Quem é Rui Costa Reis?

Rui Costa Reis, o empresário angolano que quer comprar as obras de Miró ao Estado português, deu uma entrevista à Notícias Magazine em Julho passado, quando estava prestes a estrear  Phantom – O Submarino Fantasma, o primeiro filme do mais recente estúdio de Hollywood: a RCR. Conheça-o.

À maneira angolana. Esta é uma frase que se ouve e se percebe quando se conhece Rui Costa Reis. Este empresário e industrial da área das farinhas, branco, angolano do Kwanza Sul, de 45 anos (que de acordo com o Diário Económico de hoje quer comprar as obras de Miró cuja venda tanta polémica tem causado), está a conquistar Hollywood.  Há três anos formou um estúdio de cinema, a RCR Multimedia – empresa com as suas iniciais,  e que faz que o reconheçam nos EUA como movie mogul. Phantom – O Submarino Fantasma, com David Duchovny e Ed Harris, foi o seu primeiro filme e nos EUA estreou em cerca de dois mil ecrãs.

Rui Costa Reis vive agora entre Los Angeles e Luanda. «Mais em Luanda do que em Hollywood», diz, com a sua pronúncia fortíssima, que desengana quem podia equivocar-se com a sua tez pálida. É de origem portuguesa, claro, mas completamente angolano. O pai era filho de português, nasceu no Kwanza Sul. A mãe nasceu no Porto mas foi para Angola com meses. Não foi um sonho de longa data que levou este empresário angolano, especialista em alimentação – farinhas e comidas para bebés – mas também com negócios no imobiliário e nos portos, a atravessar dois oceanos e instalar-se na meca do cinema, Los Angeles. Foi mais o espírito pragmático que domina esta nova casta de empresários luandenses, com muita liquidez e faro para o negócio.

«Vim para os EUA porque os meus filhos adolescentes queriam vir para aqui. Eles encorajaram-me a procurar um negócio nos EUA e sem dúvida que o cinema, neste país, é o negócio mais lucrativo.» Rui, aliás, não é um cinéfilo e confessa que o pouco cinema que vê é para se entreter. Ele viveu a sua vida de adolescente, época em que os filmes nos fascinam e nos roubam, sem cinema. Angola estava em guerra e em Luanda, onde já vivia,  os cinemas eram escassos e intermitentes. Mas quando escolheu o argumento de Phantom – O Submarino Fantasma fê-lo em função da sua vontade de ver um filme de submarinos à boa maneira de Caça ao Outubro Vermelho, com Sean Connery. Ele estava com saudades e tinha um feeling de que o grande público também.

O filme foi, como diz o poster, baseado em acontecimentos verídicos relacionados com um submarino soviético em plena guerra fria que terá sido tomado por um agente rebelde do KGB com vontade de lançar um ataque nuclear aos EUA. É realizado por Todd Robinson, autor do monumental falhanço Corações Solitários (2006), e poucas vezes sai do interior do submarino. Muita tensão masculina entre russos interpretados por americanos que não brincam aos sotaques de Leste. No elenco, além das vedetas Ed Harris, David Duchovny e William Fichtner, nota-se a presença de Pedro Hossi, ator angolano a residir em Los Angeles e protegido de Rui Costa Reis. Consta que a primeira versão não terá agradado ao staff da RCR, em especial ao próprio Rui. A versão que estreia agora teve o seu dedo, sobretudo no que respeita ao ritmo. Pedra fundamental da equipa RCR é o filho mais velho de Rui, Ricardo Costa Reis, que, aos 21 anos, é um dos mais jovens produtores de Hollywood, um braço-direito que lhe acrescenta a frescura da juventude, um público-alvo cada vez mais prioritário.

Rui Costa Reis não quer falar muito da sua vida antes da entrada no mundo do cinema, nem como criou um império no negócio da farinha. O pai era um empresário na área das montagens elétricas. Ele criou a sua marca de farinhas, a Kianda, e foi um sucesso extremo – diz-se que alimentou Angola nos anos 1990. A sua empresa, a Intercomercial, cedo se tornou líder de mercado também com marcas de cereais e alimentação para bebés. A empresa foi criada por ele depois de ter estado na Universidade do Minho, em Portugal, a formar-se em Gestão de Empresas. Esse salto para a ex-metrópole era o desenrolar natural de uma história que havia começado cá – ambos os ramos da sua família, da mãe e do pai, são portugueses. O pai nasceu já no Kwanza Sul, de uma família que tinha vindo de Coimbra. A mãe nasceu no Porto e foi para lá foi aos 2 anos. A paixão pelo FC Porto sedimentou-se nesses anos de faculdade, e ainda hoje faz loucuras – em 2013, reservou uma suite no Intercontinental no dia do FC Porto-Benfica, onde deu uma festa regada a champanhe para os amigos, com fé inabalável de que o seu clube lhe daria uma vitória e seria praticamente campeão naquele dia.

