvia de Loulé, Victoria nunca pensou que ia desaguar na representação. Das artes a sua preferida foi sempre a sétima – lembra-se dos dias em que se punha com a mãe a caminho de Albufeira para ver um filme e marchavam dois, às vezes três. «E depois aconteceu tudo por acaso.» Participou num casting mais por desafio do que por vontade, foi ganhando gosto de encarnar personagens e hoje não pode viver sem elas. «Quando represento, tenho de perceber quem é a pessoa que eu tenho de ser. Por mais pequeno que seja o papel, tenho de reconstituir a vida inteira dela, de onde veio e para onde vai.» Como se em cada minuto de tela estivesse uma vida inteira. RICARDO J. RODRIGUES

NM1231_ApostaGoncalo

Ambiente
GONÇALO CURVEIRA SANTOS

A ESCOLHA DE FRANCISCO PETRUCCI-FONSECA
Professor de biologia e investigador na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Fundou, em 1985, o Grupo Lobo, para fomentar o estudo e a conservação do maior e mais ameaçado dos predadores portugueses. Dois anos depois, criou o Centro de Recuperação do Lobo Ibérico, para assegurar um ambiente digno em cativeiro para os animais que não podem voltar ao estado selvagem.

Se é comum o discurso que apela à utilidade da investigação científica, então Gonçalo Curveira Santos tem um trunfo na mão. Francisco Petrucci-Fonseca, o fundador do grupo Lobo, aponta-o como a revelação a que devemos estar atentos no próximo ano na área de ambiente. «Está a desenvolver estudos que podem revelar-se de grande impacto nas políticas de ecologia e conservação», diz o também professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. «Em Portugal e no Brasil, mas virtualmente replicável a todas as áreas do mundo.»

A tese de doutoramento do biólogo de 25 anos ocorre em duas paisagens, entre o montado alentejano e as paisagens rurais do estado brasileiro de São Paulo. «A agricultura veio mudar as paisagens, mas isso não quer necessariamente dizer que tenha mudado a biodiversidade. Então estou a tentar perceber como os carnívoros de médio porte ocupam as zonas humanizadas.» No caso português, o foco era em raposas, texugos, gatos-ferais e ginetas. No outro lado do Atlântico já vai encontrar pumas ou jaguares. «Através de câmaras e coleiras GPS, vou monitorizar estas áreas para como os animais as ocupam.» As primeiras conclusões apontam alguns sentidos surpreendentes. Há casos em que a humanização da paisagem reduz a competição entre carnívoros, permitindo a coexistência de todos. Pode até haver benefícios para as duas populações, humana e animal. Os carnívoros que estabilizam a cadeia alimentar, controlam as doenças e permitem uma regulação mais eficiente dos ciclos agrícolas, mas os humanos que criam as condições para uma interação eficiente entre os bichos.

Estes estudos abrem toda uma nova perspetiva sobre a forma como se administra o território. «Até aqui, pensávamos em zonas protegidas e no resto, mas podemos ter uma nova gestão dos terrenos, adequada a potenciar a biodiversidade de cada zona.» É que as regras com que os governos hoje legislam não são necessariamente as mais indicadas. «Há um bom exemplo para explicar isto na Austrália. Face a uma praga de coelhos, foram introduzidos gatos e raposas. O problema é que eles não fizeram caça aos coelhos mas às espécies endémicas, já ameaçadas.» O conhecimento adequado, afinal, é o melhor amigo da conservação da Natureza. RICARDO J. RODRIGUES

NM1231_ApostaBruno

Gastronomia
BRUNO ROCHA

A ESCOLHA DE LUÍS BAENA
É um dos mais experientes chefs portugueses, e um dos pioneiros da alta cozinha no país. Trabalhou nalguns dos melhores hotéis do mundo, abriu restaurantes como a vanguardista Casa de Catralvos, a Penha Longa ou o Manifesto, passou grandes temporadas em Londres, Hong Kong e Japão. É consultor da cadeia Tivoli.

