Elas voltaram

Tartarugas especialistas em artes marciais e comedoras de piza a combater malfeitores? Sim, elas estão de volta. E com mais músculos. A nova versão, remake do filme dos anos 1990, estreia hoje, seguindo uma tendência de Hollywood: refazer tudo o que ficou no imaginário de quem está agora entre os 30 e os 40 anos.

Havia necessidade de fazer uma nova versão de Tartarugas Ninja? Do ponto de vista comercial, pelos vistos havia. Esta nova versão do original de 1990 é produzida por Michael Bay (Transformers) e realizada por Jonathan Liebesman (Fúria de Titãs) e foi um fenómeno de popularidade nos EUA (neste verão fez mais de 140 milhões de euros). De tal forma, que a Paramount já anunciou a continuação.

Os americanos estavam com saudades das tartarugas adolescentes. Tartarugas Ninja III, o último filme deste franchise, que inclui séries de animação e bonecada para merchandising, é de 1993, mas o negócio nunca fechou. Gerações de crianças conheceram Rafael, Leonardo, Michelangelo e Donatelo ao longo destes anos.

Mas o que faz que estas tartarugas com sabres e peritas em artes marciais tenham tanta longevidade? Diríamos que uma máquina promocional forte e um apelo infantil pelo facto de serem adolescentes com tiques contemporâneos. Os quatro répteis chegam a fazer rap, a «galar» as miúdas e a ser tolos como qualquer outro teenager americano. É claramente essa tontaria que os aproxima do conceito do filme de família de Hollywood.

A trama é conhecida: quatro tartarugas matulonas e faladoras que ficaram assim depois de uma experiência genética mal-sucedida e cresceram fortes, ganharam poderes e, graças a um rato mutante chamado Splinter, começaram a combater o crime pela calada a partir do submundo dos esgotos de Nova Iorque. Absurdo tudo isto? A ideia é mesmo essa.

A história começou com livros de banda desenhada em 1984. Depois, passou para uma série animada na televisão. Só mais tarde chegou ao grande ecrã. E nesta nova versão tudo é maior. A escala é outra e o modelo é nem mais nem menos do que o aparato visual de Transformers. Neste caso, o aparato digital. As cenas de combate são mais digitais e há efeitos especiais em overdose para cada plano. De certa maneira, ao mesmo tempo que estas tartarugas ficaram mais musculadas, a sua artificialidade é maior. A diferença é que esta produção é mais endinheirada. O novo filme não tem nada que ver com o visual dos primeiros filmes da década anterior (convém lembrar que o primeiro, realizado por Steve Barron, foi rodado em 1989). Tresanda realmente a blockbuster e a boa notícia é que o suposto humor das criaturas está mais aberto a quem não é um rapaz de 14 anos. A própria personagem de Megan Fox, uma jornalista beldade que quer ser levada a sério, é só por si uma intenção de comédia.Isso e uma certa ideia de vertigem no clímax final salvam o filme de ser um total aborrecimento para quem não é o público-alvo.
O ressuscitar e fazer de novo desta série chega numa altura em que Hollywood aposta forte em refazer produtos dos anos 1980 e começo dos 90. A regra é agora voltar a fazer. E isto significa refazer em grande e com outra escala, integrando sempre a linguagem dos nossos tempos. De certa maneira, o revivalismo tem apenas um intuito comercial. Todos estes filmes são refeitos para atrair quarentões saudosos da sua adolescência e, mais importante, os seus filhos. Acredita-se que esta fórmula faz que os pais arrastem os filhos para o cinema e não o contrário. É o tal efeito de familiaridade, a tal ponto que o espetador menos assíduo, aquele que nunca viu uma tartaruga ninja a aplicar um golpe de kung fu, já tenha ouvido falar do nome, como se fosse uma marca, precisamente… Estes remakes de êxitos antigos podem ser a prova de uma certa preguiça criativa de Hollywood, ainda que também atestem que os bilhetes de cinema vendem melhor quando já se sabe ao que se vai. Os adultos que vão querer ver estas Tartarugas Ninjas: Heróis Mutantes não vão certamente à procura da surpresa. Vão ao encontro da nostalgia.

A ERA DO «FAZ OUTRA VEZ»
A ideia de recontar a mesma história foi sempre prática no cinema americano, mas agora tem sido um exagero. Por cá, o produtor Leonel Vieira também terá brevemente prontos três para criar muitas interrogações: Canção de Lisboa, O Leão da Estrela e O Pátio das Cantigas.

ANNIE
De Will Gluck, com Jamie Foxx e Quvenzhané Wallis
(a partir do original Annie, de John Huston, de 1982)
Um musical clássico que nos anos 1980 foi transformado num espetáculo com valores «corretos» para a família. Nessa altura, a história da pequena órfã ruiva que vai parar ao lar de um milionário tinha o toque classicista de John Huston. Na versão «atualizada» há um piscar de olho aos afro-americanos. Estreia neste Natal.

ROBOCOP
De José Padilha,
com Joel Kinnaman e Michael Keaton
(a partir do original RoboCop, de Paul Verhoeven, 1987)
Remake de um dos mais estimados filmes de ficção científica americanos da década de 1980. A história de um polícia que depois de estar à beira da morte é salvo e transfor­mado em máquina de matar. Na versão do realizador brasileiro há uma posição políti­ca no argumento, mas ninguém daqui a uns anos se vai lembrar do filme…

ABOUT LAST NIGHT
De Steve Pink,
com Kevin Hart e Regina Hall
(a partir do original Lembras-te da Última Noite?, de Edward Zwick, 1986)
Uma comédia sexual pensada para o grande mercado afro-americano, onde o comediante Kevin Hart faz as vezes de Rob Lowe, o protagonista de um filme que nos anos 1980 se transformou em verdadeiro culto e terá porventura inspirado a criação da série Sexo e a Cidade.

AMOR INFINITO
De Shane Fest,
com Alex Pettyfer e Gabriella Wilde
(a partir do original Um Amor Infinito, de Franco Zeffirelli, 1981)
Foi uma história de amor épica e fez de Brooke Shields uma ninfa perpétua. Hollywood julgava que poderia voltar a pe­gar no livro de Scott Spencer e apaixonar os adolescentes de hoje. Não aconteceu. Uma lição: nem sempre resulta dar luz ver­de a filmes para ocupar datas específicas (neste caso, o Dia de São Valentim).

POINT BREAK
De Ericson Core,
com Edgar Ramirez e Teresa Palmer
(a partir do original Ruptura Explosiva, de Kathryn Bigelow, 1991)
A adaptação mais esperada (e arriscada) de 2016. O filme original de Kathryn Bige­low era uma das obras mais respeitadas do cinema de ação dos anos 1990. Quem não se lembra do duelo surfista entre o criminoso Patrick Swayze e o agente infiltrado Keanu Reeves? A nova versão estreia em setembro de 2015.

MAD MAX, FURY ROAD
De George Miller,
com Tom Hardy e Charlize Theron
(a partir do original Mad Max, As Motos da Morte, 1979)
A próxima reencarnação de Mad Max parece legítima. O espírito deliciosamente demente mantém-se, como o realizador, o australiano George Miller. Continuamos num mundo pós-apocalíptico, onde reina o caos e onde um grupo de mulheres rebeldes forma a resistência. Tom Hardy é uma alternativa credível a Mel Gibson.