O regresso a Angola esteve sempre programado. «A minha família fez também a independência, não fazia sentido nem sair de lá nem não voltar», diz.  «Crescer e viver em guerra sempre foi o meu “ambiente natural”. Claro que é duro crescer num ambiente em que havia falta de água, alimentação e energia. Mas lutar pelo desenvolvimento do meu país sempre foi uma coisa natural e normal.» Depois da paz, Rui ficou, claro.  E isso fez que a sua vida de empresário levasse um boom. Continua, portanto, a viver a maior parte do tempo em Luanda – embora passe temporadas nos EUA e também em Lisboa. Tem casa perto da praia da ilha de Luanda. «Nos próximos anos, quero continuar a viver na ilha de Luanda e a deslocar-me sempre que necessário a Los Angeles nas datas incontornáveis como o início de rodagem de um filme, uma antestreia, os Óscares.» Em Luanda, como em Los Angeles, o nome de Rui Costa Reis está sempre associado a boa vida. Os eventos à beira-mar aparecem nas revistas cor-de-rosa de Luanda – ajuda que Rui seja agora casado com a Miss Angola 2002, Giovana Pinto Leite, mãe do seu filho mais novo, o diver­tido Rafael.

No entanto, o estilo de vida americano de Los Angeles está a conquistar Rui Costa Reis. «L.A. é uma cidade multicultural. A vida de um angolano aqui é igual à vida de todas as outras dezenas de nacionalidades que aqui se juntam. A minha mulher Giovana descobriu que no Bairro Chinês vendem tudo o que é necessário para um bom funje de fim de semana. Até galinha viva para fazer cabidela. Temos um jardineiro mexicano que já sabe o que a Giovana gosta de comprar. Não é surreal? Um mexicano vai a um bairro chinês fazer compras para o funje de fim de semana de uma angolana em Beverly Hills. Isto é Los Angeles!»

Rui não abdica de ficar em casa, na piscina com vista sobre a cidade, e tem como hobby percorrer recantos da Califórnia na sua Vespa. «Gosto de um bom charuto no Beverly Hills Cigar Club acompanhado de um conhaque Louis XIII!» Nesse mítico local das estrelas, Rui tem uma cabina personalizada ao lado da de Arnold Schwarzenegger.

Já são famosas as festas na casa de Rui Costa Reis. Zac Efron, Jamie Foxx e Eddie Murphy são habitués. Foi o jeito angolano que deu fama aos eventos na mansão de Costa Reis: há sempre muamba e sons africanos cruzados com hip hop e funk. «Nas nossas festas todos os 1500 convidados são considerados VIP. Não há zonas exclusivas, e isso torna as festas únicas e todos interagem com todos. E a música angolana está presente. Nas festas gosto de ter música ao vivo e a presença do músico angolano Paul G. é constante», conta. Nas festas da casa redonda de Beverly Hills, Foxx já foi DJ. Outra estrela afro-americana que é fã lá de casa é o galã Shemar Moore, da série Mentes Criminosas, que na penúltima edição do Festival de Cannes aprendeu a dançar kizomba no barco da RCR…

No dia antes desta entrevista, na festa de lançamento de Phantom, Joaquim de Almeida e Emile Hirch (ator de Milk e O Lado Selvagem) divertiam-se, num ambiente em que é proibido o smoking. É o próprio Rui Costa Reis que dá o tom, com um estilo de chinelo no pé. Ajuda à festa a sua simpatia gingona. Tanto pode estar a contar anedotas a Mickey Rourke num inglês com sotaque português de Angola como a negociar contratos de milhões com um charuto cubano na boca. Apesar de ouvir os outros, toma sempre decisões muito suas. Acredita sempre no seu instinto, mas também gosta de investir nos amigos. Não esconde que tem dinheiro mas torce o nariz quando o apelidam de milionário. E foi com uma amizade genuína que decidiu apostar em Jamie Foxx como realizador. O filme chama-se All Star Weekend e é um projeto de estimação do ator e músico.

Tudo tem uma explicação, e a ligação de Rui à cultura começou em Angola, onde conta que se tornou uma espécie de mecenas. Patrocina a Trienal de Luanda, evento cultural da capital angolana. É colecionador de arte, made in Angola e não só, através da sua fundação cultural, a TACCA – Territórios de Arte e Cultura Contemporânea Africana. Nos EUA, fundou recentemente também a RCR Cultural Foundation. Lembra com um orgulho tranquilo ter já tido obras da sua coleção no MoMA, em Nova Iorque, na Bienal de Veneza e na ARCO, de Madrid.

A entrada de Rui Costa Reis no cinema deu-se pelos negócios, financiamento ao mercado dos filmes diretos para DVD da Sony. Financiou Ligações Selvagens 4, SWAT – O Confronto ou Hostel – Parte III. Fitas chungas em que ninguém em Portugal reparou. «Os primeiros dez filmes que fiz com a Sony, durante os dois primeiros anos, deram à RCR a experiência e abriram as portas que nos permitiram evoluir para um estúdio independente. A minha primeira incursão como independente foi com três filmes em Nova Iorque: The Girl Is in Trouble, com ajuda de Spike Lee, Jack & Diane, com Kylie Minogue, e For Ellen, com o Paul Dano», conta.