O melhor conceito para definir a cozinha de Bruno Rocha, 37 anos, pode muito bem ser o de gastronomia em viagem. Porque é aos desvios de rota que o chef vai buscar inspiração – e tem-nos tido em quantidades massivas. A começar pelo sítio onde vive. É um algarvio que nasceu em Lisboa, ou se calhar um lisboeta que se fixou no Algarve. E agora, que se afirmou nas cozinhas do Sul do país, está prestes a voltar à capital. Não diz onde, é quase segredo de estado, mas o novo ciclo vai colocá-lo debaixo dos holofotes.

Luís Baena aposta nele para 2016. «Esteve muito tempo escondido no Algarve, mas tem um talento impressionante e estou certo de que este vai ser o ano dele.» Até porque os dois conhecem-se bem, viajaram por meio mundo a fazer show-cookings e mostras gastronómicas, podem ter estilos diferentes mas há raízes que são as mesmas. «A gastronomia que pratico é quase um tripé», diz Bruno. «Tenho a raiz da comida portuguesa, mas tento aplicar-lhe o rigor francês e muita técnica asiática.»

A cozinha foi um acaso que se tornou paixão. Aos 18 anos, com o 12º ano feito, pensou estudar jornalismo e depois decidiu voltar atrás três anos, para fazer um curso profissional de cozinha na Escola de Hotelaria de Faro. «Tinha uma turma de grande qualidade, éramos competitivos e puxávamos uns pelos outros.» Então decidiu que era mesmo isto que queria. Passou um ano no Sheraton e oito no Vila Vita, onde viu Hans Neuner ganhar a primeira estrela Michelin (hoje tem duas) para o restaurante algarvio Ocean. «Depois era altura de me testar sozinho ao leme.» Há seis anos, mudou-se para o Tivoli de Vilamoura. «Passei dois anos a testar e outros quatro a construir uma cozinha de referência.» Sobretudo no restaurante Emo, que conquistou quatro garfos de ouro consecutivos do roteiro Boa Cama Boa Mesa. «Quando decidi entrar no curso, virei-me para a minha mulher e disse-lhe: um dia ainda me vais ver nas revistas.» Já está. RICARDO J. RODRIGUES.

NM1231_ApostaDaniela

Moda
DANIELA HANGANU

A ESCOLHA DE CARLOS RAMOS
Tirou as suas primeiras fotos aos 15 anos, com uma Praktica TL5 que o pai lhe ofereceu. Hoje tem 53 anos, mais de três décadas de carreira e uma Nikon F3X com quase dois milhões de disparos que fizeram dele – ainda fazem – um dos fotógrafos de moda portugueses mais conceituados da atualidade. Não há modelo que se preze que não conheça o estúdio de Carlos Ramos no Largo do Carmo, em Lisboa.

Tem a fama – e o proveito – de ser um dos novos talentos da nossa praça, toda ela olhos verdes de bambi, pernas intermináveis, cabelo louro a escorrer-lhe pelas costas, o rosto rosado de um querubim. Aos 18 anos, Daniela Hanganu parece simultaneamente uma fada diáfana e uma mulher fatal. Passou o ano a internacionalizar a carreira, trabalhando para casas como a Dior, Yves Saint Laurent ou Louis Vuitton, e a desfilar para a Chanel ao lado das modelos Joan Smalls e Kendal Jenner, suas heroínas. O estilista Karl Lagerfeld disse-lhe que é muito bonita, a roupa assenta-lhe bem. Mas nem assim a jovem se deixa deslumbrar: «O previsível na vida de um manequim é o imprevisível. Vou continuar a esforçar-me para agarrar as oportunidades que a sorte e o trabalho me proporcionarem.» O fotógrafo Carlos Ramos acredita que uma combinação assim tão rara de jeito e tino só pode dar bons frutos.

Foi aos 5 anos que Daniela chegou a Portugal vinda da Moldávia, os pais a desejarem uma vida melhor para as duas filhas. «Era para ser só uns meses, para o meu pai ganhar o suficiente para terminar o curso de direito. Fomos ficando e tive sempre esse exemplo a incentivar-me nos estudos», explica a manequim da Central Models, a tirar também o curso de publicidade e marketing na Escola Superior de Comunicação Social, em Lisboa, para um dia gerir a sua própria empresa no ramo. «Sempre disse que queria ser estrela de Hollywood, mas apaixonei-me pela moda aos 13 anos.» Uma amiga da mãe estava a tirar um curso com o maquilhador holandês Anton Beil e levava-a, porque precisava de alguém em quem treinar as técnicas. Beil achou que tinha tudo para ser manequim. «Estou a viver um sonho, mas o maior seria trabalhar com a Victoria’s Secrets como a Sara Sampaio, o meu maior modelo a seguir. Chegou onde nenhuma portuguesa foi antes. É extraordinária.» Daniela Hanganu também. ANA PAGO

NM1231_ApostaAndre

Turismo
ANDRÉ RAMOS

A ESCOLHA DE JOÃO COTRIM DE FIGUEIREDO
Formado em Economia na britânica London School of Economics, com um MBA pela Universidade Nova de Lisboa, foi presidente da comissão executiva da Nutricafés e da Compal entre 2005 e 2006. Foi ainda diretor-geral da TVI (em abril de 2010), além de administrador e acionista da Jason Associates e da Faber Ventures. Tem 54 anos e está cansado de ouvir falar dos turistas no país como um problema.

Todas as vezes que pesquisava um destino de férias, perdido a ler blogues e sites para ver o que lhe convinha, André Ramos sentia uma espécie de aviso interior, um sinal de que havia ali trabalho a fazer. A oferta de viagens no mercado resumia-se a cidades que estivessem na moda ou tivessem aeroporto. Qualquer experiência ímpar além disso, como um fim de semana num iglu na Lapónia, a admirar a aurora boreal, já forçava a pessoa a esfalfar-se a fazer ela própria o trabalho de casa, inspirando-se noutros aventureiros com igual espírito de missão. Tantas horas perdeu que em 2014, juntamente com o irmão mais novo, Gustavo, criou o Tripaya, o primeiro site de viagens que baseia a sua busca no orçamento e gostos do utilizador, em poucos minutos, combinando as bases de dados dos hotéis da Booking.com e os voos da Skyscanner. A escolha de João Cotrim de Figueiredo está mais do que justificada: para quê andar a saltar de página em página quando se pode ter tudo  num só lugar?

«Estudos recentes demonstram que os consumidores consultam até 38 sites diferentes e chegam a levar 45 dias desde a primeira pesquisa até finalizarem a compra», confirma o empreendedor lisboeta, 34 anos e formado em marketing e publicidade. Todos pedem um destino de partida, mas e quando não sabemos para onde queremos ir? «Vemos primeiro um, depois percebemos que é demasiado caro e tentamos outro, num processo que pode ser um pesadelo.» Em maio de 2015, André, Gustavo e uma equipa de quatro developers lançaram a primeira versão do Tripaya, testando o seu método inovador. «Pesquisámos cada recanto na Europa, num total de 500 destinos turísticos para começar, e categorizámo-los segundo a nossa lista de interesses.» O bom feedback dos clientes indica-lhes estarem no caminho certo. Afinal, ninguém quer ir parar a um destino de diversão noturna quando o que procurava era uma semana recreativa em família. ANA PAGO

NM1231_ApostaRita

Artes Plásticas
RITA GOMES

A ESCOLHA DE VHILS, A.K.A. ALEXANDRO FARTO
Cresceu no Seixal, mas partiu aos 19 anos para Londres, onde tirou um curso de Belas-Artes no Central Saint Martins College of Arts and Design. Os graffiti são a raiz do trabalho deste artista urbano, marcado por retratos em paredes e uma reflexão do mundo. Em junho foi feito Cavaleiro da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada. A revista Forbes considerou-o um dos jovens com menos de 30 anos (tem 28) mais promissores do planeta.