Phantom – O Submarino Fantasma é o primeiro filme financiado pela RCR e com total autonomia. Diz-se que terá custado 4,5 milhões de dólares – em muitos sites fala-se de cerca de 18 milhões. Também aí, Rui Costa Reis refere o jogo de cintura angolano que lhe tem sido favorável no mundo de Hollywood. «Nunca desistir. Quando nasci, o meu país já estava em guerra e passei por todas as guerras em Angola. Isso demonstrou-me que para tudo existe uma solução quando se escolhe um caminho e se persiste até à vitória, neste caso, até à sustentação do negócio.»

Claro que, na verdade, o tal segredo da «maneira angolana» passa por uma capacidade desempoeirada e sem constrangimentos de negociar cachets e custos. Hollywood não estava habituada. Aos poucos, a imprensa americana repara neste angolano que chegou de mansinho a Hollywood e que prefere apostar ele próprio num estúdio, dispensando parcerias com os grandes, como Fox, Warner ou Paramount… A imprensa portuguesa só agora, com a chegada de Phantom, começou a pedir entrevistas. Nesta altura, Rui quer aparecer, sim, mas como produtor de cinema, a sua nova aventura.

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BREVEMENTE NOS ESTÚDIOS RCR

Sympathy for the Devil

Este é um dos projetos prioritários da RCR Media e ainda está em fase de casting. Sabe-se que o processo de escolha dos atores será proveta para a aplicação RCR que permite que qualquer ator português ou angolano possa ser escolhido. Com filmagens em 2014, Mickey Rourke será  o protagonista.

Backfire
Projeto do produtor Bernardo da Fonseca, português coqueluche em Hollywood, será um filme de ação com bastante artes marciais. A escolha de atores ainda é top secret mas Rui Costa Reis garante que será de topo. As filmagens vão decorrer em Berlim e o filme estreará com pompa nos EUA através da RCR…

Disclosure/Project Blue Book
Com a ajuda do produtor de Pulp Fiction, Lawrence Bender, este filme ainda sem título aprovado é uma incursão no cinema de terror. Parte de uma história que se diz verídica sobre uma família que desaparece nas Brown Mountains, uma zona recôndita da América onde se diz ser constante a presença de discos voadores ou fenómenos paranormais. Rui Costa Reis acredita que é um filme apenas para o mercado americano.

Nevunda
O filme mais ambicioso da RCR. A história verdadeira de um embaixador angolano que no século XVI se desloca ao Vaticano para estabelecer relações diretas e tentar travar o colonialismo aceitando o cristianismo. A parte angolana está a ser coordenada pelo cineasta Mariano Bartolomeu e por Fernando Alvim de Faria, o maior marchand de arte de Angola. O papel principal caberá a Jamie Foxx e está ainda prevista uma participação de Samuel L. Jackson.  O oscarizado Foxx está extremamente empenhado neste relato da emancipa­ção africana. Será filmado em 2014 no Nbanza Congo.

All Star Weekend
Será a estreia do ator Jamie Foxx como realizador. Um projeto que apenas terá luz verde depois dos compromissos da superestrela em Nevunda. Costa Reis aposta nesta comédia sobre um comediante. Um projeto ainda em fase de desenvolvimento.

Highlander
O projeto mais ambicioso de Rui Costa Reis. A reencarnação de um franchise de ficção científica que nos anos 1980 Sean Connery e Christophe Lambert tornaram bastante popular. Para ser viável, o poderoso estúdio Lion’s Gate terá de dar luz verde. Ainda bastante atrasado mas com um realizador já despedido: Juan Carlos Fresnadillo, de 28 Semanas Depois.

Back Roads
Também em stand-by este drama realizado por Adrian Lyne (Atração Fatal), supostamente com Kristen Stewart como protagonista. Um conto da América profunda baseado no best-seller de Tawni O’Dell.

UMA APLICAÇÃO ANGOLANA
A RCR criou recentemente, através de Ricardo, o Costa Reis júnior, uma aplicação chamada RCR Connect, que é um sistema de casting online pensado para trazer atores angolanos – e talvez portugueses – para os próximos filmes do estúdio de Hollywood. «Investi milhões nesta aplicação grátis», explica Rui. «Acredito que será revolucionária no mundo do casting em Hollywood e permite que atores em África e na Europa façam gratuitamente o casting online. Se forem escolhidos pelo realizador do filme, então a RCR paga todas as despesas de deslocação da origem para Los Angeles e a estada. E já está disponível para o nosso próximo filme Sympathy for The Devil. Quem entrar poderá vir a contracenar com atores como Mickey Rourke.» A prestigiada revista de cinema Wrap considerou esta a melhor aplicação do ano e colocou Ricardo Costa Reis num especial dedicado aos novos líderes rebeldes do cinema americano.

[Publicado originalmente na edição de 28 de julho de 2013]