A primeira coisa que quis ser foi veterinária, influenciada pela vontade dos pais em seguir algo relacionado com medicina. Passava os dias a desenhar para se entreter, pensando nos animais mas mais ainda nos humanos, que já nessa altura a inspiravam como poucas coisas na vida. Até que as canetas se apoderaram dela de vez, sempre a chamarem, carregadas de potencial, e Rita Gomes deu por si a tirar design na Faculdade de Belas-Artes da Universidade do Porto, uma formação mais à medida. Perdeu-se a médica, uma pena. Mas seria pior termos perdido a artista cáustica e politicamente incorreta, que assina Wasted Rita e é autora de figuras assombrosas e pensamentos como Smile, you are not Paris Hilton (Sorri, não és a Paris Hilton). Vhils escolheu-a por considerar que o seu tipo de trabalho, escrito na parte de trás de um autocarro ou numa paragem da cidade, pode mudar o rumo de quem o interpreta.

«Acho que quem me acompanhou a crescer nunca teve dúvidas de que o meu meio de comunicação favorito com o mundo sempre foram reflexos do que vai na minha cabeça», conta a ilustradora e designer de Águas Santas, 27 anos. Rita é capaz de ficar horas a observar as pessoas na rua. São tão estimulantes que a levam a teorizar acerca da existência e, de caminho, a querer passar isso a desenhos e escrita. «Quando acabei a faculdade só tinha duas certezas: não me sentia adaptável ao estúdio de design clássico, nem queria trabalhar sob as ordens e manias de outros.» A partir daí foi tudo saindo naturalmente de si, primeiro para a internet, depois para paredes. «Nunca foi planeado, aconteceu.» Receber um e-mail do street artist britânico Bansky, a pedir-lhe três trabalhos para expor num festival de arte em Bristol (o Dismaland – Bemusement Park, parodiando a Disneyland), foi a cereja no topo do bolo. Mas Rita não peca por orgulho: «Penso no que estou a fazer hoje, no que tenho de fazer amanhã. Não fico presa a passados nem fascinada com futuros.» ANA PAGO

NM1231_ApostaAlexis

Desporto
ALEXIS SANTOS

A ESCOLHA DE FERNANDO CORREIA
Voz icónica dos relatos radiofónicos de futebol, jornalista, escritor, realizador e apresentador de rádio e de televisão, nasceu em Lisboa a 16 de julho de 1935. Uma carreira de 50 anos, com passagem pela Emissora Nacional, Rádio Clube Português, Rádio Comercial, TSF Rádio Jornal, NFM, CNR e Rádio Amália. Foi presença assídua nos campeonatos da Europa e do Mundo de futebol e de hóquei em patins, na qualidade de relatador, e em várias edições dos Jogos Olímpicos.

O dia 4 de Abril de 2015 foi um dia maior na vida de Alexis Santos. Com um tempo de 2.00,22, obtido nas piscinas do Centro Olímpico de Coimbra em 200 m estilos, o nadador garantiu a presença nos Jogos Olímpicos de 2016, que vão disputar-se no Rio de Janeiro. O desafio a que se propusera dois anos antes – e que o levara a abandonar a faculdade (Motricidade Humana) – valera a pena. As seis horas diárias de treino, dias consecutivos que começam as 7:30 na piscina, também. Um caso sério, que impressionou Fernando Correia, para quem 2016 será «a hora H» do jovem nadador leonino, de 22 anos. O percurso de quem começou a quebrar recordes nacionais com apenas 14, é já de luxo: a cada braçada, Alexis foi derrubando as melhores marcas nacionais ( já lá vão 23, em diferentes escalões etários) e conquistando títulos (campeão nacional por 78 vezes). O ano de 2013 foi decisivo. Em Barcelona, nos Mundiais de piscina longa, garantiu a melhor classificação portuguesa (12.º nos 400 estilos) e um exclusivo convite para integrar o Centro de Alto Rendimento de Sant Cugat, grupo de elite e «uma experiência fundamental», reconhece o atleta. De regresso a Portugal em 2014, uma lesão no ombro afastou-o dos melhores tempos. Hoje, enuncia os objetivos olímpicos: «Atingir as meias-finais e manter os recordes nacionais».

Alexis nasceu no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa, e deve o nome próprio «esquisito» aos gostos «muitos especiais» da progenitora, a primeira a reconhecer talento ao filho. As aulas de natação começaram aos 3 anos, a conselho do médico. Primeiro, uma, depois duas, por último três por semana. Aos 8 anos, no Benfica, iniciou a pré-competição. Aos 10, «deixava de ser uma brincadeira e passava a caso sério», resume. Mudou-se então para o Sporting, à procura de melhores condições de treino. Multi-talentoso, especializou-se nas disciplinas de 200 e de 400 m estilos. Move-se, luta no mais belo dos espaços: a água. A piscina olímpica acrescenta frescura, arrojo, limpidez à aventura dos grandes recordes. O maior palco desportivo do mundo espera por ele. ALEXANDRA TAVARES-TELES

NM1231_ApostaFernando

Ciência
FERNANDO MARTINS

A ESCOLHA DE FERNANDO CARVALHO RODRIGUES
Especializou-se em Ótica e Óticaeletrónica na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, com doutoramento em Engenharia Eletrotécnica (1974) pela Universidade de Liverpool. Foi professor do departamento de Física no Instituto Superior Técnico (IST) em Lisboa e diretor do Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (INETI). Liderou o consórcio que criou o primeiro satélite português – PoSAT-1 (1993). Recentemente juntou-se ao IADE-U Creative University. Tem 69 anos.

Nasceu em 1979 em Lisboa. Cresceu a apreciar as artes e submetido à rigorosa disciplina familiar: do avô JJ Monteiro, poeta popular nascido em 1913, da mãe professora, do pai militar. «Lembro-me de ter uma vocação para a criação artística, técnica e científica desde muito novo, sempre gostei de desenhar, de conceber e de criar, de fazer música, de cantar e escrever.» Chama-se Fernando Martins e arranca ao mentor os maiores elogios. «Destaco nele a contribuição para o avanço da Ciência do Design e criatividade com que aborda o desconhecido», diz Fernando Carvalho Rodrigues. De que falamos quando falamos de Ciência do Design? Arquiteto, músico, professor assistente no curso de design do IADE-U, doutorado em engenharia e gestão industrial, e investigador, Fernando Martins explica: «A investigação e o conhecimento do design identificam e resolvem problemas, dão sentido, informação para que determinado futuro seja realidade, tornam a vida mais simples. E assumem as mais variadas formas: um utensílio, uma ferramenta, um abrigo, um ambiente, uma cidade, uma viagem, uma experiência, tudo o que ainda está por descobrir e criar para lidar com o desconhecido». Trata-se, portanto, «da arte da conjeturar», de adivinhar o futuro: «De projetar uma probabilidade, guiar a ação e gerar a informação necessária para tirar a incógnita sobre o que desconhecemos.»

Cumpriu as várias vocações despertadas na infância e adolescência, num mundo competitivo arriscou uma formação heterogénea, da música ao design, da tecnologia a interesses culturais diversificados, como a cultura oriental, com especial apego à de Macau, onde cresceu e viveu até aos 18 anos, neto de português e de uma chinesa. Envolvido em vários projetos, nos âmbitos do Laboratório de Design 3D da Licenciatura em Design do IADE e do Mestrado em Design de Produção do IADE, está a escrever um livro, em parceria com Carvalho Rodrigues. Vai chamar-se Dealing with the Unknown (Lidar com o Desconhecido). Porque é disso que se trata: «Todos queremos saber o que vai acontecer amanhã e, por isso, o design trabalha em antecipação. A ciência do design lida com o desconhecido da vida, tira o nevoeiro, clarifica a realidade.» E recusa-se a entrar no debate sobre se se trata ou não de uma «verdadeira» ciência. ALEXANDRA TAVARES-TELES

NM1231_ApostaMarta

Arquitetura
MARTA SEQUEIRA

A ESCOLHA DE JOÃO LUÍS CARRILHO DA GRAÇA
Entre os projetos concebidos pelo vencedor do prémio Pessoa 2008 contam-se a Escola Superior de Comunicação Social (Lisboa), o Pavilhão Conhecimento dos Mares (Lisboa) ou Convento de São Francisco (Coimbra). Nascido em Portalegre em 1952, licenciou-se na Escola Superior de Belas Artes de Lisboa em 1977, ano em que iniciou a sua atividade profissional. Chevalier des Arts et des Lettres pela República Francesa (2010) recebeu também a Medalha da Académie d’Architecture de França (2012).

Investigadora brilhante, na definição de João Luís Carrilho da Graça, que contextualiza a importância do trabalho da arquiteta – «a arquitetura está em crise, temos de a reinventar e nesse sentido a investigação tem uma enorme importância» – Marta Sequeira procura dessacralizar o que antes foi dito sobre as obras arquitetónicas e olhar para elas como se fosse pela primeira vez. Por isso, ainda que surpreendida com a escolha de Carrilho da Graça – «no âmbito da arquitetura, o mais comum é atribuir este tipo de distinções, a quem constrói, e não a quem investiga» –, não deixa de concluir: «A forma como investigo está fortemente relacionada com o ato criativo.»

Nascida em Lisboa a 28 de março de 1977, filha de uma economista e de um engenheiro, licenciou-se na Faculdade de Arquitetura de Lisboa e não mais parou de estudar, ficando para sempre ligada à investigação, ao ensino e às universidades. Em Barcelona, em Évora ou, como agora, novamente em Lisboa. E foi nessas escolas, «e talvez até principalmente nas viagens que fui fazendo», que foi descobrindo a arquitetura, conta. Para além do curso de Arquitetura, que terminou em 2001, obteve, em 2005, o Diploma de Estudos Avançados em Projetos Arquitetónicos e, três anos depois, em Barcelona, o doutoramento em Projetos Arquitetónicos. Tese: os espaços públicos corbusianos do período pós-Segunda Guerra Mundial. «Le Corbusier, tal como cada assunto que investigo, é uma espécie de lente para ver o mundo, como se pretendesse, no final da vida e através desta estratégia de observação da criação humana a partir de vários pontos de vista, compreendê-la um pouco melhor.»

Admiradora de arquitetos muitos díspares, de muitas geografias e de todos os tempos, aponta baterias a 2016 e a alguns projetos especias: continuar a investigação pós-doutoramento, terminar um livro que será editado pela editora Ashgate; editar, como editora convidada, um número especial do Journal of Architecture and Urbanism sobre Le Corbusier; e comissariar, com Susana Rato, a itinerância internacional da exposição Carrilho da Graça: Lisboa. Sobre ela, disse ainda o reconhecido arquiteto: «A consistência do trabalho de Marta Sequeira demonstra quão auspiciosa é a sua experiência.» Pois então, bom ano novo. ALEXANDRA TAVARES-TELES

Nm1231_ApostaSam

Música
SAM ALONE

A ESCOLHA DE ZÉ PEDRO
Guitarrista dos Xutos & Pontapés desde a fundação da banda, em 1978. Na década de 1990 fez parte do Palma’s Gang, ao lado de Jorge Palma, Kalu, Alex e Flak. DJ e grande divulgador musical, é, aos 59 anos, uma das principais figuras do rock português.

Tinha 9 anos quando pegou pela primeira vez na guitarra do pai, às escondidas. House of the Rising Sun, dos Animals, foi a primeira música que dedilhou completa. Hoje também toca baixo, bateria e teclas. «E harmónica. Mas não sei se conta. Para nós, é tão tradicional, que nem ligamos.» Estes «nós» é «a malta do folk, dos blues, do country e do rock n’roll», inspirados por nomes como Pete Seeger, Wille Nelson ou Stevie Ray Vaughan, que cresceu a ouvir por influência paterna. Mas também Black Sabath, Led Zeppelin ou Status Quo. Aos 14, alargou o leque de referências quando uns colegas lhe emprestaram uma cassete de Bad Brains. O rapaz de Quarteira, onde ainda vive, descobria o punk e o hardcore. Quando formou os Devil in Me, com 22 anos, Poli (Apolinário Correia) chegou-se ao microfone. Dez anos, quatro álbuns e muitos concertos depois, são uma das principais referências desse género em Portugal.

Se a história fosse só assim, já havia muito para ouvir. Mas, em 2008, pegou na guitarra acústica e voltou aos blues. Nascia Sam Alone, o nome que adaptou do personagem da série Cheers, Aquele Bar (Sam Malone, interpretado por Ted Danson), de que era fã. O músico Zé Pedro diz que «tem qualquer coisa de Bruce Springsteen, com uma grande atitude e vozeirão». Ele diz que «é o maior elogio que podia receber, sinal que estou a fazer as coisas bem». E está. A par da carreira com os Devil in Me, Sam Alone, que canta em inglês porque «chega a mais gente e soa mais natural» já editou três álbuns e um EP, em 2013 fechou o palco Antena 3 no Festival Super Bock Super Rock, em 2014 deu uns trinta concertos, entre Portugal e estrangeiro, e em 2015 só não deu mais porque caiu de skate e fez uma rutura de ligamentos que o obrigou a cancelar espetáculos. Para 2016 já tem datas marcadas para Espanha, França, Bélgica e Alemanha e o último álbum Tougher Than Leather terá edição mundial pela editora People Like You. Pode ser que seja o ano em que passe a viver só da música e possa deixar de ser tatuador. Mas vai continuar a viver no Algarve. «Estar longe de Lisboa ou Porto nunca me afastaram dos sonhos.» PAULO FARINHA

Nm1231_ApostaRaquel

Literatura
RAQUEL RIBEIRO

A ESCOLHA DE PILAR DEL RÍO
Jornalista, tradutora e escritora, nasceu em Espanha, em 1950, e fez-se portuguesa em 2010, após a morte de José Saramago, seu amor e marido desde 1988. É presidente da Fundação José Saramago e membro do juri do prémio com o nome do Nobel da Literatura português.

Jornalista, escritora, professora universitária. Raquel Ribeiro, nascida no Porto em 1980, e criada em Sines, uma costela minhota e outra transmontana, é todas. Jornalismo é o que sempre quis fazer, e fez durante anos, para o Público, a escrita é o que faz para fugir de si, num ato libertador, o ensino [agora de Literatura, na Universidade de Edimburgo, na Escócia, onde vive], é o que lhe tem permitido ser as outras duas.

O primeiro romance, Europa [2002], publicou-o estava ainda na faculdade. A vida levou-a a geografias díspares: Inglaterra, onde fez o doutoramento; Colômbia, onde esteve graças a uma bolsa de jornalismo com o nome de Gabriel García Marquez; Cuba, onde viveu, fez investigação e encontrou a matéria prima para Este Samba no Escuro [2013, Tinta-da-China], segundo romance, que levou quase dez anos a ver a luz; e agora Escócia, onde dá aulas. Assentou, mas não sossegou.

Este Samba no Escuro, que encantou Pilar del Río, foi muita coisa, antes de ser um romance sobre Cuba, e levou o tempo de Raquel se distanciar o suficiente de si mesma (e do jornalismo) para voltar a escrever ficção. Regressar à ilha de Fidel ajudou. «Pôs as coisas nos seus lugares, nas ruas, nas pessoas, na boca da gente, agarrou um linguajar, uma maneira de ser, que, creio, é o que o romance é também. Depois de o publicar não voltei a lê-lo. Não consigo reler os romances, são demasiado íntimos. Quando os supero, deixo-os ir.»

A terminar um livro de não-ficção, que já leva cinco anos de trabalho, sobre os cubanos em Angola, híbrido de jornalismo com investigação histórica, académica e rigorosa, sobre as representações culturais dos cubanos que estiveram na guerra civil angolana, também «está-e-não-está» a escrever um romance sobre a criação do pólo industrial de Sines nos anos 1970 e 80. «É um pouco um livro sobre a minha infância, sobre a memória e como ela nos falha e, novamente, sobre as utopias e os seus grandes falhanços (o Europa e o Samba também eram sobre isso).» Nós que guardamos o grito, citação de Paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, é o título. 2016 espera esse grito. CATARINA PIRES

NM1231_ApostaAntonio

Solidariedade
ANTÓNIO MIGUEL

A ESCOLHA DE LUÍSA VALLE
Diretora do Programa Gulbenkian de Desenvolvimento Humano, é engenheira química e pós-graduada em Estudos Europeus, tendo, desde os anos 1990, exercido inúmeros cargos de direção e gestão em programas do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Foi assessora do Secretário de Estado da Indústria e Energia e Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do Orçamento, entre 1998 e 2000, ano em que assumiu o cargo de Diretora-Adjunta dos Serviços Centrais e do Serviço de Saúde e Desenvolvimento Humano na Fundação Calouste Gulbenkian. Tem 65 anos.

Ainda hoje muitos dos seus amigos de Gestão não entendem o que faz e António Miguel vê essa incompreensão como um bom barómetro para sentir que está a fazer alguma coisa de certo. Mas não é assim tão difícil perceber o que faz este rapaz de 29 anos, nascido em Sintra, licenciado em Gestão de Empresas no ISCTE, mestrado em Business Administration da Católica FCEE e certificado em Corporate Finance pelo Chartered Institute for Securities and Investment, que Luísa Valle apontou como promessa a cumprir em 2016.

O México e a Noruega, países onde viveu enquanto estudava, marcaram-no. O primeiro, pelo voluntariado, junto de populações nas montanhas onde dava aulas de geografia. O segundo, pelo contacto com o microcrédito. Mas foi um terceiro, Inglaterra, que o fez chegar ao «ponto sem retorno». «Foi quando vivi em Londres que consegui aplicar as ferramentas de gestão e finanças em prol do impacto social.»
A trabalhar num banco de investimento social – a Social Finance UK – esteve envolvido num projeto num estabelecimento prisional, que pretendia reduzir a reincidência criminal de 3000 reclusos em 10 por cento comparado com a média nacional. Vários investidores financiaram um programa de reabilitação durante cinco anos, no valor de 5 milhões de libras. O dinheiro seguiu diretamente para organizações sociais que, nesse período, trabalharam exclusivamente com os seus destinatários. Estabelecido um objetivo específico, era possível calcular o valor da poupança se este fosse atingido. Estava criado o primeiro Título de Impacto Social no mundo.

«As organizações sociais ganham, porque não têm risco e acedem a financiamento; o setor público ganha, porque poupa; os investidores sociais ganham, porque podem financiar projetos com potencial de reembolso e retorno», explica António Miguel. A experiência, que «traz à superfície o melhor do sector financeiro, em prol do impacto social», inspirou-o de tal forma que, no regresso a Portugal, em 2013, dedicou-se, com o apoio da Gulbenkian, a criar um homólogo da Social Finance, o Laboratório de Investimento Social, que já lançou, no início de 2015, o primeiro Título de Impacto Social, na área da educação, com a Câmara de Lisboa, a Gulbenkian e a Code for All, com o objetivo de melhorar o desempenho escolar e reduzir a taxa de retenção junto de alunos do 1º Ciclo do Ensino Básico, através do ensino da programação informática.
De 2016, António Miguel espera que seja o ano da consolidação e do lançamento de novos projetos, em diversas áreas. E promete: «Hoje o impacto social é uma externalidade nas decisões financeiras; em cinco anos, esta dimensão estará internalizada. Nesse dia os meus amigos da universidade vão compreender o que faço.» CATARINA PIRES

Agradecimentos: À loja KARE Lisboa, na LX Factory, e à Cinemateca Portuguesa